Elaborados há 15 séculos pela Igreja medieval, as referências aos sete pecados capitais andavam meio esquecidos. Mas Bolsonaro tratou de resgatá-los em seu desgoverno. Começando pela soberba, expressa na frase “é só uma gripezinha”, e que envolveu negligência e irresponsabilidade de seus atos. Negligência em não prover suficientes testes para a covid-19; na falta de oxigênio em Manaus; na falta de kit intubação e no descaso em adquirir vacinas, com declarações desatinadas de que quem as tomasse poderia virar jacaré. Retrato do escárnio com a angústia do povo.
Aliás, a resistência em adquirir a CoronaVac, a falta de respostas às ofertas da Pfizer e sua declaração de que “um número grande de pessoas se infectando vão criar anticorpos”, deixaram claro que Bolsonaro apostava na chamada “imunidade de rebanho, não importando o número de vítimas, que poderia ser contado em milhões. A soberba também se expressou em atos irresponsáveis, como a crítica ao uso de máscara, o estímulo às aglomerações, censurando o distanciamento físico (“é um país de maricas”), a aquisição em massa e a recomendação do uso da cloroquina e as críticas estapafúrdias à China, dificultando a importação do IFA, insumo fundamental para a fabricação da vacina pelo Butantã e pela Fiocruz.
Já a ira é marca registrada do governo Bolsonaro, pois o ódio vociferado em seus discursos e de seus seguidores se tornou mais uma “página infeliz de nossa história”. Direcionou sua fúria a governadores e prefeitos, acusando-os de desvios de recursos públicos, omitindo que eles se dão, sobretudo, em estados governados por bolsonaristas, como Rio de Janeiro, Amazonas e Roraima.
Preguiça também é típica desse governo, que não dialoga, não trabalha para a resolução dos problemas do país, que usa seu tempo para receber o afago de bolsonaristas no “chiqueirinho”. A gula se nota na corrida dos militares em busca das boquinhas na administração civil, acentuada agora na “flexibilização do teto”, salários em dobro para militares no governo e salários congelados para servidores públicos.
A luxúria se vê nos milhões gastos em aquisições por órgãos de governo, notadamente as FFAA, de itens como picanha maturada, salmão defumado e uísque 12 anos. Que se tornam ainda mais descabidas quando contrastadas com a avareza com que são tratados os milhões de brasileiros que ficaram desempregados e recebem o pífio auxílio emergencial de R$ 250, míseros R$ 8,33/dia para sustentar uma família básica de 4 pessoas. Por fim a inveja, sim, inveja da riqueza dos EUA; da robustez do crescimento chinês; dos inquestionáveis indicadores sociais de Cuba e da enorme popularidade de Lula, inabalável entre os mais pobres.
Mas há um oitavo pecado cometido por este desgoverno: o desprezo pela vida, não listado entre os pecados capitais, mas que consta como “não matarás” dos dez mandamentos da Bíblia Judaica. Bolsonaro não tem qualquer apreço pela vida dos brasileiros. Não fossem a ação consciente da grande maioria do povo e as regras estabelecidas pela maioria dos governadores e prefeitos, exigindo o uso da máscara, impondo distanciamento social e cobrando a vacinação em massa, já teríamos superado 1 milhão de mortos. Desprezo que sempre nutriu, quando disse que a ditadura havia matado pouco, que deveria ter matado 30 mil, e que, diante da morte de milhares de pessoas na pandemia, respondeu: E daí?
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia