Há 200 anos, o poeta e romancista escocês Walter Scott já alertava: “Construímos estátuas de neve e depois choramos ao ver que derretem”. Nesses 18 e 19 de novembro está sendo realizada no Rio de Janeiro a 19ª reunião de Cúpula do G-20, e a pauta sugerida pelo país anfitrião compreende 3 temas principais: combate às mudanças climáticas; combate à fome, pobreza e desigualdade e nova governança global.
Aos otimistas de sempre, faço a pergunta: nas 18 outras reuniões de cúpula do G20, desde 2008, houve algum avanço significativo nessa e noutras pautas? Certamente não, ao contrário: de lá para cá, os eventos climáticos cataclísmicos só aumentaram; a renda e a riqueza no topo da pirâmide se concentraram cada vez mais e todas as sugestões de “democratização” da governança global foram solenemente ignoradas pelas potências dominantes.
Não se trata de pessimismo, mas de avaliar a situação de forma realista. Outro escritor, o francês Georges Bernanos, nacionalista católico, se equivocou em muitas coisas, mas penso que acertou ao dizer que “as mais perigosas de nossas avaliações são aquelas que chamamos de ilusões”.
O G20 se trata de uma organização que, além da União Europeia (UE) e da União Africana (UA), reúne, supostamente, as 19 maiores economias do mundo. Digo supostamente porque há membros do G20, como Argentina e África do Sul, que possuem economias menores que outros não integrantes, como Espanha, Irã, Paquistão, Nigéria, Egito e Tailândia.
De todo modo, estão no G-20 o bloco dos chamados países ricos, que se organizam no G-7 (EUA, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Itália e Canadá) + 2 (Austrália e Coreia do Sul) + União Europeia, e o bloco dos chamados países emergentes (em desenvolvimento ou subdesenvolvidos), que se organizam no BRICS (China, Índia, Rússia, Brasil e África do Sul) + BRICS ampliado (Arábia Saudita, Turquia e Indonésia) + 2 (México e Argentina) + União Africana. Dois mundos distintos e interesses diversos, mas propósitos comuns unindo a turma do “andar de cima” de cada um desses países.
E em que contexto o G20 se reúne? Num momento em que o planeta vive uma espécie de prorrogação da chamada fase senil do sistema capitalista. Nada mais tendo a oferecer à humanidade (já o teve), o capitalismo, para se perpetuar, lança mão de todos os recursos.
A inexorável tendência de queda da taxa de lucro, que sempre ameaçou a acumulação do capital, tem sido driblada pelo avanço da economia fictícia, expressa numa extrema financeirização; e na economia real, pela violenta precarização das relações de trabalho.
Dessa forma, a concentração da renda e da riqueza passa a ser uma condição sine qua non para a sobrevivência do sistema. A proposta de taxar os super ricos em 2% para acabar com a pobreza tende a ser mais uma conversinha para fazer boi dormir.
E o que dizer do combate às mudanças climáticas, quando a principal potência mundial aprofunda a exploração de combustíveis fósseis (petróleo e gás), notadamente o xisto betuminoso através do fraturamento das rochas, processo ultra degradante do meio ambiente?
E até o carvão mineral vem ressuscitando, estimulado pela gigantesca demanda chinesa, sendo a “simpática” Austrália sua maior fornecedora, com nada menos que 400 milhões de toneladas anuais. Até mesmo o Brasil vai nessa onda e dificilmente deixará de iniciar a exploração do petróleo na Foz do Amazonas, pois, afinal, também seguimos o que é ditado pela lógica da acumulação capitalista.
E para que os dois preceitos se mantenham, há que vigorar no planeta uma governança que os garantam. Por isso a governança global, comandada pelas potências capitalistas, visa a defesa das grandes corporações financeiras, industriais e das big techs.
Potência alguma abrirá mão de privilégios por vontade própria, ou seja, não haverá ampliação no número de membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e tampouco o fim do direito de veto.
Lula está praticamente sozinho nessa batalha perdida. Talvez tenha apenas a mexicana Cláudia Sheinbaum como parceira sincera. Da cúpula sairá um documento supimpa, os social-democratas Scholz e Starmer hipocritamente o saudarão, o “pato manco” Biden, Xi Jinping, Modi, Macron e os demais farão cara de paisagem e concordarão, apenas para torná-lo letra morta mais adiante.
Podemos e devemos sonhar com um mundo mais justo, livre da opressão e da exploração, só não podemos ter a ilusão de que isso virá de acordos com os inimigos de classe. O sonho nos move, mas a ilusão nos paralisa!