O que há em comum nestas três contendas que o mundo vem acompanhando nos últimos meses? Essencialmente, disputa por território. A Rússia reivindica o antigo território da “Nova Rússia”, tomado pelos russos aos turcos entre 1774 e 1783 e cedido por Lenin à nascente República Socialista da Ucrânia em 1922 e por Krushev, em 1954. Os palestinos reivindicam o território da antiga província da Palestina, ocupada pelo Império Otomano em 1517 e tomado pela Grã-Bretanha em 1919, que em 1948 cedeu 53% da área para a formação do Estado de Israel.
Já a região do Essequibo, pertencente desde 1777 à Capitania Geral da Venezuela e, desde 1811, à República da Venezuela, foi ocupada em 1830 pelo imperialismo britânico, que simplesmente resolveu ampliar sua nova colônia, a Guiana Inglesa, tomando toda a margem oeste do rio Essequibo, até as proximidades da foz do rio Barima, o médio Cuyuni e a Serra de Pacaraima, numa extensão superior a 150 mil km².
Ocorre que esses conflitos são apenas a “ponta do iceberg”, pois o planeta apresenta dezenas de litígios territoriais, a quase totalidade tendo suas raízes nas ações desastradas e criminosas das grandes potências colonialistas e imperialistas. Além das disputas territoriais, existem inúmeras guerras civis no planeta, como as da Síria, Yemen e Líbia, também heranças das políticas imperialistas.
O resultado são territórios usurpados, nações divididas, povos sem soberania sobre seus territórios e outras situações anacrônicas. Exemplos de territórios usurpados são vários. Além da Palestina e Essequibo, tem as Ilhas Malvinas, Gibraltar e Irlanda do Norte, tomados pelos britânicos, respectivamente, da Argentina, Espanha e República da Irlanda.
Aliás, a situação da Irlanda do Norte é escandalosa. Separada da Irlanda desde 1912, tem hoje a maioria da população comungando com a República da Irlanda o desejo de permanecer na União Europeia; o nacionalista Sinn Féin se tornou o partido majoritário no parlamento norte-irlandês e a população de religião católica já superou a de protestante. Mas Londres se nega a permitir a convocação de um plebiscito para que os norte-irlandeses decidam pela reunificação da ilha, assim como se empenha em negar a soberania escocesa.
Ainda na Europa, o Estado espanhol nega, de forma violenta, o direito à independência aos 8 milhões de catalães; junto com a França, nega a independência aos 3,2 milhões de bascos e impõe restrições ao uso do idioma próprio a 2,7 milhões de galeses.
E a “democrática” França, que em 1768 tomou a Córsega da Itália, tenta impor, por 250 anos, que os 300 mil corsos abdiquem de sua luta pela independência e deixem de lado seu dialeto italiano. Do mesmo modo, impõe aos 2 milhões de alsacianos restrições ao seu idioma de origem germânica, na região historicamente alemã, assim como restringe o uso do occitano e do bretão aos milhões de habitantes do Languedoc e da histórica região da Bretanha.
No passado recente, a Guerra Fria entre EUA e URSS gerou a divisão de alguns povos, como alemães, vietnamitas e coreanos. A Alemanha e o Vietnam já foram reunificados (além do Yemen), mas os coreanos e os irlandeses continuam divididos.
Além de povos que foram separados, há aqueles que se acham distribuídos por vários países. O caso mais gritante é o do povo curdo, que abrange mais de 40 milhões de pessoas, com história, língua e cultura próprias, mas impedido de formar uma nação pela Turquia, Irã, Iraque e Síria. E também dos balúchis, fragmentados entre Paquistão, Irã e Afeganistão, e dos pashtuns, etnia majoritária no Afeganistão, mas tendo contingente ainda mais numeroso (36 milhões) no Paquistão.
A região do Punjab, que abriga 100 milhões de paquistaneses e 50 milhões de indianos, tem um povo com língua e cultura próprias, que foi dividido pelo imperialismo britânico entre o Paquistão e a Índia em 1947.
Assim como o foi a região de Bengala, habitada por 277 milhões de bengalis com língua e cultura próprias, mas divididos pelos britânicos entre Bangladesh (172 milhões) e Índia (105 milhões). Há mais azeris no Irã (17 milhões) do que na República do Azerbaijão (10,5 milhões) e há quase tantos tadjiques no Afeganistão (7 milhões) do que na República do Tadjiquistão (10 milhões). Enfim, há inúmeros outras excrecências geradas pelas potências colonialistas e imperialistas, que, infelizmente o espaço desta coluna não permite apreciar.