A quebra do Silicon Valley Bank (SVB), principal fonte de crédito das startups do Vale do Silício (EUA), que se estendeu para outros bancos norte-americanos de menor porte (Silvergate, Dignature, First Republic Bank) ganhou escala e atravessou o Atlântico, atingindo em cheio o Credit Suisse, um dos gigantes das finanças europeia.
Mas não parou por aí. As ações dos bancos norte-americanos despencaram 18% em uma semana e as dos bancos europeus caíram 15%, com perdas globais de US$ 460 bilhões. Os gigantes financeiros Deutsch Bank (alemão) e Societe Generale e BNP Paribas (franceses) estão na linha de tiro.
A crise fez a agência de avaliação de risco Moody’s rebaixar a nota do setor bancário dos EUA de estável para negativa. Para tranquilizar o “mercado”, os governos ocidentais – que não titubeiam em cortar direitos dos trabalhadores – disponibilizaram, através de seus bancos centrais, centenas de bilhões de dólares e euros para garantir a “saúde” dos bancos.
O FED, o banco central dos EUA, disponibilizou nada menos que US$ 300 bilhões para impedir o colapso de outros bancos em situação de risco, e o banco central suíço liberou US$ 280 bilhões para sustentar o processo de incorporação do Credit Suisse pelo UBS, outro grande banco suíço, que o comprará pela bagatela de US$ 3 bilhões (apenas 3% de seu valor de mercado em 2007).
Peter Schiff, analista que previu a crise financeira global de 2007/08, afirmou que “esta não é mais a crise financeira de 2008, esta é a crise de 2023. Já faz 15 anos, estou surpreso que tenha demorado tanto para esta crise começar”.
Mas não é bem assim. Cada crise é decorrência da anterior, falsamente sanada. O sistema financeiro mundial vive uma instabilidade permanente. Após a crise dos petrodólares (1973), ocorreram a crise da dívida dos países latino-americanos (1980), a da segunda-feira negra (1987); a “Tequila” (1994); a dos tigres asiáticos (1997), a da Rússia (1998); a da bolha da Internet (2000/01), a do subprime (2007/09) e a da Zona do Euro (2010/12).
Como resultado dessa instabilidade, o FMI, que previa uma desaceleração da economia global, com baixo crescimento em vários países em 2023 (1,4% nos EUA, 0,7% na União Europeia e -0,6% no Reino Unido) já trabalha com a hipótese de recessão.
A instabilidade permanente dos mercados é expressão do estágio senil do sistema capitalista, no qual a extrema financeirização leva ao aumento brutal da acumulação de capitais que não encontram espaço para sua realização.
A contraface da extrema concentração da renda em escala global é a queda do poder de compra das famílias, que associada ao aumento da taxa de juros e à inflação, geram seu endividamento crescente, assim como também das empresas. Em síntese, cresce a riqueza e, concomitantemente, a miséria.
No Brasil,isso se expressa no aumento dos casos de trabalho análogo à escravidão, caso de Marinaldo Soares Santos, maranhense de 51 anos, levado ao trabalho escravo pela primeira vez em 1988, quando tinha 16 anos. Foi resgatado e por outras duas vezes “escravizado”, sendo enfim “libertado” em 2010. “Passei a maior parte da minha vida assim. Eu não conhecia meus direitos. Achava que era normal, que estava passando por aquilo porque eu era pobre”.
Desde 1995, mais de 60 mil pessoas foram encontradas por equipes de fiscalização. O número já é escandaloso, mas revela apenas uma fração do problema. A estrutura de fiscalização do Ministério do Trabalho é insuficiente para apurar todas as suspeitas.
Não há concurso público há 10 anos e houve corte de verbas de 55% de 2019 a 2022. Segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, a gerência de Garanhuns (PE), por exemplo, tem sob sua jurisdição 160 municípios e um único auditor.
Dessa forma, milhares de casos suspeitos e denúncias não são apurados. Ou seja, enquanto 60 mil foram “libertados”, centenas de milhares permaneceram em situação análoga à escravidão.
Há melhor retrato da putrefação do sistema?