A viagem do presidente Lula à China gerou muita contestação na grande mídia brasileira e internacional. Desde questões menores, como a queixa da turma do “ogronegócio” de Lula ter incluído o líder do MST João Pedro Stédile na comitiva, até os reclames generalizados, aqui e lá fora, de ter se entendido melhor com Xi Jiping do que com Biden, e supostamente ter se alinhado aos chineses contra os norte-americanos.
Primeiramente, é preciso dizer que a viagem consolida uma aliança econômica estratégica entre os dois países que nem a escancarada hostilidade do governo Bolsonaro em relação à China conseguiu abalar. O país é, de longe, o maior parceiro comercial do Brasil. Para a China (incluindo Hong Kong), na média anual 2021/2022, exportamos cerca de US$ 100 bilhões, o triplo dos US$ 34 bilhões exportados para os EUA. E o saldo comercial com os chineses foi positivo em US$ 40 bilhões/ano, ao passo que com os EUA o saldo foi negativo em US$ 11 bilhões anuais. Precisa dizer quem merece mais mimo de Lula?
E de onde a grande mídia tirou o suposto alinhamento de Lula com os chineses? Ora, das críticas do presidente ao dólar como moeda dominante no comércio internacional e de insinuar que os EUA usaram a Ucrânia como “bucha de canhão” para desafiar a Rússia (entrada da Ucrânia na OTAN) e, fornecendo bilhões de dólares de material bélico aos ucranianos, estar prolongando a guerra. Disse alguma mentira?
Há 17 anos, iniciou-se o processo de formação do BRIC, agrupamento dos 4 maiores países em desenvolvimento: China, Índia, Rússia e Brasil (só em 2011, com a adesão da África do Sul, passou a BRICS) – chamados de “baleias” pela dimensão de seus territórios e populações – para se contrapor aos clubes dos países ricos, organizados desde 1961 na OCDE e, desde 1975, no G-7, integrado pelos 7 principais países ricos (EUA, Japão, Alemanha, Grã-Bretanha, França, Itália e Canadá).
Percebendo a força e o poder de atração do BRICS, o G-7 buscou atraí-lo e também outros países emergentes para um novo “fórum de discussão sobre governança global”, transformando em 2008 o G-20 (reunião de ministros da Fazenda e presidentes de BCs) em cúpula de chefes de Estado, reunindo os membros do G-7 acrescido da União Europeia, de outros dois países ricos (Austrália e Coréia do Sul) e dos dez principais países “em desenvolvimento” (os cinco do BRICS mais Indonésia, México, Turquia, Arábia Saudita e Argentina).
Mas a pauta do G-20 permanece determinada pelos países ricos. Para os países “em desenvolvimento” terem voz altiva, torna-se crucial ampliar o BRICS, assim como a representação deste no interior do G-20. Não por acaso, na “Declaração conjunta entre Brasil e China sobre o aprofundamento da parceria estratégica global” (de 14 de abril de 2023), em seu 7º item, consta que “Brasil e China apoiam as discussões no BRICS sobre o seu processo de expansão”. E no 8º item da Declaração consta que “a presidência brasileira do G-20 a partir de dezembro de 2023 é uma oportunidade para fortalecer as prioridades dos países em desenvolvimento no âmbito do grupo”. Mais claro, impossível.
Sim, o sucesso futuro do BRICS está em sua expansão e na ampliação de sua representação no âmbito do G-20. Três potências regionais “em desenvolvimento” que estão no G-20 (Turquia, Arábia Saudita e Argentina) já pleitearam a entrada no BRICS, assim como outras quatro que não o integram (Irã, Nigéria, Egito e Argélia). Há ainda outras três que devem ser “convencidas” a aderir ao BRICS, sendo que duas estão no G-20 (México e Indonésia) e outra não (Paquistão).
A próxima cúpula do BRICS será em agosto, na África do Sul, sob o lema “BRICS e África: Parceria para o Crescimento Mutuamente Acelerado, Desenvolvimento Sustentável e Multilateralismo Inclusivo”. Uma ótima oportunidade para potências africanas como Nigéria, Egito e Argélia serem admitidas como novos sócios do clube e acelerada a discussão para as demais adesões.