Júlio Miragaya (*)
O que têm em comum Pinochet, Bin Laden e Bolsonaro? E que diabos tem a data 11 de setembro, desde 1973 lembrada como o dia do sangrento golpe militar de Pinochet no Chile. Em 2001, ficou também marcada como um dos maiores ataques terroristas da história, com a destruição das Torres Gêmeas em Nova York e danos ao Pentágono, em Washington. Passados 24 anos, veio o dia da inusitada condenação de um ex-presidente, três generais estrelados e um almirante por tentativa de golpe de Estado no Brasil.
Aparentemente não há nenhuma ligação entre os três homens citados, mas é só aparência. Além de serem figuras autoritárias e praticantes e defensores da violência, tortura e morte como instrumentos da política, o trio é associado ao imperialismo norte-americano. Pinochet e Bolsonaro, muito óbvios, mas Bin Laden, nem todos sabem, emergiu patrocinado pelos EUA, tal qual o Talibã e o ISIS.
Rico empresário saudita e anticomunista ferrenho, Bin Laden formou uma milícia e se associou ao Talibã para combater os soviéticos que haviam invadido o Afeganistão em 1979. Recebendo armamento dos EUA, em 1989 conseguiram expulsar os soviéticos. Sunita Wahabista, inimigo dos xiitas, apoiou o Iraque na guerra contra o Irã (1980/88) e fundou a Al Qaeda em 1988. Contudo, após a invasão do Iraque em 1991 e o suporte dado a Israel, começou a se voltar contra os EUA. Em 1998 promoveu ataques às embaixadas dos EUA no Quênia e na Tanzânia, e em 2001, os ataques nos EUA. Pinochet, Bolsonaro e Bin Laden são apenas mais três figuras repugnantes geradas pelo imperialismo.
O vergonhoso voto que Fux deu – O voto que o ministro Fux deu entra para a história como um dos mais vergonhosos produzidos na Suprema Corte. Fux teve a audácia de absolver o chefe da organização golpista e condenar seu ajudante de ordens. É como condenar um militar da Wehrmacht e isentar Hitler pelas chacinas na 2ª Guerra Mundial.
Fux isentou Bolsonaro e a alta cúpula militar, afirmando, de forma infame, que a tentativa de golpe não passou de elocubrações entre algumas pessoas. Disse que foram, no máximo, atos preparatórios, sem qualquer ação, negando os atos executórios fartamente apresentados pelo relator Alexandre de Moraes: inúmeros discursos e reunião com embaixadores visando desacreditar o processo eleitoral; monitoramento de políticos da oposição pela Abin e bloqueio de rodovias pela PRF no dia do 2º turno em redutos eleitorais de Lula.
Somam-se a isso os inúmeros atos buscando gerar convulsão social que demandasse convocação da GLO ou instauração do Estado de Sítio: inação da PRF em desobstruir mais de 150 bloqueios de rodovias que impediam o abastecimento de combustíveis, alimentos e medicamentos; derrubada e danificação de pelo menos 16 torres de transmissão de energia; tentativas de bloqueio em refinarias de petróleo; acampamentos diante de quartéis em dezenas de cidades pedindo intervenção militar; incêndios de ônibus e carros, depredação de delegacia e tentativa de invasão da sede da PF em Brasília em 12/12, dia da titulação de Lula e Alckmin; tentativa de explosão de caminhão-tanque no aeroporto de Brasília, com potencial de gerar centenas de mortes e os ataques de 8 de janeiro ao Planalto, ao Congresso e à sede do STF, com a complacência da PM do Distrito Federal.
Sim, o golpe de Estado não ocorreu, os planos “Punhal Verde e Amarelo” e “Copa 2022” não ocorreram, assim como a minuta do golpe – que previa prisões, intervenção no TSE e criação do Gabinete Institucional de Gestão da Crise, espécie de governo provisório gerido por Braga Neto e Augusto Heleno – ficou nos atos preparatórios. Mas só não se tornaram atos executórios porque os comandantes do Exército e da Aeronáutica se recusaram a aderir ao golpe, isolando Bolsonaro, Braga Neto e o comandante da Marinha.
Muitos dirão que é Teoria da Conspiração, mas parece evidente que o voto de Fux foi encomendado por Washington, com o objetivo de disseminar a narrativa de que a condenação foi injusta, dando margem para questionamentos internos e externos. Vem a calhar com a declaração de Karoline Leavitt, porta-voz de Trump: “O presidente Trump não tem medo de usar meios econômicos nem militares para garantir a liberdade de expressão ao redor do mundo. A liberdade de expressão é a questão mais importante dos nossos tempos. O Presidente leva isso muito a sério, e por isso tomamos ações contra o Brasil”.
Tal declaração revela que o cinismo dos EUA não tem limites. A Arábia Saudita, aliada visceral dos EUA, baniu a liberdade de expressão desde 1926, há incríveis 99 anos, quando da ascensão da Dinastia Saud ao poder. Não só a liberdade de expressão, mas também liberdade de organização, de imprensa, sindical, partidária, das mulheres etc. Mas isso parece não incomodar nem um pouco o imperialismo norte-americano.
Noves fora, fica a patética declaração de Bolsonaro: “Do Planalto, só saio vitorioso, morto ou preso!”. Sem comentários.
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan (atual IPEDF) e do Conselho Federal de Economia