A velhice perpassa idades, gêneros, etnias, regiões e sociedades. Ela incomoda quase todo mundo. Quanto menos espiritualizada é a pessoa, mais repugnante lhe parece a velhice, mais merecedora de desprezo, de nojo. Mas, afinal, o que é a velhice? Por que inspira tanta repugnância? Por que é tão relegada ao lixo?
Envelhecer é morrer fisicamente. Apodrecer. Definhar, adoecer, desfazer-se em material pútrido, gritar, berrar, apegar-se à matéria, recusar a natureza do espírito, a luz. Como dizem os budistas: O corpo, a matéria, é nada. Todos nós nascemos com data de validade. Morrer é o destino do corpo carnal. E se alguém resiste a viver um século, estará só ruínas, material orgânico se desfazendo.
A vida é como deslizar em um tobogã, que vai ficando cada vez mais escorregadio e inclinado. São as células morrendo, a pele se enrugando, os ossos encolhendo, os órgãos falindo, até esvair-se a energia vital e surgir o abismo. Só depois disso há luz.
O desdém que alguns jovens e adultos dispensam aos velhos, decorre de dois fatores: A animalidade dos jovens e o apego. No primeiro, a morte, e a velhice não existem; no seu mundo só há beleza, vigor, primavera. No outro, a ilusão de que o corpo carnal é para sempre.
Notaram que as crianças não excluem os velhos? É que elas elas ainda têm aberto o portal que transcende as quatro dimensões, e que só pode ser transposto por meio da inexistência do apego.
O fato é que o tempo nem é importante. Importante é a energia. Há velhos que jamais deixam de trabalhar, de produzir, de ajudar os jovens a construírem seus mundos, e de amar.
E há os que morrem mentalmente, mas seus corpos continuam vagando por aí, deteriorando-se. A energia está na mente; os corpos são apenas prisão, da qual nos libertamos porque amamos.
No cume da montanha não há nada, exceto vento e frio. Vamos até lá apenas para tomarmos conhecimento de que chegou a hora de realizarmos a verdadeira subida, transcender o tempo.
De tanto ouvir o riso das crianças, de tanto observar as rosas, de sentir os jasmineiros umedecendo as noites tórridas do trópico, de inalar a fragrância do mar, que inunda minha alma, de tanto montar a luz no cataclismo do primeiro beijo, acabei por sentir que a eternidade é agora.