No embate com o mercado financeiro, quanto mais se cede, mais se encrenca. E aqueles que aceitam as mentiras impostas pelo Mercado me fazem lembrar o refrão “Dando mole pra Kojak, ô Mané, qual é?”, de Bezerra da Silva, muito popular nos anos 1980.
A primeira mentira é a da meta de inflação. O mercado financeiro quer uma taxa de juros real elevada e pressiona fortemente para que seja fixada uma meta excessivamente baixa. E quem fixa a taxa? O Conselho Monetário Nacional (CMN), que é composto pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC.
São dois votos do governo em três. Por que razão, na reunião do CMN de junho/2023, a equipe econômica decidiu manter a redução da meta de inflação de 3,25% para 3% em 2024, 2025 e 2026? Deu de bandeja terreno fértil para o mercado lavrar seu “terrorismo econômico”.
Foi o que constou do comunicado do Copom após a reunião 11/12: “As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus (realizada com banqueiros) elevaram-se de forma relevante e encontram-se em torno de 4,8% e 4,6%, respectivamente”. Relevante? Inflação de 4,8% significa pífio 0,3 pontos percentuais acima do teto. Isso é realmente relevante? Para o mercado financeiro e para o BC, sim.
A segunda mentirinha é o tal hiato entre PIB real e PIB potencial. Manipulando grosseiramente o conceito de “PIB potencial”, o Mercado decidiu que o País não pode crescer acima de 4% ao ano, tese “comprada” pelos tecnocratas do BC, conforme seu Comunicado de 11/12:
“O conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo, com destaque para o PIB do terceiro trimestre, que indicou abertura adicional do hiato. Um dinamismo acima do esperado na atividade econômica, o que exige uma política monetária ainda mais contracionista”, qual seja, aumento da taxa básica de juros para reduzir o crescimento.
Os agentes do Mercado e os tecnocratas do BC conseguem transformar uma boa notícia – o crescimento de 4% do PIB no 3º trimestre – num “problema”. Para o mercado, o problema é que a economia está crescendo além dos seus limites, fomentando a inflação.
Para ele, o problema é que o País crescendo estará gerando mais empregos, e aí mais pessoas estarão tendo dinheiro para consumir, comprar comida, ir ao salão ou viajar. Palavras de um agente do mercado: “A taxa de desemprego caindo para 6,2% demonstra um aquecimento econômico que pressiona os preços dos serviços”.
E cinicamente o Comunicado do Copom de 11/12 diz: “Entre os riscos de alta da inflação está uma taxa de câmbio persistentemente mais apreciada”. Complementaria dizendo: com a preciosa ajuda do BC, que abdica em atuar para conter a desvalorização do Real vendendo dólar no mercado.
E a terceira mentira envolve o déficit primário e a relação dívida pública/PIB. Vejamos o que consta do comunicado do BC de 11/12: “A percepção dos agentes econômicos sobre o recente anúncio fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. O Copom, então, decidiu realizar um ajuste de maior magnitude, elevando a taxa básica de juros em 1 p. p.”.
Sim, com os votos de Campos Neto e também dos 4 diretores indicados pelo atual governo, aprovou um aumento da já elevada taxa de juros de 11,25% para 12,25% e sinalizando um aumento para 14,25% em março de 2025.
A percepção dos agentes do mercado sobre o anúncio fiscal é que o corte de R$ 70 bilhões é pouco. Não bastam as novas regras de correção do salário mínimo e para a concessão do BPC e do Abono Salarial, que sacrificam os mais pobres. Ele quer mais. Inclusive cortes em saúde e educação.
Diz que o déficit primário está fora de controle e faz disparar a dívida pública. Mentira! O que faz a dívida do setor público “explodir” não é o déficit primário, mas os gastos com juros da dívida pública, que devem chegar a R$ 900 bilhões em 2024, elevando o déficit nominal para mais de R$ 1 trilhão.
Não há ninguém na equipe econômica que possa denunciar tamanha mentira? Que diga que o aumento de 3 p.p. na Selic até março/2025 resultará em aumento de R$ 150 bilhões no gasto anual com juros da dívida, o que em 3 meses anulará “em dobro” o esforço fiscal do governo para os próximos 2 anos.
Disse, em artigo anterior, que a economia brasileira vai relativamente bem, que pelo quarto ano consecutivo crescerá acima de 3%; que não há colapso fiscal algum; que o déficit primário é administrável; que as contas externas estão equilibradas; que as reservas internacionais subiram para US$ 380 bilhões; que a inflação está sob controle e a taxa de desemprego está caindo.
Mas o mercado financeiro e o BC falam em riscos e incertezas, versão apregoada pela grande mídia, mas também aceita por muita “gente boa”. Para esses, o alerta de Bezerra da Silva:
“Vê se toma cuidado que a tua batata tá assando”.