É inacreditável a sanha golpista da burguesia. Relatório de análise da conjuntura política elaborado pela CAC Consultoria, contratada pelo Santander, repassado a investidores e correntistas do banco, inicia assim: “Se o sistema político brasileiro acha cômico o governo Bolsonaro, o retorno de Lula representa uma ameaça bem mais séria”. Em seguida, faz a defesa de Lira na presidência da Câmara dos Deputados como quem garante passar a boiada neoliberal: “Hoje Lira é o presidente da Câmara, mas sob um governo do PT, seria um modesto aliado abrigado em um cargo menor”. E finaliza sugerindo um novo golpe: “É possível especular sobre um golpe para evitar o retorno de Lula. Ele era inelegível até outro dia. Pode voltar a sê-lo”. Mais direto, impossível.
O roteiro golpista no Brasil é bem conhecido: começou com o questionamento da vitória de Dilma em 2014, seguida da descarada sabotagem de seu governo em 2015, e culminando em sua destituição em 2016 sob o falso pretexto de pedalada fiscal. Teve seu segundo ato em 2018 com a armação para impedir a candidatura favoritíssima de Lula, e agora procuram meios de evitar a vitória dele em 2022, desde a busca de uma 3ª via, passando pela proposta de ruptura bolsonarista e agora um novo recurso ao lawfare, que é a manipulação da Justiça com o objetivo de se destruir um alvo, envolvendo a burguesia financeira. Aliás, os golpes jurídicos, arquitetados desde Washington e sustentados pela grande mídia, não são novidade na América Latina: no Brasil em 2016; na Bolívia, revertido pelas urnas; e as tentativas no Peru, com Keiko Fujimori, e na Venezuela, com Juan Guaidó.
O fato é que seis anos de neoliberalismo sob Temer e Bolsonaro só agravaram a crise econômica, social e política do país. O PIB per capita de 2021 será inferior ao de 2015; o contingente desempregado disparou para 30 milhões; a inflação anual está em 9% e “a dos pobres”, em 15%; e a miséria e a fome aumentam na mesma proporção em que cresce a concentração da renda. A comparação com o período em que Lula governou é inevitável, e é isso que o torna favorito. Em 2010, Aécio Neves disse que “Lula é um fenômeno a ser estudado”.
De fato, Lula participou direta e indiretamente de todas as oito eleições presidenciais desde o fim da ditadura militar. Em 1989 foi para o segundo turno contra Collor e só não venceu pela falsa associação dos sequestradores de Abílio Diniz com o PT. Em 1994, era favorito, mas perdeu para FHC embalado pelo Plano Real. Em 1998, perdeu novamente para FHC, que promoveu um explícito estelionato eleitoral ao postergar a maxidesvalorização cambial para logo após a eleição.
Em 2002 ganhou de Serra com 61,3% dos votos. Em 2006 ganhou de Alckmin com 60,3% dos votos. Em 2010, recusou proposta legislativa que lhe daria uma reeleição certa, mas foi decisivo para a eleição de Dilma. Em 2014, seria eleito com folga, mas Dilma insistiu na reeleição. Em 2018 era favorito disparado, mas um golpe impediu sua vitória. Em 2022, só novo golpe impedirá sua vitória.
O Talibã é aqui! – No Afeganistão, após a “retirada” das tropas americanas, o Talibã precisou de apenas 48 horas para derrubar o governo fantoche e corrupto de Ashraf Ghani. O grupo fundamentalista se estrutura em milícias; propõe a supressão dos poderes legislativos e judiciário; prega a vinculação entre Estado e Igreja; é contra o aborto; contra o casamento de pessoas do mesmo sexo e é anticiência. Alguma semelhança com o bolsonarismo?
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia