Uma das principais buscas no Google quando o assunto é câncer de mama diz: “Quanto tempo tenho de vida com câncer de mama avançado?”. E a resposta, digo como médico ginecologista e obstetra, exige mais do que um Dr. Google: depende do caso, do tratamento e de outros fatores.
No entanto, o que chama a atenção é o motivo pelo qual essa questão é recorrente. E os números explicam: Amazona, uma pesquisa inédita feita no Brasil, em 2019, apontou que 70% dos diagnósticos da doença são realizados em estágio mais avançado.
No Distrito Federal, essa realidade não é diferente. Em plena capital do Brasil, o que vemos, em denúncias de médicos, servidores e pacientes, é o descaso com o tempo. Porque o tempo, quando se trata de câncer, é material precioso, onde o presente é, de fato, um presente, e o futuro é esperança a conta gotas.
Por aqui, o Outubro Rosa é sem exame e tratamento. Ou melhor, na verdade, em época de campanhas de conscientização, a SES-DF faz uma espécie de sorteio para o famoso “mutirão” de retirada de câncer de mama – uma “ação” com data para acabar: 31 de outubro. Agora, serão 48. Virou o mês, as outras que estão na fila, lá continuarão.
Segundo a Secretaria de Saúde, há hoje no DF 11 mamógrafos. Cada um tem capacidade para cerca de 480 exames/mês. Esses aparelhos são extremamente necessários para o que prega a campanha do Outubro Rosa: a prevenção.
No entanto, o que a SES-DF não revela é que a maioria dos mamógrafos é antiga e precisam de uma série de insumos para funcionar. Além disso, segundo servidores, faltam manutenção dos aparelhos e recursos humanos para lidar com eles.
Ou seja, capacidade instalada existe. O que falta é vontade da gestão de investir em manutenção, materiais e recursos humanos. As famosas prioridades.
O Ministério da Saúde preconiza que a faixa etária indicada para a mamografia é entre 50 e 69 anos. E o exame deve ser realizado a cada dois anos. Segundo dados do IBGE, neste ano, o grupo elegível para a mamografia, no DF, é de 153.965 mil mulheres.
E, choquem: até agora foram realizadas apenas 2.571 mil mamografias. É Outubro Rosa Choque mesmo!
Feita a mamografia, se for diagnosticado o câncer, é necessário iniciar o tratamento. Só que isso tem levado, na rede pública do DF, em média, três meses. A demora é inimiga da paciente com câncer. Assim como a indiferença é inimiga de uma boa gestão pública.
– “Mas, Dr. Gutemberg, e quando a paciente começa o tratamento, como funciona?”. Também nesta etapa é preciso atenção e investimento. No entanto, segundo fontes do hospital de referência em tratamento de câncer no DF (o Base), faltam medicamentos para esta fase na luta contra o câncer.
No ano passado, inclusive, a Defensoria Pública do DF levou a situação ao Tribunal de Justiça. O órgão relatou à Corte aumento de pedidos relacionados à interrupção dos tratamentos quimioterápicos contra o câncer, principalmente o de mama. Ao analisar o caso, o juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública e da Saúde do DF afirmou: “a omissão é inadmissível.”
E a omissão sempre será inadmissível. Por isso, neste mês, o tom do SindMédico é Rosa Choque. Para que, diante do absurdo, a nossa capacidade de indignação seja, também, impulso para as mudanças que buscamos na Saúde Pública do DF. Números, dados e vidas perdidas não mentem. O cenário tem que mudar. É preciso dar à saúde o tratamento que ela merece.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasília Capital