O rei esta nú. O conto de fadas do dinamarquês Hans Christian Andersen, publicado no século XIX (1837), se encaixa perfeitamente ao que se passa, neste início de século XXI, com o ex-intocável Sérgio Moro. O carrasco dos investigados da Lava Jato, que revirou mundos e fundos e não teve pudor em violar as leis vigentes no País para condenar àqueles a quem pré-julgou como corruptos, não resistiu à abertura de algumas mensagens de seu celular.
O ex-juiz, que trocou a toga pelo cargo de ministro da Justiça de Jair Bolsonaro com a certeza de que seria alçado à condição de magistrado do Supremo Tribunal Federal em pagamento pelos serviços prestados na Operação Lava Jato, está exposto.
Na segunda-feira (1º), o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, retirou o sigilo da ação que tramita na Corte na qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva obteve acesso a mensagens da Operação Spoofing, que, em julho de 2019, prendeu suspeitos de invadir celulares de Moro e de integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Lewandowski determinou o acesso integral de Lula às mensagens apreendidas, depois que a Polícia Federal não entregou o material de acordo com o que determinava decisão anterior do ministro.
Também não acatou pedido de reconsideração de procuradores da República, entre eles o ex-coordenador da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, para não tornar público o teor das mensagens trocadas entre eles.
Os membros do Ministério Público pediam que as mensagens não fossem entregues a Lula ou, caso isto já tivesse ocorrido, que ele ficasse obrigado a devolvê-las e impedido de utilizá-las.
Ilícito – Moro afirmou, em nota, que não reconhece a autenticidade das mensagens e que, “se verdadeiras, teriam sido obtidas por meios criminosos, por hackers, de celulares de procuradores da República, sendo, portanto, de se lamentar a sua utilização para qualquer propósito, ignorando a origem ilícita”.
O ex-juiz disse, ainda, que “todos os processos julgados na Lava Jato foram decididos com correção e imparcialidade”. Segundo ele, “interações entre juízes, procuradores e advogados são comuns em nossa praxe jurídica, não havendo nada de ilícito, por exemplo, em perguntar sobre conteúdo de denúncia”.
Provando do próprio veneno
Com o fim do sigilo sobre o arquivo de mensagens da Lava Jato, procuradores, juízes e desembargadores passaram a ler seus diálogos nas páginas dos jornais – tal qual ocorreu com os principais investigados da operação. O potencial destrutivo, no entanto, é ainda maior, visto que o The Intercept e os outros veículos tiveram acesso a apenas parte do material, que contém 7 terabytes de arquivos.
Nas conversas, o então juiz Sérgio Moro chega a cobrar manifestações do MPF em processos e a sugerir uma fonte para os procuradores conversarem sobre investigações envolvendo o filho do ex-presidente. Também comunica sobre despachos que serão lançados por ele.
Outro trecho da Vaza Jato mostra o principal procurador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, mencionando que o procurador Januário Paludo foi conversar com desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
Este ponto avança as suspeitas de conluio para condenar o ex-presidente Lula, indicando que além de Sérgio Moro, os desembargadores também caminhavam de mãos dadas com os investigadores.
Farsa – Em uma mensagem trocada com Dallagnol, Moro reage com um emoji feliz à notícia de que Deltan estava prestes a protocolar uma denúncia contra o petista. “Denúncia do Lula sendo protocolada em breve. Denúncia do Cabral será protocolada amanhã”, escreveu o procurador. “Um bom dia afinal”, respondeu Moro, com um sorriso.