Analise comigo duas construções:
- Os brasileiros que entendem o que leem têm acesso a um novo mundo.
- Os brasileiros, que entendem o que leem, têm acesso a um novo mundo.
Os trechos que estão em negrito caracterizam, nos dois períodos, o substantivo “brasileiros”. São classificados como orações subordinadas adjetivas. Quando não possuem vírgulas, são restritivas (como em 1); quando possuem, explicativas (como em 2). Você sabia, todavia, que, por conta dessas vírgulas, o sentido entre elas é bastante diferente?
Restringir significa limitar, separar, dividir. Uma dieta com restrição ao glúten, por exemplo, informa ao paciente que, de todos os alimentos do mundo, só não podem ser consumidos os que possuem essa substância. Uma oração restritiva faz o mesmo papel! No período 1, entende-se que, dos brasileiros, há uma parte que entende o que lê, mas há uma que não é dotada dessa característica.
Explicar, por sua vez, significa esclarecer, informar o que é. Explicar a uma pessoa o que é um computador, por exemplo, é informar características que o definem. Uma oração explicativa funciona de maneira semelhante! Em 2, compreende-se que a característica de todos os brasileiros é esta: o povo que entende aquilo que lê! Segundo o período dois, se alguém pergunta “explica-me quem são os brasileiros?”, a resposta seria “são aqueles que entendem o que leem”! Percebeu a diferença?
Infelizmente, no nosso país, o período 1 (e não o 2) descreve nossa realidade. Os indicadores governamentais apontam que aproximadamente 8% da população brasileira é analfabeta. No entanto, a quantidade de analfabetos funcionais – pessoas alfabetizadas, mas que não compreendem o que leem – é assustadora.
E há ainda um agravante: existem pessoas analfabetas funcionais que chegam a concluir o ensino superior, desmistificando os que dizem que essa situação só ocorre entre os não escolarizados. Alguns pesquisadores mais pessimistas chegam a indicar que apenas 10% dos brasileiros possuem a compreensão plena das informações que leem; e sabemos que isso impõe uma restrição ao cidadão.
Como professor de língua portuguesa, fico triste com nossa situação; sou, porém, muito esperançoso! Acredito que, algum dia, nossa sociedade e nossos governantes darão o devido valor à leitura e à educação. Eu trabalho para isso! Espero que, no futuro, a nossa realidade tenda mais para a construção explicativa, e não para a restritiva!}