Chico Sant’Anna (*)
Os mais velhos hão de se lembrar de um aparelho de som chamado 3 em 1: toca-disco, gravador cassete e rádio. Agora, Brasília também poderá ter seu 3 em 1 na mobilidade urbana. Aguardando há décadas por um trem de passageiros Luziânia-Plano Piloto, a cidade poderá contar com três sistemas de transporte: VLT, metrô de alta velocidade e metrô de superfície atuando em consonância entre si. O projeto está pronto e aguarda sinal verde do Ministério dos Transportes.
Ao mesclar os diferentes modais espera ser uma boa alternativa de deslocamento para cerca de 200 mil pessoas que vão e voltam todos os dias ao centro de Brasília – volume aferido recentemente nas imediações do Solarius, monumento apelidado de ‘chifrudo’, na BR-040. Uma moderna técnica contabilizou os sinais de celular passavam na ida e na volta pelo local. O quantitativo agrega quem transita de ônibus e em carros particulares – no início do ano, o DER-DF estimou em cem mil o número de carros provenientes do Entorno Sul.
PROJETOS – Como noticiamos em setembro de 2024, três diferentes projetos ferroviários com o Entorno Sul estavam nas pranchetas. A Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) previa o uso de veículos leves sobre trilho (VLT) trafegando sobre a antiga ferrovia da RFFSA.
A segunda proposta, do Ministério dos Transportes, previa a instalação de trem regional de passageiros do Jardim Ingá, distrito de Luziânia, à antiga rodoferroviária, também pela estrada de ferro. 
Projeto do Ministério dos Transportes prevê oito estações entre o Jardim Ingá e a Rodoferroviária. – Foto: Reprodução
A terceira proposta descartava a ferrovia. O Expresso Planalto Central, de autoria de um grupo econômico, prevê um metrô de alta velocidade capaz de interligar os 64 quilômetros de Luziânia ao Noroeste em 29 minutos. Baseado no Réseau Express Métropolitain, no Canadá, a nova linha férrea eletrificada seguiria o mesmo eixo da BR-040 conectada à Via Epia.
AUDIÊNCIAS PÚBLICAS
O projeto da CBTU, que chegou a receber R$ 23 milhões de emendas de parlamentares de Goiás, não avançou. O convênio já assinado pelo governo de Goiás descarrilou no Palácio do Buriti, para onde a minuta assinada pelos goianos foi encaminhada em março de 2024, mas até hoje não foi assinada. Procurado, O GDF informa ainda estar fazendo o estudo de viabilidadde técnica do convênio.
Mas o projeto do Ministério dos Transportes andou. O estudo técnico, contratado no ano passado, está praticamente concluído e deve ser apresentado pelo governo federal nas primeiras semanas de agosto, quando audiências públicas devem acontecer nas cidades do Entorno.
O projeto se vale da antiga linha ferroviária e prevê oito estações entre o Jardim Ingá e a Rodoferroviária, com capacidade de transportar – dependendo do projeto técnico a ser aprovado – de 2 mil a 4 mil passageiros nos horários de pico (até 800 passageiros por viagem).
A proposta está focada mais no transporte ponto a ponto. Em Goiás, além da estação inicial, no Ingá, estão previstas apenas duas outras: Cidade Ocidental e Valparaíso.
No DF, as principais estações seriam localizadas na intercessão com as grandes vias troncais: Estrutural, EPTG, EPNB e Epia-Sul – onde seria possível a integração com as redes de ônibus urbanos -, além de outra com o metrô, no Guará. Áreas internas no Park Way, Núcleo Bandeirante e SIA – por onde a linha férrea já trafega – não contariam com estações. A viagem durariatt de 50 a 60 minutos.
3 em 1 – A nova proposta do Expresso Planalto Central (EPC) engloba parte das ideias da CBTU e do Ministério dos Transportes. Além do metrô de alta velocidade pelo eixo rodoviário BR-40/Epia, duas linhas alimentadoras seriam criadas sobre a antiga ferrovia.
A primeira, o VLT Jardim Ingá-Valparaíso (Viva), com 20 Km de extensão e 19 estações, integraria as localidades da região ao EPC. Já a linha Monumental Park Way (LMP), totalmente no DF, usaria a antiga ferrovia desde a quadra 29 do Park Way até a Rodoferroviária.
Funcionaria como um metrô de superfície, com 16 estações ao longo de 26 Km. Seriam atendidos a Metropolitana, Núcleo Bandeirantes, Arniqueiras, Guará, Ceasa, Cidade do Automóvel, Estrutural. A integração com o BRT-Sul e o EPC seria na Epia, na altura da Vila Cauhy, e com o metrô, na estação do Guará 2.
Estação Aeroporto
O projeto do EPC ainda propõe chegar ao Aeroporto: “Descer do trem dentro do aeroporto”, explica um técnico que trabalhou no projeto. De lá, o trem mergulharia até a Rodoviária Interestadual, passando sob o Jardim Zoológico. O trajeto retoma a Epia rumo Noroeste, próximo à Água Mineral, com uma parada na Rodoferroviária.
O trajeto é 13 quilômetros mais curto do que o itinerário da linha férrea, e com a capacidade de alcançar 160 Km/h. Cobriria o trecho Luziânia-Noroeste em 29 minutos. O veículo é automatizado, não requer maquinista, e pode ser implantado no canteiro central das rodovias ou na lateral. Um deslocamento entre o Noroeste e o Aeroporto JK não tomaria mais do que 10 minutos.
Quanto ao valor da passagem, o consórcio entende que não poderá ficar muito diferente do que atualmente é cobrado pelos ônibus (R$ 12,05 de Luziânia ao Plano Piloto), tendo em vista a necessidade de se atrair os passageiros.
RENTABILIZAÇÃO – A proposta do consórcio baseia-se na assunção da implantação do EPC pela iniciativa privada, sem custos para o Estado. A União arcaria com a adaptação da linha férrea para receber o Viva e o LMP. O custo do EPC está estimado em R$ 5 bilhões.
Os empreendedores pensam rentabilizar seus investimentos explorando imobiliariamente áreas ao longo do trajeto. Já identificaram um grande espaço em Valparaíso de Goiás, mas almejam áreas inexploradas no DF, como a Área Alfa, da Marinha, o antigo bairro do Catetinho, e o terreno atrás da rodoferroviária, locais que certamente enfrentarão resistências sociais e oficiais.
A Marinha não cogita lotear seu espaço de treinamento, onde estão localizadas instalações de telecomunicações. O bairro do Catetinho, que o ex-governador Joaquim Roriz propôs transformar na Cidade da Saúde – um polo hospitalar –, é área de recarga hídrica e possui em seu interior o Parque Ecológico Luiz Cruls. Já o Pátio Ferroviário é visado pela Terracap para exploração econômica.
Além disso, estações como a do Noroeste seriam acopladas a “Polos de Desenvolvimento”, uma espécie de shoppings com instalações para escritórios, consultórios, academias e outros estabelecimentos.
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(*) Especial para o Brasília Capital
