Em março de 2020, quando as aulas presenciais estavam suspensas devido à pandemia, o Centro de Ensino Fundamental (CEF 01) da Candangolândia mudou de endereço. Saiu da antiga sede num dos bairros históricos de Brasília e instalou-se num luxuoso prédio à margem da Estrada Parque Indústria e Abastecimento (EPIA). A escola também abarca da Direção Regional de Ensino (DRE).
Ou seja, a Secretaria de Educação trocou uma área pública, onde não tinha despesa, para passar a pagar, anualmente, mais de R$ 3,5 milhões pela locação de um imóvel particular a menos de 3 quilômetros de distância.
“O contrato de aluguel foi fixado inicialmente em R$ 329 mil mensais. Porém, avaliação da Terracap reduziu esse valor para R$ 297 mil, que é o preço praticado atualmente”, confirma, em nota ao Brasília Capital, a Secretaria de Educação.
Assim, o que era para ser a solução de um problema para estudantes que sofriam com as instalações de uma escola pública precária na Candangolândia, se transformou num problema de ordem policial para o Governo do Distrito Federal.
TCDF investiga
No dia 26 de maio, o Plenário do Tribunal de Contas do DF determinou prazo de 15 dias para que a Secretaria de Educação se pronunciasse sobre os questionamentos feitos numa Representação do Ministério Público junto ao TCDF. A Corte também concedeu à empresa Saída Sul Hospedagem Ltda., dona do imóvel, os mesmos 15 dias.
Após um pedido de prorrogação de prazo – concedido pelo TCDF – a Secretaria de Educação enviou as informações no dia 1º de julho. As alegações da empresa foram juntadas ao processo no dia 17 de agosto. Ambas estão sob análise do corpo técnico do Tribunal.
Grafite na fachada, luxo no interior
Espremido entre um posto de gasolina e as concessionárias de carros, o suntuoso prédio do CEF 1 da Candangolândia é de arrancar o famoso assobio de quem se depara com as instalações. Por trás da fachada coberta por grafites, existe uma estrutura de dar inveja a muitas faculdades particulares.
As salas estão equipadas com modernos aparelhos, têm ar-condicionado, cadeiras acolchoadas e piso novinho. Nada comparado com os velhos quadros negros e o chão de fábrica de uma escola pública comum.
O terraço tem um refeitório digno de bons restaurantes, uma quadra poliesportiva, área de convivência e uma vista para o Aeroporto JK de impressionar. O estacionamento no subsolo abriga do sol e da chuva os carros dos professores, diretores e visitantes. O acesso a ele é pelo elevador.
Mãe desconfia de politicagem
Jaqueline Silva de Carvalho, 37 anos, tem um filho que estuda na escola e não poupa elogios. Mas fica pensativa quando perguntada se não seria mais viável usar o dinheiro do aluguel para reformar a antiga escola onde seu filho estudou. “Eles alugaram essa aqui para reformar aquela, mas já faz quase dois anos e ainda não reformaram”, lembra. “Isso aqui é resultado de muita politicagem”, emenda.
“Eu estudei aqui há muitos anos. Lamento que ela esteja abandonada, mesmo que o seu estado não seja dos piores. Não entendo porque fizeram isso. Estava funcionando e o espaço aqui é bem grande. Mas realmente precisa de uma reforma”, desabafou a ex-aluna Nathália Santas, de 25 anos.
Escola será demolida
É uma pena que a qualidade das instalações do CEF 1 da Candangolândia não seja extensiva a outras escolas do DF e do País. O prédio que já foi uma concessionária de automóvel e agora adaptado para receber alunos da rede pública de ensino é uma exceção.
Na nota ao Brasília Capital, a Secretaria de Educação informa que o prédio do antigo CEF 1 “será demolido e há previsão de construção de um novo para abrigar a escola”. Mas não determina o prazo.
Hermeto mandou emenda
Enquanto isso, o líder do governo na Câmara Legislativa, Hérmeto (MDB), aprovou uma emenda de R$ 50 mil para a compra da nova mobília da escola. Eleito com votos de moradores da Candangolândia, ele se manifestou na inauguração do prédio do CEF 01:
“Tenho orgulho em dizer que destinei emendas parlamentares para reformar todas as escolas da Candangolândia. Dentre elas, o CEF 1 foi a que mais se destacou. Está fantástica. Uma referência para qualquer escola pública do Brasil”, disse o deputado distrital.
Reginaldo Veras vê inoperância
Os deputados distritais Chico Vigilante (PT) e Reginaldo Veras (PDT) também canalizam para as escolas públicas grande parte das verbas de suas emendas parlamentares. A maioria pelo Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (PDAF).
“São pequenos recursos, geridos pelos próprios diretores, que melhoram muito a qualidade das escolas da rede pública”, explica Veras. “Em geral, essas reformas de salas, de quadras esportivas, de cantinas e pátios ficam entre R$ 50 mil e R$ 150 mil. A mais cara que já encaminhei ficou em R$ 600 mil”, disse Chico Vigilante.
Os dois deputados se assustaram com a informação de que a Secretaria de Educação paga R$ 300 mil por mês pelas novas instalações e, em dois anos, sequer iniciou a demolição da escola que precisa ser recuperada. “Isto evidencia uma inoperância do governo”, atesta Veras.