A virada do ano representa, para bilhões de pessoas, a esperança de um ano melhor. Mas, infelizmente, 2021 não traz boas novas. O número de infectados no planeta dobrou de 2 milhões/semana em setembro/outubro para 4 milhões desde o início de dezembro. E o número de mortos saltou de 50 mil para 90 mil/semana no mesmo intervalo. Dessa forma, chegamos a 100 milhões de contaminados e 2 milhões de mortos.
A chegada do rigoroso inverno tornou a situação mais dramática nos EUA e na Europa. No Brasil, o quadro também se agravou. Havíamos reduzido o número de mortes de 7 mil/semana em julho para 3,5 mil em setembro/novembro, mas, em consequência do absurdo relaxamento, nas últimas duas semanas voltamos aos 7 mil mortos semanais. Já são 8,2 milhões de infectados e mais de 200 mil mortos.
Se os cientistas conseguiram criar a vacina em tempo recorde e hoje mais de 50 países já iniciaram a imunização dos grupos mais vulneráveis, no Brasil, Bolsonaro faz de tudo para adiá-la. Trata-se de um verdadeiro assassinato em massa, pois cada semana de atraso representa cerca de 7 mil pessoas perdendo a vida, 30 mil num único mês. Haveria razão maior para um impeachment?
O prolongamento da contaminação representa também o agravamento da crise econômica e do desemprego. Mas Bolsonaro parece não se importar com isso. Nesta semana, a Ford decidiu encerrar a produção de carros no Brasil (iniciada em 1957), fechar suas fábricas nem São Paulo e na Bahia e demitir 4.000 empregados. A produção de veículos no Brasil, que de 2010 a 2014 girava entre 3,5 e 3,8 milhões/ano, caiu para 1,9 milhão em 2020, resultando na demissão de dezenas de milhares de trabalhadores em toda a cadeia automotiva.
Enquanto fecha indústrias, reduz investimentos e corta verbas em C,T&I, Bolsonaro e sua base BBB (do boi, da bíblia e da bala) comemoram a liderança do Brasil nas exportações de soja, milho, carne bovina e de frango. Para nós, economistas, trata-se de um retrocesso de quase um século, ao debate travado nos anos quarenta entre Roberto Simonsen, que defendia a industrialização do país, e Otávio Bulhões, que preconizava uma economia baseada na produção agrária.
Só que a produção dos ruralistas é para exportação, não de produtos que o brasileiro mais consome. Por isso, a inflação dos alimentos fechou 2020 em 18%, sendo que os itens que compõem a cesta básica tiveram os seguintes aumentos: arroz, 76%; feijão, 45%; batata, 67%; tomate, 52%; banana, 40% e óleo de soja, 103%.
Na contramão do aumento da pobreza, mas coerente com o sistema capitalista selvagem, a fortuna dos cinco homens mais ricos do mundo cresceu 45% em 2020, de US$ 490 bilhões para US$ 710 bi. Para culminar, Trump, o “ídolo” de Bolsonaro, promove um tipo de insurreição mambembe em Washington, insuflando a turba de racistas, misóginos, homofóbicos e desmiolados a tentar impedir a posse de Joe Binden, o candidato que o derrotou nas urnas.
Pelo visto, 2021 vai ser bem doloroso!
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável (UnB) e ex-presidente da Codeplane do Conselho Federal de Economia