Desde 2018, as redes bolsonaristas propagam repetidamente que o Brasil não pode virar um país “comunista”, como Cuba, Venezuela, Argentina, China, Rússia, Belarus e até o Irã. Santa ignorância! Cuba é o único que se aproxima de um regime socialista. A China há 45 anos combina economia de mercado com alguma planificação socialista. Rússia e Belarus deixaram o “socialismo burocrático” há 32 anos e praticam nosso conhecido “capitalismo selvagem”. Argentina e Irã nada têm de comunistas ou socialistas, e a Venezuela tem socialismo apenas no nome do partido de Chaves/Maduro.
Os bolsonaristas, que tanto recorrem à Web, deveriam ir ao site do PNUD/ONU e constatariam que esses países por eles desprezados apresentam um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) superior ao do Brasil, que, aliás, viu o índice cair durante o desgoverno de seu “mito” (de 0,762 em 2018 para 0,754 em 2021, último dado divulgado).
Enquanto caía no Brasil, 87º no ranking mundial, na “comunista” Argentina subia para 0,842; nas “comunistas” Rússia e Belarus foi, respectivamente, de 0,822 e 0,808; no “xiita/comunista” Irã, de 0,774; na China, de 0,768 e em Cuba, após 61 anos de brutal bloqueio econômico por parte dos EUA, foi de 0,764.
Aliás, quando os bolsonaristas criticam Cuba, comparando o país com os EUA, Canadá ou Austrália, deveriam compará-lo a países da América Central e Caribe que tinham condições semelhantes quando da Revolução Cubana, em 1959, e que hoje têm IDH muito inferiores, tais como Jamaica (0,709), El Salvador (0,675), Nicarágua (0,667), Guatemala (0,627), Honduras (0,621)e Haiti (0,535).
Entre os “comunistas”, apenas a Venezuela (0,691) tem IDH inferior ao do Brasil. Mas quando se insere a desigualdade social, o Brasil despenca no ranking mundial e o IDH-D cai para 0,574, muito abaixo dos “comunistas” Belarus (0,765), Rússia (0,743), Cuba (0,720), Argentina (0,714), Irã (0,706), China (0,636), e, pasmem os bolsonaristas, até mesmo da Venezuela (0,600).
Incongruências do Censo 2022
No artigo “Censo 2022: negacionismo estatístico, resultados polêmicos” publicado neste Brasília Capital, apontei algumas incongruências no Censo 2022. Entre elas, a disparidade entre o número de novos habitantes (12,2 milhões) e o de novos eleitores (20,7 milhões) entre 2010 e 2022, numa relação entre novos eleitores/novos habitantes de 170/100, muito acima da registrada na década anterior (2000 a 2010), de 119/100 (21 milhões de novos habitantes e 25,1 milhões de novos eleitores).
Buscando explicar a forte redução no crescimento populacional, alguns analistas afirmam que ele se deveu a uma acentuada queda na taxa de fecundidade. Será? Vejamos: desde 1970 até 2010, sempre houve forte correlação entre a queda na taxa de fecundidade e a queda na taxa de crescimento populacional.
No período 1970/80, a taxa de fecundidade caiu 18,3% (de 5,52 filhos/mulher para 4,51) e a taxa de crescimento populacional caiu 14,2% (de 2,89% para 2,48% a.a.). No período seguinte (1980/1991), a taxa de fecundidade caiu 22,8% (para 3,48 filhos/mulher) e a taxa de crescimento populacional caiu 22,2% (1,93% a.a.).
Entre 1991 e 2000, as reduções foram, respectivamente, de 25,6% (2,59 filhos/mulher) e de 15,0% (1,64% a.a.). E entre 2000 e 2010, as quedas foram de 21,1% (2,04 filhos /mulher) e de 28,7% (1,17% a.a.), respectivamente. Mas neste último período (2010 a 2022) enquanto a taxa de fecundidade caiu 15,7% (1,72 filhos /mulher), a queda no crescimento populacional foi quase quatro vezes maior, de 55,6% (0,52% a.a.).
O parco crescimento populacional, se não é explicado pela queda na taxa de fecundidade das mulheres, também não o é por um suposto aumento no fluxo emigratório, pois teria que ter havido uma variação expressiva entre os dois períodos, e o que aparentemente ocorreu foi o oposto. A crise econômica na Europa atenuou o fluxo de brasileiros para o Velho Mundo e o endurecimento do controle migratório nos EUA produziu o mesmo efeito.
O IBGE nos deve explicações.