J. B. Pontes (*)
A Lei Orçamentária Anual (LOA) é o mais importante instrumento que consolida o planejamento estratégico do governo. É por meio do orçamento público que se garantem os recursos (dotações) para o alcance dos objetivos traçados nos planos governamentais – programas e ações -, obedecendo as prioridades e metas neles traçadas, de forma a promover o bem estar da população.
É na LOA que se estimam as receitas – dinheiro arrecadado dos contribuintes –, e se definem para quais finalidades os recursos serão aplicados – as despesas a serem executadas em determinado exercício. Aplicação das receitas do governo – arrecadadas de todos nós – deve ser feita com base em adequado planejamento, a partir de diagnósticos feitos por meio de estudos técnicos capazes de apontar as demandas e necessidades da sociedade nas diferentes áreas de atuação governamental – saúde, educação, segurança pública, saneamento, meio ambiente etc.
Assim, quanto mais realista for o orçamento público, mais chance se terá de promover o desenvolvimento econômico-social do país, garantindo o bem comum e combatendo as desigualdades sociais e econômicas, pessoais e regionais.
Desvirtuamento do orçamento público no Brasil
Ao contrário, o Brasil cada vez mais se afasta do ideal de um orçamento público tecnicamente elaborado, voltado ao atendimento do bem comum. Hoje está ele submetido ao domínio de uma classe política – leia-se Centrão, onde o presidente de plantão também se lambuza – que só pensa nos seus próprios interesses – perpetuação no poder e manutenção dos privilégios -, desconsiderando a miséria de grande parcela da população e as legítimas demandas da sociedade.
Especialmente nos últimos anos do atual desgoverno, o orçamento público tem sido manipulado por essa classe política apodrecida, adoradora do deus ouro, que vem paulatinamente apoderando-se de mais e mais fatias dos recursos públicos, sempre em detrimento das áreas que mais exigem a atuação governamental.
A ação do Centrão
Na LOA para 2022, o Centrão fez a festa. Conseguiu alocar R$ 16,5 bilhões nas chamadas emendas de relator (RP9), uma aberração sem qualquer previsão ou amparo na Constituição Federal; R$ 4,9 bilhões para o Fundo Eleitoral – para garantir a reeleição dos atuais parlamentares nas eleições de outubro -; R$ 1,1 bilhão para o Fundo Partidário; R$ 10,93 bilhões em emendas individuais (cada parlamentar pode emendar até R$ 17,6 milhões, um verdadeiro absurdo); e R$ 7,54 bilhões em emendas de bancadas estaduais/distrital. Total: R$ 40,97 bilhões.
Além disso, relembre-se que os integrantes do Centrão ainda poderão ter acesso a partes dos recursos dos ministérios/órgãos sob o comando de seus indicados, a exemplo do Ministério do Desenvolvimento Regional, do Fundo Nacional de Desenvolvimento Escolar (FNDE) e tantos outros.
Com tantos excluídos e com tanta carência de recursos para áreas de atuação governamental tão importantes, como saúde, educação, ciência e tecnologia, entre outras, a atuação do Centrão, com a benevolência do presidente de plantão, constitui um escândalo.
Orçamento pífio
Tudo isso permite se afirmar que o orçamento aprovado pela recente LOA (Lei nº 14.303/2022) constitui um dos mais pífios dos últimos anos. É um orçamento do atraso. Vejamos alguns indicativos:
Valor total do orçamento: R$ 4,73 trilhões, sendo R$ 1,884 trilhão proveniente de refinanciamento da dívida pública (empréstimos que o governo faz para pagar dívidas mais antigas e seus encargos, também chamado de rolagem da dívida).
Pagamento de juros e encargos da dívida: R$ 1,609 trilhão. Despesa obrigatória, destinada aos rentistas (bancos e cidadãos que investem em títulos do Tesouro Nacional).
Valor destinado a Investimento: R$ 44 bilhões, o mais baixo dos últimos dez anos. Compare com o montante abocanhado pelo Centrão (R$ 40,97 bilhões) e com o valor de investimento na LOA 2012 (R$ 200 bilhões). Não seria exagerado afirmar que um país com um investimento tão desprezível não tem futuro.
Valor para ciência, tecnologia e inovação: R$ 10,3 bilhões.
O que era ruim ficou pior
Ao sancionar a LOA 2022, para atender parcialmente a reivindicação do Ministério da Economia, o presidente de plantão decidiu promover cortes no projeto aprovado pelo Congresso, no montante de R$ 3,124 bilhões. Seria fácil retirar esse valor das emendas de relator (R$ 16,5 bilhões) e do Fundo Eleitoral (R$ 4,9 bilhões). Mas, acovardado, temeroso de contrariar seus aliados do Centrão, vejam de onde ele tirou recursos:
R$ 1 bilhão do Ministério do Trabalho, especificamente do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS); e R$ 739,9 milhões da Educação. Seguiram-se cortes na Saúde; na Cidadania, na Ciência e Tecnologia entre outras áreas socialmente relevantes. As consequências negativas desses cortes em áreas tão relevantes e carentes de recursos, são inimagináveis.
(*) Geólogo, advogado e escritor
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasília Capital