Bruno Santa Rita
Guitarras e bateria no máximo. Metais no volume mais alto. E fumaça… só se for de gelo seco. Nada de vício. Pelo menos duas bandas de rock pesado brasileiras têm feito das suas composições um caminho para pregar abstinência das drogas. A brasiliense hardcore “Lost in Hate” e a paulistana “Bayside Kings” exploram seus sons de forma condizente com a ideologia da banda, o “Straight Edge” (que em português, significaria “caminho reto”).
O grupo da capital, por exemplo, investe em projetos sociais condizentes com a ideologia da banda. Eles passam ideais por meio de projetos sociais, tocam e palestram em escolas. Eles apóiam institutos que lutam contra as drogas e os vícios e procuram a total abstinência de entorpecentes. O que vale também para tabaco, álcool e outras drogas. “Os alimentos que arrecadamos nos shows beneficentes são destinados a instituições ligadas à recuperação de viciados”, afirma o baixista da banda, Fábio Alexandre.
Realidades pessoais
Além de Fábio, os outros intergrantes da banda são Guigows (voz), Raphael Kenji (guitarra), Wellington Mota (guitarra) e Bruno Duarte (bateria). O grupo se uniu, inicialmente, pela vontade de passar uma mensagem através da cena “underground” do “hardcore”. Quando descobriram que todos seguiam a mesma ideologia e tinham o mesmo gosto musical, decidiram montar uma banda seguindo os passos de grupos como Stick to Your Guns, The Ghost Inside e Heaven Shall Burn.
Além de ter músicas que falam das realidades pessoais dos membros da banda, outras letras falam da cultura “Straight Edge” e da luta contra as drogas lícitas e ilícitas, relembrando também simbologias da ideologia, como o “x”, geralmente, marcado nas costas das mãos como forma de representação de que a pessoa aderiu ao caminho sóbrio. Na banda, também há membros que seguem dietas vegetarianas e veganas (dieta sem alimentos de origem animal), embora essa não seja a principal bandeira do grupo. Para ele, o veganismo e o “Straight Edge” se alinham, uma vez que estar livre dos vícios pode ser análogo à liberdade dos animais que são criados com a finalidade de se tornarem alimentos. “O ‘Straight Edge’ é a libertação dos vícios, o veganismo, a libertação do animal. Há uma preocupação quanto ao que a indústria pecuária se tornou”, afirma Fábio Alexandre.
Os integrantes do grupo acreditam que a cena de hardcore é muito mais movimentada pelas bandas e por eventos autônomos do que por produtores locais. “Se a gente não fizer os shows, ninguém vai fazer, então, não dá para contar com os produtores locais”, diz Fábio.
Punk vegano
O vocalista da banda Bayside Kings, de São Paulo, Milton Aguiar, de 31 anos, explicou que a filosofia “Straight Edge” é, resumidamente, o hardcore punk livre de drogas. Segundo Milton, a subcultura foi iniciada por volta dos anos 1980 em Washington DC, nos Estados Unidos. A ideologia surgiu a partir da ideia de que para se questionar as situações cotidianas como situações políticas, crises econômicas ou até mesmo crises pessoais, não seria necessário estar sobre o efeito de entorpecentes, pelo contrário, o ideal seria manter a “mente limpa”. Ser “Straight Edge” para Milton Aguiar é a única forma de vida que ele enxerga pra si mesmo. Desde que ele teve contato com a cultura do skate de rua e o hardcore punk, suas convicções sobre a vida estabeleceram uma base. “Não existe um outro eu em outro lugar. Todas estas opções e lutas diárias vieram da minha associação com o hardcore punk e os ‘Straight Edge’”, argumenta.
Milton Aguiar nunca teve um histórico com as drogas, apenas uma experiência com álcool e tabaco no ensino médio. Segundo ele, a criação de seus pais fora o bastante para que ele não seguisse o caminho das drogas. “Eu não sabia como seria o efeito da droga em mim, então não quis usar. Não é para mim”, justifica;
Morte dos animais
A ideologia do veganismo e a dieta vegetariana são também parte das subculturas advindas do punk hardcore. Para Milton Aguiar, todas as coisas são energia e, portanto, a sua alimentação também seria baseada em energia. Nesse caso, ele opta por não carregar energias negativas advindas da morte dos animais e questiona se é certo ter uma alimentação baseada na energia do assassinato. O vocalista só teve essa consciência no ano de 2013, quando iniciou sua luta para aderir a uma dieta vegetariana. “Desconstruir uma cultura milenar do uso da vida animal em benefício próprio é o caminho. É difícil, mas nós podemos, nós temos a opção”, afirma o cantor.
O veganismo, vegetarianismo e o “Straight Edge” são apenas algumas subculturas advindas do hardcore punk. Milton Aguiar diz que quanto mais nos informamos, mais temos noção das práticas que são necessárias para se construir um mundo melhor. E lembra que há várias outras lutas diárias presentes na ideologia do gênero musical, como o racismo, o machismo e a homofobia.