Júlio Miragaya
O lançamento da pré-candidatura de Flávio Bolsonaro surpreendeu meio mundo, chocou o Centrão, fez o dólar disparar e a Bolsa despencar. Enquanto Lula desponta como o candidato único do campo progressista, a direita está rachada entre uma candidatura com o sobrenome Bolsonaro ou um dos governadores conservadores. A candidatura de Flávio “Rachadinha” é pra valer ou é apenas um balão de ensaio?
De acordo com a mais recente pesquisa Datafolha, em disputa com o senador do PL-RJ, Lula venceria no 1º turno. Num hipotético 2º turno, considerando apenas os votos válidos, venceria por 58% a 42%. Contra Tarcísio ou Ratinho Júnior, Lula também venceria num 2º turno, mas por margem bem mais apertada (53% a 47%). Caso o candidato da direita seja Caiado, Zema ou Leite, Lula também venceria no 1º turno.
Após um período de desgastes pontuais (crises do Pix e do INSS), Lula deu a volta por cima, ancorado em relevantes resultados no plano econômico (queda da inflação e do desemprego, melhora na renda da população e isenção de Imposto de Renda para os com rendimento de até R$ 7.300) e social (redução da fome e pobreza e retomada de vários programas sociais). Ademais, ganhou pontos com sua reação firme ao tarifaço aplicado por Trump. Mas ainda há 10 meses pela frente até outubro de 2026, e, além das distintas frações da burguesia, o presidente tem no Banco Central um adversário implacável, mantendo a taxa Selic em 15% e fazendo o crescimento do PIB despencar de 4% para 2%.
Mas é no Parlamento que será travada a batalha mais decisiva, pois, nos últimos anos, o fortalecimento do Centrão foi tal que não apenas aprovou pautas do interesse de seus financiadores (burguesias financeira, agrária e industrial), como vetou iniciativas importantes do Executivo e se apropriou de uma enorme parcela do orçamento federal via emendas parlamentares.
Embora a dança das cadeiras deva se estender até abril do próximo ano, o que se observa hoje é um Congresso Nacional totalmente dominado pelo Centrão, muito embora este careça de maior uniformidade. O bloco parlamentar na Câmara dos Deputados que agrupa 8 partidos (UB, PP, PSD, Republicanos, MDB, Podemos, PSDB e Cidadania) congrega 276 deputados.
Somado aos 18 do bloquinho (Avante, PRD e Solidariedade), são nada menos que 294 deputados (57,3% do total) ou 37 parlamentares acima dos 257 necessários para aprovar qualquer projeto que não exija quórum qualificado e muito próximo do quórum de 3/5 (308) para aprovação de PEC. Como já dito, não é um bloco uniforme, com diversos parlamentares de centro e até de centro-esquerda, especialmente no MDB e no PSD. À direita do Centrão estão os 92 deputados da extrema-direita (PL e Novo) e à esquerda os 127 deputados (24,8%) dos partidos de esquerda e centro- esquerda (PT, PSol, PCdoB, PDT, PSB, PV e Rede).
No Senado o quadro não é muito diferente. Enquanto a extrema direita tem 16 parlamentares e a esquerda e centro-esquerda outros 16 (20%), o bloco do Centrão compreende nada menos que 49 senadores (60% do total),
número suficiente para aprovação de PEC. O aspecto positivo é que metade deles (25) está no PSD e MDB, com muitos se alinhando com a bancada de esquerda.
Se não há homogeneidade ideológica no Centrão, sobra a fisiológica. A apropriação do orçamento federal via emendas parlamentares de toda ordem carrega para o Congresso cerca de R$ 60 bilhões anuais, que são destinados pelos deputados e senadores sem obedecer a qualquer critério, para não se falar das emendas associadas ao recebimento de propinas.
É provável que os partidos de esquerda e centro-esquerda aumentem suas bancadas em 2026, mas não deve superar 30% na Câmara (de 150 a 160 deputados) e menos ainda no Senado (máximo de 20 senadores em 2026). Infelizmente o poderio econômico continua a prevalecer nas eleições para o Congresso Nacional, assim como, embora numa escala menor, para os cargos executivos.
Isso significa um quadro bastante adverso para um possível 4º mandato de Lula, que se verá obrigado a governar o país limitado por um Congresso hostil e o poder real exercido pelas distintas facções da burguesia, limitando-se a avanços pontuais sem lograr avanço numa pauta que promova a necessária transformação social do País.