Michel Temer atravessa um Rubicão por dia. Tal como César lançou sua sorte diante de conquistas improváveis, o presidente mais uma vez no dia Vinte de Maio de 2017 foi a público responder acusações derivadas do acordo de delação premiada de Joesley Batista ao MPF. Se César tinha diante de si a força da lei romana, Temer tem diante de si a sanha de uma sociedade exausta pelo cotidiano de escândalos.
Dando seguimento a estratégia iniciada em sua primeira fala referente ao escândalo dos irmãos Batista, a fala de Temer teve dois focos principais: o primeiro, desqualificar o acusador. Enquanto o segundo buscou vincular a sua imagem ao processo de recuperação da economia e a aprovação das reformas necessárias para prover estabilidade ao país.
Em um misto de infortúnio e tragédia, a fala do presidente da república revela dois elementos preocupantes acerca do futuro político do próprio presidente e da política nacional. De um lado, é evidente que o mandatário principal do país tenta mudar o referencial pelo qual se observa a situação. Sua estratégia se baseia em levantar as falhas de caráter do acusador, a inconsistência das provas e a falta de responsabilidade do Ministério Público em aceitar uma ação que beirou a conspiração contra o país segundo ele. De outro lado, o presidente tenta se vender como pilar político e simbólico sobre o qual toda e qualquer solução da crise política e econômica passa.
Em termos de análise, um elemento que respalda a fala do presidente é o fato de que a principal peça do escândalo – uma gravação entre Joesley e Temer – possui algumas inconsistências técnicas detectadas por uma série de peritos em reportagem feita pelo jornal Folha de São Paulo. Porém, se esse elemento pode justiçar a narrativa de uma “Montanha pariu um rato”, o chefe do executivo não conseguiu, até o momento, explicar por qual motivo recebeu Joesley em sua própria residência e não se manifestou indignadamente no momento em que o acusador se vangloriava de suas peripécias em forma de propina.
A incapacidade da estratégia de defesa do presidente de responder tal questão até o presente momento gera dois principais resultados: de um lado, obriga a presidência a subir o tom da fala a cada novo pronunciamento. De outro, a cada decibel que a fala do presidente sobe, o ruído de fundo se torna também mais alto.
Neste sentido, é válido considerar que o fato de que partidos menos representativos da base foram os primeiros a desembarcar do governo – PPS e PSB – e isso pode significar apoio congressual a um eventual pedido de impeachment. E por fim, que o crescente burburinho no parlamento acerca de possíveis nomes de consenso em caso de eleição indireta.
A junção de tais elementos torna a situação do governo difícil, porém, não impossível de ser superada. De fato, há uma percepção reinante de que a fala e a estratégia de defesa judicial, tem dado tempo ao governo. Porém, a percepção de uma parte considerável da sociedade (sobremaneira, comunidade de negócios) de que Temer é o principal avalista de qualquer solução política para a crise econômica, parece mais diluída a cada dia.
Será, portanto, tão importante quanto o aumento do volume da fala do presidente e a absorção de seus discursos pela mídia e a sociedade, a abertura dos mercados na próxima segunda-feira. Partindo-se do princípio de que a economia vai bem a partir da conjunção do trinômio -estabilidade, previsibilidade e certeza (muito dependentes do mundo político) – a semana que se iniciou com tímidos indicadores positivos para o governo, termina com um esforço hercúleo do presidente em salvar a si próprio e preservar um legado que não seja retratado como trágico nos livros de história.
Se há, portanto, uma frase que possa definir os próximos momentos do governo Temer, ela é Alea Jacta est.}