O Park Way, idealizado por Lúcio Costa como um cinturão verde para o Plano Piloto e garantidor das nascentes que alimentam o Ribeirão do Gama e o córrego Cabeça de Veado, bacias que respondem por um terço das águas do Lago Paranoá, corre o risco de ser adensado e perder grandes áreas de vegetação original do Cerrado. O temor de muitos moradores é que o bairro venha a ganhar contornos semelhantes ao de Vicente Pires.
Simultaneamente ao debate sobre a Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos), o GDF deu início ao debate sobre as novas Diretrizes Urbanísticas do Park Way. A proposta prevê a criação de cerca de 60 (sessenta) novos lotes residenciais de 20 mil metros cada um – passíveis de fracionamento em até oito residências – e largos corredores para comércio. Todas essas mudanças urbanísticas se somariam à Cidade Aeroportuária que a InfraAmérica deseja construir em terras do Park Way, mas que parece não estar sujeita às normas urbanísticas do Distrito Federal, mas sim a regras federais.
Na primeira audiência pública, a proposta provocou rejeição de muitos moradores e a simpatia por empresários que querem atuar no local. Com uma área de 31.598 Km², o bairro, corresponde por 68% da área da Apa Gama-Cabeça de Veado. O Park Way nasceu com a denominação Loteamento Mansões Suburbanas Gama. Eram apenas 300 lotes de 20 mil metros e a proposta visava angariar recursos financeiros para a Novacap.
Posteriormente, quando registrado em cartório, em 1961, já com a denominação Setor de Mansões Suburbanas Park Way, foram previstos 1.188 lotes, cada um com dois hectares, podendo contar com até três residências, mas sem direito a fracionamento. Pelo decreto nº 18.910, de 15/12/97, o então governador Cristovam Buarque, permitiu o parcelamento de cada lote em até oito unidades autônomas, com área mínima de 1.875 m². A medida triplicou o potencial de residências no bairro: de 3.564 para 9.504.
Segundo o estudo Subsídios ao zoneamento da APA Gama-Cabeça de Veado e Reserva da Biosfera do Cerrado: caracterização e conflitos socioambientais, editado em 2003 pela Unesco, esse crescimento foi responsável pelo soterramento de várias nascentes e drenagem do solo. “Os condomínios ao longo dos cursos d’água e nascentes, em médio prazo, causam destruição das áreas de preservação permanente, tanto por ações voluntárias como involuntárias dos seus ocupantes”, salienta o texto.
Além da questão ambiental e de garantia d’água, urbanisticamente falando, o Park Way é considerado o envoltório do Plano Piloto: elemento visual de proteção e articulação da paisagem da área tombada de Brasília. Os novos sessenta lotes residenciais idealizados pelo governo Rollemberg representarão, caso sejam fracionados, em mais 480 residências.
Esses novos lotes estão localizados nas pontas de conjuntos, a forma como cada quadra é dividida. Eles foram assegurados como áreas públicas e verdes para assegurar manchas de vegetação natural e que funcionem para diminuir o grau de impermeabilização do solo. A venda dessas passagens se assemelha à venda dos lotes em becos da cidade do Gama, só que em proporções maiores. Para a Terracap, contudo, a comercialização desses 60 lotes, a preços de mercado, pode representar um aporte de receita superior a R$ 300 milhões.
Comércio polêmico
A segunda novidade na proposta de Diretrizes Urbanísticas do Park Way é a introdução de áreas para comércio. Como dito antes, quando criado, o bairro era exclusivamente residencial. Comércio só na Vargem Bonita e no Núcleo Bandeirante.
O debate sobre a introdução de comércio no Park Way é tão antigo quanto polêmico. Projetos urbanísticos passados previram cinco áreas comerciais denominadas supermercados. Não existem mais no projeto urbano.
Muitos moradores são radicalmente contra o comércio. Entendem que o bairro perderá sua personalidade e passará a vivenciar problemas comuns a outras áreas, como o trânsito mais intenso, violência, sujeira, insegurança, poluição sonora e ambiental. O Park Way não tem coleta e tratamento de esgoto, a coleta de lixo é precária e água e energia já operam no limite.
Ilhas e galerias
Os que defendem a chegada das lojas falam em pequenas ilhas de comércio de vizinhança, tipo padaria e farmácia. O certo é que qualquer proposta de comércio implica em desmatamento. Atualmente, não existe nenhuma área com previsão para tal fim. Onde não há casa, existe cerrado. Para evitar esse desmatamento, uma alternativa seriam galerias comerciais suspensas, passando sobre a EPIA/BR-040, nos moldes existentes nas rodovias paulistas e na Europa.
A proposta do GDF não usa a técnica de ilhas, mas sim de grandes manchas e corredores comerciais. O primeiro corredor seria próximo ao Aeroporto de Brasília, por de trás da quadra 14. Uma espécie de Setor Comercial Park Way também é proposto. No governo Agnelo, seria erguido no bairro. O Polo Multifuncional foi inicialmente previsto para a intercessão da EPIA com a EPDB. Agora indicam um longo corredor margeando a antiga ferrovia da RFFSA. Inicia na quadra 6 do Park Way e termina nas imediações das quadras 17 e 26.
Outras duas manchas de terras comerciais são: a extensa área verde delimitada pelas quadras 9, 10 e 11; e a área verde entre as quadras 11 e 13. Na extremidade Sul da quadra 26 também foi projetado comércio. Por fim, as duas margens da via que liga a EPIA à Granja do Ipê, onde funciona a Universidade da Paz, também seriam comercializadas para instalação de lojas.
Não se falou ainda em que tipo de empresas poderá se instalar. Especialistas dizem que o Park Way sozinho não demanda tanto estabelecimento comercial. O certo é que o debate recém começou. Novas rodadas devem ocorrer antes do carnaval. Ao lado da definição das Diretrizes Urbanísticas do Park Way, tem a da LUOS, que define se um determinado imóvel pode ter comércio, apenas residência ou de uso misto. Os embates entre moradores, GDF e empresários prometem esquentar neste ano que começa. No final, tudo vai parar na Câmara Legislativa.
A história se repete: Agnelo se viu obrigado a retirar da CLDF os projetos de LUOS e de PPCUB para evitar desgastes ainda maiores nas eleições de 2014. Rollemberg fará o mesmo?Feliz 2017.