Daniel de Castro, 53 anos, foi assessor dos ministros dos Esportes (Agnelo Queiroz) e da Educação (Cristovam Buarque) e chefe de gabinete do então deputado federal e hoje senador Zequinha Marinho (PA). Como suplente, assumiu por 28 dias uma cadeira na Câmara Legislativa. Administrou Taguatinga e foi secretário Educação de Águas Lindas (GO) na gestão do interventor Cezar Gomes e de Administração na gestão do prefeito José Pereira.
Desde janeiro de 2019 administra Vicente Pires, por indicação da deputada Celina Leão (PP), atual secretária de Esportes. A cidade de 130 mil habitantes tem o maior canteiro de obras do DF, mas também é a Região Administrativa em que se concentra o mais grave problema de conflito de terras no momento, nos assentamentos 26 de Setembro e Cana do Reino.
Nesta entrevista ao Brasília Capital, o pastor da Assembleia de Deus Ministério Madureira, em Taguatinga, revela que tem recebido ameaças de morte, mas encara o desafio como uma missão. “Só fiz o bem. Só cuidei das pessoas, dentro do limite das minhas forças, em um local em que não se pode fazer muita coisa”. Registrou ocorrências na 38ª DP e espera que essas pessoas sejam presas. “Tem que acabar essa farra de invasão de área pública e parcelamentos irregulares em Brasília”.
Os assentamentos Cana do Reino e 26 de Setembro, que estão na Região Administrativa de Vicente Pires, são, atualmente, as duas área mais conturbadas em termos de ocupação no DF. O que o governo tem feito para controlar a situação? – Na 26 de Setembro, realmente, estamos tendo alguns problemas, como o parcelamento irregular do solo, que é crime. É o cara pegar uma chácara, que, às vezes, ele até tem a posse, e dividir em lotes. Não é invasão. O 26 de Setembro nasceu como assentamento feito pelo Poder Público, em 1998, na gestão de Cristovam Buarque. O crime é o parcelamento irregular do solo.
Mas existe uma orientação para que as pessoas ocupem as casas… – Sim. Mas quem está orientando são os grileiros.
E o que tem sido feito para coibir esse comércio ilegal? – Primeiro, devo esclarecer que desde quando assumi a Administração, o governador me deu a missão de resolver os problemas dos 30 mil moradores da 26 de Setembro. São quase 10 mil residências. Meu compromisso é cuidar da cidade e das pessoas. Crianças não iam para a escola, as ruas eram muito estreitas…
Então o governo investiu recursos públicos numa área irregular? – Não é investir. Só alargamos algumas ruas. Isso não é investir. É cuidado. É diferente.
Mas isso custa dinheiro… – Mas tem que gastar dinheiro público de qualquer forma, né? Todas as cidades surgiram assim. A política não existe pela política. Ela existe pelo povo. Onde tem gente, você tem que cuidar de gente.
Então é a política do fato consumado, como aconteceu na Estrutural e na própria Vicente Pires. E agora a história se repete na 26 de Setembro. – Se estivéssemos discutindo um planejamento para construir uma cidade, eu iria trabalhar de forma diferente. Estamos falando de 30 mil pessoas. Vamos deixar essa gente abandonada? As pessoas são a razão de tudo existir – o Estado, a Justiça, a polícia. As pessoas estão lá.
Tem as pessoas. Mas, e os invasores e os gileiros que estão ganhando dinheiro? – Essa onda de grilagem de terra e de invasão é antiga. Já é conhecido da Fiscalização o chamado “kit invasão”. A pessoa constrói do dia para a noite. Mas o Estado não deixa de fazer o seu papel, que é olhar. Quero ressaltar que 99% dos moradores da 26 de Setembro são pessoas do bem, pais de família, gente trabalhadora. O que atrapalha são os poucos que vivem a custa das pessoas mais humildes – o grileiro e o parcelador irregular. É esse povo que atrapalha.
Existe ainda o crime ambiental, de construir dentro da Floresta Nacional – Lá não era Flona, era um assentamento criado pelo ex-governador Cristovam. Depois, veio outro, talvez por guerra política, e estendeu a Flona para cima de lá. Naquele lugar, primeiro veio o assentamento, depois a floresta. Isso é uma questão que o governador Ibaneis vai resolver com o presidente Bolsonaro, ofertando uma área de compensação ambiental para compor a Flona.
Onde? – Eu não sei onde fica. Acho que é lá perto mesmo, mas ele já ofertou. Até mesmo, já falou com a SPU (Secretaria de Patrimônio da União). Vai ter a compensação para liberar aquele pedaço para regularização. Para que isso ocorra, eu estou, desde janeiro de 2019, presente na 26 de Setembro, gravando videos e dizendo: “não construa; parcelador irregular de solo, aqui não é o seu lugar; grileiro, fuja de Vicente Pires”.
Enquanto isso, eles continuam construindo… – Não. Se construírem, vai tudo pro chão. Eles já estão na mira da polícia e do DF Legal. Não posso acusar ninguém de invasão de área pública. Como vou saber se a área é pública ou não? Eu submeto à Terracap e ela fala que é dela. Ai vem alguém que fala: “não, é minha”. E tem documento. Então, a discussão é com a Terracap ou com a Justiça, e não com a Administração.
O senhor tem sido vítima de ameaças e até já registrou ocorrência na 38ª DP… – O BO não fiz pessoalmente. Fui à delegacia com meus assessores que ficam o tempo todo na 26 de Setembro, fiscalizando e cuidando. Um deles estava andando lá e um cara o parou e fez sinal de arma e de tiro com o dedo. Meu assessor parou para conversar e ele disse: “Eu sei onde o administrador mora”. E deu meu endereço completo. Na hora, fomos à delegacia e fizemos a ocorrência. Saímos com sete agentes e um delegado, mas não identificamos o sujeito. E tantas outras ameaças veladas que chegam. Quase todos os dias entra uma pessoa na administração com medo, contando que estava numa reunião e as pessoas falando que quem está prejudicando é o administrador.
Mesmo assim o senhor continua no cargo? – Só fiz o bem. Só cuidei das pessoas, dentro do limite das minhas forças, em uma área na qual não se pode fazer muita coisa porque é uma área pública nacional, não legalizada ainda. Não podemos estar presentes com os equipamentos. Lá tem gambiarra da CEB, da Caesb. A CEB não pode entrar lá porque tem uma ordem do Ministério Público, porque ainda não está regularizada. Em compensação, nas ruas 4, 5 e 6 as pessoas usam energia clandestina. Quem perde? A CEB, que deixa de arrecadar. Eu sou favorável à regularização para o Estado estar presente e arrecadar com energia, com água, com IPTU. A solução é regularizar. O governador está certo.
Mediante venda direta ou licitação? – Primeiro, temos de esperar o Presidente tirar a Flona de lá. Enquanto for floresta nacional, existe o problema da presevação ambiental. Depois, a União passar a terra para o GDF e o GDF vender, por meio da Terracap ou da Codhab. Pela Codhab, como são pessoas mais humildes, vende-se pelo ARIS (Área de Relevante Interesse Social), mais barato. Pela Terracap é mais comercial.
Vicente Pires, possivelmente, tem o maior pacote de obras do atual governo. Fale sobre isso. – O pacote de obras de Vicente Pires ultrapassa os R$ 500 milhões de investimentos do governo federal e mais os R$ 180 milhões que o governador destinou, em 2019, como contrapartida da Terracap, que estava vendendo lotes aqui. Nós herdamos uma coisa boa, que era o dinheiro para investir na cidade, e outra ruim, porque recebemos uma cidade toda aberta. Eram 11 ruas e 11 frentes de trabalho. Reclamação de todo lado. Desastre na mídia. Carro engolido por cratera, alagamento, atolamentos, animal morto eletrocutado. Um pandemônio.Quase fiquei maluco. Uma pressão violenta.
Isso já passou? – Um dia, o José Humberto Pires, secretário de Governo, veio aqui, fez uma caminhada na cidade e montamos um gabinete de crise. Mapeamos a cidade e resolvemos fazer um paliativo na Rua 10, que era intrafegável. Em 30 dias demos uma humanizada na Rua 10. O gabinete de crise foi transformado em gestão integrada. Ficou uns 6 meses. Nesse tempo o governador estipulou que o pacote de obras deverá ser fechado até dezembro deste ano. Estamos caminhando para isso.
Em outras épocas, esse tipo de obra em Vicente Pires não resistiu à primeira chuva. Isso pode acontecer? – De forma alguma. Estamos fazendo toda a drenagem de águas pluviais. O grande erro, no passado, foi o açodamento. O governador Ibaneis ficará marcado como o cara que resolveu os problemas do Vicente Pires porque a obra começou de forma correta. A técnica da engenharia diz que, quando se faz a drenagem, faz-se de baixo para cima; e a pavimentação, de cima para baixo. Antes, começaram a drenagem de cima para baixo para depois fazer a pavimentação de baixo para cima. Só que não deu tempo de terminar. Veio a chuva e destruiu a cidade. A gente entrou e está tudo pronto, debaixo para cima. Finalizamos essa parte de drenagem. A Rua 3 está toda drenada, pronta. Gabião totalmente, pronto e estamos fazendo um outro dissipador para receber as águas do encanamento da Rua 4. Tudo será despejado no córrego de Vicente Pires.
Esse córrego não está assoreado? – Não. Ele não tem recebido o impacto das águas, e parou. A Terracap tem um instrumento chamado PRADE (Programa de Recuperação de Área Degradada) e vai recuperar tudo, Até mesmo com plantio de novas árvores. Faz parte do pacote de obras. O cronograma tem a mão do governador. No ano passado, executamos 70% e, este ano, estamos chegando a 90%. Não conseguiremos completar os 100% porque tivemos um problema com uma licitação de R$ 46 milhões, mas o governo já está finalizando os ajustes técnicos. Essa licitação é para a pavimentação das Ruas 8 e 5 (nessas, faltam calçadas e meios-fios); a Rua 3 da Colônia Agrícola Samambaia, e o túnel que vai atravessar na Rua 10 B, por baixo da Via Estrutural, para a água da Rua 12 chegar para as duas bacias do lado da Estrutural, que já estão finalizadas. A água pluvial não vai impactar tanto o trânsito porque o projeto foi remodelado e vai ser subterrâneo.