Tradicional financiador dos projetos de urbanização e de investimentos, a Terracap vai ter que ir a mercado captar R$ 80 milhões para financiar a elaboração de novos projetos imobiliários no Distrito Federal. É a primeira vez que isso acontece. A situação financeira da empresa repercute em projetos tocados pelo GDF.
No primeiro semestre de 2016, a Terracap só pôde repassar ao governo R$ 1,604 milhão – recurso que mal dá para construir um centro de saúde. E, em 2017, R$ 3,694 milhões. Para se ter uma ideia, em 2012 esses repasses representaram R$ 460 milhões (R$ 412 milhões só para o estádio Mané Garrincha).
Em entrevista exclusiva à coluna, o presidente da empresa, o engenheiro agrimensor Júlio César Reis, informa que a situação é preocupante, mas que a estatal “está com todos os pagamentos a fornecedores e servidores em dia”. “Em 2018, vamos tirar a Terracap do vermelho” – promete.
O balanço com o resultado financeiro do primeiro semestre de 2017 aponta que houve uma perda de receita na venda de imóveis e de outros serviços de 43,45%, quando comparado ao mesmo período de 2016. Foram R$ 74.134.043 em 2017 contra R$ 131.102.221 no ano anterior. Uma receita a menor da ordem de R$ 57 milhões.
No mesmo período, as despesas cresceram 13,82% pulando de R$ 125,2 milhões para R$ 219,5 milhões. A diferença entre receitas e despesas vem sendo coberta pelas gorduras acumuladas na empresa. “Essa gordura agora acabou”.
A explicação para esse quadro inédito na história da empresa que já foi considerada “o principal banco do DF” é, segundo ele, baseada na crise econômica que reduziu as vendas de novos imóveis, a falta de produtos atrativos para o mercado imobiliário e na herança maldita do Estádio Mané Garrincha, que sugou R$ 1,3 bilhão da Terracap.
Vermelho
O balanço financeiro publicado nos jornais só não está no vermelho brilhante pelo fato de ela ter se valido de um recurso contábil, considerado legal, mas que ao olho da sociedade causa estranheza.
A empresa se valeu de uma gleba de terra nas imediações de São Sebastião, internamente denominada Papuda I, com cinco mil hectares de área, e a lançou sob o título “Receita de Avaliação ao Valor Justo – Propriedade para Investimento”, no valor de R$ 217,594 milhões.
Caso não tivesse feito isso, o balanço teria apresentado um déficit de R$ 88.830.942 como resultado contábil. Para corrigir esse rombo, a empresa vem reduzindo suas despesas de pessoal. Incentivou a aposentadoria de 226 servidores. E repôs apenas 33. Mas esse programa de demissão incentivada gerou uma despesa extra de pessoal de R$ 34,898 milhões.
Inadimplência
Também vem atuando na redução da inadimplência de quem comprou lotes. Até na Black Friday ela fez promoção para quem pagasse os atrasados. O maior problema é em relação às comercializações ocorridas antes de 2012. De cada dois lotes vendidos, um está inadimplente, e as regras da época não exigiam garantias fiduciárias. Desta forma, a empresa não pode nem retomar os imóveis.
Outro problema é a falta de imóveis atrativos, “filé mignon” como os bons terrenos são chamados internamente. Atualmente, só tem osso. São lotes que não geram muitos recursos, a aceitação é pequena junto aos empreendedores e os consumidores de baixa renda não têm o hábito de participar das licitações. Aí ficam encalhados. Basicamente, o que há de melhor são algumas projeções remanescentes no Noroeste e lotes residenciais no Setor Jardim Botânico.
Entre 2008 e 2015 nenhum novo projeto imobiliário foi aprovado e registrado para que pudesse ser agora comercializado. Por isso, a busca de recursos no mercado financeiro para custear os novos projetos.
Taquari no caminho da saída
A empresa, que deixou de ser chamada Companhia Imobiliária de Brasília para ser denominada Agência de Desenvolvimento do DF, vai priorizar o patrimônio já existente. Produto novo mesmo, somente a Etapa 2 do Taquari 1, conhecida como Serrinha do Paranoá. “Já está pronta para ser vendida”.
Contrariando recomendação do Ministério Público, que é contra o loteamento, em abril do próximo ano os primeiros lotes deverão ser ofertados em licitação. A iniciativa também é contestada por ambientalistas. Afirmam existir ali mais de cem nascentes. Com um discurso bem alinhado com o do governador Rodrigo Rollemberg, Júlio Reis diz que a área está sendo tomada pela grilagem.
Sem tempo e sem recursos para preparar novos projetos imobiliários, vai buscar o que está pronto na prateleira e expor aos potenciais consumidores. Nessa lista, estão o Estádio Mané Garrincha, o Ginásio Nilson Nelson e o Complexo aquático Cláudio Coutinho. Juntos ganharam a denominação de Arena Plex e serão colocados em oferta pública.
O Autódromo Nelson Piquet será alvo de um projeto em separado. Um estudo de potencialidades está sendo feito. O Cine Drive-In será preservado, mas é possível que a área do Autódromo ganhe estabelecimentos comerciais e até um hotel de trânsito.
Nessa mesma linha de privatização – nome que a Terracap não concorda – está o Parque de Exposições da Granja do Torto. Uma subsidiária da Terracap irá administrar a Cidade Digital, rebatizada de Biotic – Parque Tecnológico do DF, e essa empresa poderá ter a participação de investidores externos.
Condomínios
Outra linha de captação de receita está baseada na venda direta dos imóveis inseridos nos condomínios regularizados. Aí estão o Ville de Montagne, Jardim Botânico e Solar Brasília. Outras áreas públicas invadidas no passado deverão reforçar o caixa. Dentre elas, Vicente Pires, Bernardo Sayão e Arniqueiras.
Até mesmo lotes comerciais em áreas consideradas sociais, como Sol Nascente e Por do Sol, deverão ir para à venda. Os lotes residenciais dessas duas localidades serão concedidos. Para o segmento empresarial, um dos projetos elaborados pela empresa Jurong deve sair do papel. É o Polo de Logística, rebatizado de Polo Atacadista, entre o Recanto das Emas e Samambaia, às margens da BR-60, que liga Brasília a Goiânia. Ali, lotes serão ofertados para que atacadistas se instalem.
Projetos pro futuro
Esses são os projetos de curto prazo. Ao contrário do informado pela Secretaria de Meio-ambiente, a Terracap não abriu mão de dois outros projetos elaborados pela Jurong, a chamada Cidade Financeira, às margens da DF-140, na antiga Fazenda Santa Bárbara, continua nos planos. Da mesma forma, a Cidade Aeroportuária, em Planaltina, onde seria instalado um aeroporto de carga.
Mas são projetos para o futuro. Segundo Júlio Reis, em dez anos o aeroporto JK estará com a capacidade saturada e é preciso ter outra opção. Os projetos devem ser revistos. Contudo, a instalação de moradias na Cidade Financeira não será mais contemplada e na Cidade Aeroportuária, onde se previa uma população de até 900 mil habitantes, será reduzida.