Os 13 mil moradoras das 53 comunidades que compõem o arquipélago de Bailique, no norte do Amapá, vivem um drama: devido à construção de três hidrelétricas nos últimos 50 anos no antes caudaloso Rio Araguari, o curso d’água perdeu força e passou a ser invadido pelo oceano. Assim, a água que sempre foi usada pelos moradores, ficou salgada e tornou-se imprópria para o consumo humano. E a situação piora a cada dia.
Segundo o censo de 2010, o arquipélago a 180 quilômetros da capital Macapá, formado por oito ilhas, tinha 7.618 habitantes, a maioria vivendo distante dos centros urbanos. Mesmo assim, Bailique foi a primeira comunidade a cumprir a exigência do artigo 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê “uma ação coordenada e sistemática com vistas a proteger os direitos desses povos e a garantir o respeito pela sua integridade”. (Protocolo Comunitário).
Isso, no entanto, não evitou que o arquipélago se tornasse um exemplo vivo dos debates acirrados sobre desenvolvimento, preservação, bem-estar social e descaso governamental. Segundo a representante da comunidade e ativista ambiental Rosi Nogueira, o problema da água do mar invadindo o Rio Araguari está longe de ser o único a afetar a população local.
Os bailiquenses também sofrem, há tempos, com a falta de energia. Em 2015, as comunidades da ilha foram conectadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN), mas a situação piorou. A empresa que executou os serviços de fiação fez um trabalho inadequado para a realidade da região, o que vem provocando grandes erosões e quedas de terra intensas em vários lugares.
A população aponta falta de planejamento para situações atípicas, uma vez que a fiação foi instalada muito próxima à margem do rio. Com isso, os postes caem e provocam a interrupção do fornecimento de energia. E cada poste que desaba leva de dois a três dias para ser recolocado, intervalo em que a energia permanece cortada.
Próspero e abundante em riquezasnaturais, o arquipélago de Bailique é uma região rural e seus moradores vivem basicamente da pesca e da extração do açaí. Porém, por causa da falta de eletricidade, os pescadores e extrativistas têm passado dificuldades, devido à impossibilidade de produzir gelo para conservar seus produtos ou mesmo guarda-los em freezers.
Em relação à falta de água potável, a opção que restou aos ribeirinhos tem sido comprar água mineral. Porém, ospreços são exorbitantes. Quanto aos cortes de energia, mesmo com a mobilização da comunidade, as autoridades locais e regionais não têm tomado qualquer providência. “Não nos apresentaram nenhuma proposta ou estudo técnico para amenizar ou solucionar o problema”, denuncia Rosi Nogueira.
“A classe política só se importa com a população quando se aproximam as eleições. Aí, surgem promessas fantasiosas, logo esquecidas após o fechamento das urnas”, conclui a ativista ambiental e social. Para chamar a atenção da opinião pública, ela lança um apelo dramático:
“Divulguem na mídia nacional para que todo o Brasil saiba deste descaso e se solidarize com a população desta região tão longínqua. É fundamental que o mundo veja até onde vai o descaso do Poder Público com o povo da floresta, essa gente que trabalha e vive da floresta, em especial o povo do arquipélago de Bailique. Ajudem-nos! Pedimos socorro!”.
(*) Consultor e assessor técnico em projetos e convênios