Desde a noite da última sexta-feira, quando um grupo de cerca de 30 pessoas invadiu a Universidade de Brasília (UnB), a comunidade acadêmica está em alerta a novos ataques, principalmente por causa de boatos de que novas ações estariam sendo planejadas. O receio aumentou ontem, com a divulgação de áudios e imagens de conversas que teriam sido compartilhadas em uma rede social, da qual fazem parte os manifestantes acusados de terem proferidos ofensas de cunho racista e homofóbica contra os alunos.
A Secretaria de Estado de Segurança Pública e da Paz Social informou que tomou conhecimento das conversas pelo serviço de inteligência. A partir daí, tomou providências e reforçará o policiamento no câmpus Darcy Ribeiro por meio da 3º Batalhão de Polícia Militar (Asa Norte), responsável pelo local. Em nota, a pasta afirmou que “o direito de manifestação é livre, desde que não haja qualquer tipo de violência ou incentivo à intolerância ou à discriminação”.
A reação não é a única desde o protesto de sexta-feira. O Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) recebeu cinco denúncias na Ouvidoria contra o ato solicitando a abertura de investigação. A Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência (Decrin) instaurou inquérito para investigar o caso. A delegada responsável ouviu quase 10 pessoas desde segunda-feira, com o intuito de identificar os autores. O promotor Thiago Pierobom, do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do MPDFT se reuniu com a Decrin e solicitou “o empenho usual para esclarecimento dos fatos”. Ele também instaurou procedimento administrativo para acompanhar as investigações policiais em andamento. E, por meio da assessoria de imprensa, informou que é preciso esperar a conclusão das apurações para definir as medidas a serem adotadas diante dos crimes que forem identificados a partir das provas coletadas.
Hoje, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) entregará à administração do câmpus uma lista de telefones celulares das pessoas que supostamente planejaram e participaram da manifestação. “Nós queremos encaminhar todos esse áudios para a Polícia Federal. Conseguimos acesso aos números das pessoas e faremos contato com a polícia para eles entrarem no caso. Tem coisas muito graves ali”, apontou o presidente do DCE, Gabriel Bertone. De acordo com as mensagens, homens e mulheres arquitetaram a invasão à universidade por meio do aplicativo WhatsApp. As conversas mostram o grupo combinando levar pistolas de choque elétrico e bandeiras com canos de PVC, para serem usados como arma. Também afirmam terem estourado duas bombas no ato. E se vangloriam de a polícia “ter ficado do nosso lado”.
Não há provas de que os áudios sejam realmente do grupo que invadiu a UnB na sexta-feira. Uma das integrantes do protesto, Kelly Bolsonaro nega os discursos, diz que qualquer pessoa poderia gravá-los e jogá-los na internet e que “a mídia e os estudantes estão fazendo tempestade em um copo d’água (Leia matéria ao lado)”. O reitor da UnB, Ivan Camargo, acredita que as ameaças existem. “Não acho que estejamos fazendo tempestade em copo d’água. A ameaça é real. O dramático é que somos muito vulneráveis por sermos uma universidade aberta no meio da cidade”, afirma. Ele esclarece que as providências necessárias estão sendo tomadas para evitar novas confusões. “Reforçamos a segurança da UnB e a orientação é para chamar a polícia no caso de qualquer ameaça.”
Discussão
As agressões e a divulgação dos atos foram discutidas na tarde de ontem, durante a Assembleia Geral Universitária organizada por professores, estudantes e técnicos da UnB. A vice-presidente regional da União Nacional dos Estudantes (UNE), Luiza Calvette, disse que os ataques geraram medo e preocupação, principalmente nos alunos gays e nas mulheres. “Eu espero que, com as denúncias no Ministério Público, as pessoas parem com esses ataques. Mas, sinceramente, acho que essa história vai se alongar um pouco”. O presidente da Associação dos Docentes da UnB (Adunb), Virgílio Arraes, lamentou o ocorrido. “Tudo o que afronta a democracia deve ser repudiado sem excitação. Nesse sentindo, a Adunb espera que a administração superior, a reitoria, tome as devidas providências para preservar a integridade de todos que são da Universidade”, afirmou.