Júlio Miragaya (*)
Após a Revolução Russa de outubro de 1917, a progressiva consolidação do controle soviético sobre o imenso país logo suscitou uma violenta reação das classes dominantes, que, com mercenários sob o comando de oficiais czaristas, formaram os Exércitos Brancos, que realizaram sangrentos ataques às regiões sob controle soviético, no que se convencionou chamar de Terror Branco. A resposta não tardou e os bolcheviques formaram, a partir do alistamento de operários e camponeses, o Exército Vermelho, que desmantelou o Terror Branco em 1921.
No Brasil, não temos uma guerra civil. Mas, diante da vitória das forças progressistas, a reação à vontade majoritária do povo gerou o que podemos chamar de “Terror Amarelo”. Assim como na Rússia – onde as ações no plano político refletiam uma motivação econômica e social, com os “Brancos” buscando restaurar a ordem capitalista (e os “Vermelhos”, preservar e ampliar a propriedade social dos meios de produção) – também aqui os “terroristas amarelos” estão a serviço do capital, a “turma da Faria Lima”, do “ogronegócio” e adjacências.
No plano político, a ação dos amarelos começou com a negação da vitória eleitoral de Lula, pretexto para deflagrar um golpe de Estado. Este foi inicialmente concebido na forma de um decreto presidencial que, logo após o 2º turno, decretaria o estado de defesa no TSE e instituiria uma “Comissão de Regularidade Eleitoral”.
Controlada pelas FFAA e integrada por instituições “bolsonarizadas” (PGR, CGU, AGU, PF), teria a finalidade de “apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral” e, como era inconstitucional, previa prisão para quem se opusesse às suas atividades (alusão aos ministros do STF). Frustrado o golpe, provavelmente por falta de suficiente apoio interno e risco de total isolamento externo, foi engavetado na casa do ex-ministro Anderson Torres.
Paralelamente, se deu o agrupamento dos “terroristas amarelos” nos inúmeros acampamentos nas portas dos quartéis, descaradamente tolerados pelos comandos militares. Planejaram ações violentas que gerariam o caos político e social, e, com base no famigerado artigo 142 da Constituição Federal, demandariam a intervenção das FFAA: bloqueios de rodovias (com a conivência da PRF), alguns com incêndios de caminhões, o “badernaço” em Brasília em 12 de dezembro, a tentativa de explosão de um caminhão-tanque no aeroporto da capital da República, a explosão de torres de energia, culminando com a invasão e depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do STF em 8 de janeiro.
Apesar da escancarada colaboração de comandantes das FFAA e da PMDF, a segunda tentativa também falhou.
Mas se na esfera político-militar as tentativas de golpe têm falhado, no plano econômico o “Terror Amarelo” opera na forma da pressão dos poderosos agentes econômicos, o “mercado”, que busca impor seus interesses, absolutamente antagônicos aos da maioria da população, os trabalhadores e os mais pobres.
Antes mesmo de Lula assumir, reverberados pela grande mídia, criticavam a anunciada mudança na política de preços da Petrobras, a retirada da Petrobras, da ECT e de outras empresas da relação de estatais a serem privatizadas, e a PEC da Transição, chamando-a de PEC da gastança.
Agora, enquanto especulam no mercado de câmbio e de ações, pressionam pela indicação de mais um preposto de banqueiro (agora do Santander) para a diretoria do Banco Central e exigem uma nova âncora fiscal que limite os gastos sociais. Mas nem uma linha sobre os gastos de quase R$ 700 bilhões com juros da dívida pública, sobre a Selic a 13,75% (juros reais de 7,5% a.a.) e a tributação zero de IR para os ganhos em juros e dividendos distribuídos aos acionistas (R$ 604 bilhões só nas empresas negociadas na Bolsa).
Por fim, pressiona para que Lula fixe o salário-mínimo em R$ 1.302, embora o presidente tenha prometido aumento real, com mínimo de R$ 1.320 em 2023 (IPCA de 5,79% e aumento do PIB de 3% em 2022). Não se pode dar esta primeira vitória ao “Terror Amarelo”.
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia