A comissão especial que analisa o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Senado ouve nesta sexta-feira (29) o depoimento dos representantes da defesa. Deverão falar em nome de Dilma o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, e os ministros da Fazenda, Nelson Barbosa, e da Agricultura, Kátia Abreu.
Os depoimentos ocorrem um dia após a sessão de 9 horas que ouviu dois dos autores do pedido de impeachment, os juristas Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. O terceiro autor, o advogado Hélio Bicudo, que é um dos fundadores do PT, não compareceu, mas foi representado por sua filha, Maria Lúcia Bicudo.
A ida dos ministros da Agricultura e da Fazenda foi aprovada pela comissão no último dia 27, quando ficou definido o cronograma do colegiado, que também incluía a sessão desta quinta com os autores do pedido de impeachment, e sessões na segunda e na terça-feira da próxima semana com juristas e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União (veja cronograma ao final desta reportagem).
Os trabalhos da comissão especial começaram na terça-feira (26), com a eleição do relator, senador Antonio Anastasia(PSDB-MG), a quem caberá elaborar um parecer recomendando a instauração ou o arquivamento do processo para ser apresentado no dia 4 de maio e votado no dia 6. Para presidir o colegiado foi eleito o senador Raimundo Lira (PMDB-PB).
A expectativa é que o relatório de Anastasia seja submetido ao plenário principal do Senado no dia 11 de maio. Para ser aprovado, é necessário haver maioria simples dos senadores (41 de 81). Se for favorável à instauração do processo, Dilma será afastada da Presidência da República por 180 dias. Nessa hipótese, o vice-presidente, Michel Temer, assumirá o comando do Palácio do Planalto.
Autores de denúncia contra Dilma
A sessão da comissão especial para ouvir os juristas Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal nesta quinta-feira foi tumultuada, teve bate-boca entre os parlamentares e terminou só na madrugada de sexta.
Em seus depoimentos, os juristas reiteraram que o processo não é “golpe”, ao contrário do que acusa o governo. Disseram ainda que o pedido tem caráter técnico jurídico-político e que há provas de que Dilma cometeu crime de responsabilidade.
“Nunca vi crime com tanta impressão digital”, disse Miguel Reale Júnior ao comentar a edição de decretos liberando créditos extraordinários sem o aval do Congresso – um dos pontos que fundamentam o pedido de impeachment.
A sessão transcorreu na maior parte do tempo em clima tenso, com trocas de farpas e acusações entre senadores governistas e oposição. Logo no início, senadores da base aliada questionaram a isenção do relator da comissão, Antonio Anastasia (PSDB-MG), para conduzir o processo. Em reação, oposicionistas acusaram petistas de tentarem \”sabotar a comissão\”.
As discussões se arrastaram por mais de uma hora e meia sobre a votação de requerimentos antes que Reale Júnior pudesse começar a falar. Ao tratar do impeachment, o jurista sustentou que as “pedaladas fiscais”, de que o governo Dilma é acusado de praticar, tiveram como objetivo fazer com que a petista vencesse as eleições presidenciais em 2014.
As chamadas pedaladas, apontadas como um dos argumentos para o impeachment, são manobras de atraso de repasses do Tesouro Nacional a bancos públicos para pagar benefícios sociais com o objetivo de melhorar artificialmente a situação fiscal do país. As práticas, segundo os juristas, caracterizam crime de responsabilidade. Para Reale, o governo agiu de maneira irresponsável para maquiar as contas públicas e prejudicou a população.
A professora de direito Janaína Paschoal, que falou após Reale, disse que há “crime de sobra” para justificar o impeachment de Dilma e defendeu que os senadores levassem em conta na análise do processo as investigações da Operação Lava Jato, que apura desvios de dinheiro da Petrobras.
Nem \’pastora\’, nem \’mãe de santo\’
Com um discurso muitas vezes inflamado, a jurista se emocionou em alguns momentos e se exaltou em outros. Com os olhos marejados e a voz embargada, chamou a Constituição Federal de “livro sagrado” e disse que queria que “as criancinhas, os brasileirinhos” acreditassem “que vale a pena lutar por esse livro sagrado”.
Janaína também contou que se sensibilizou quando, certa vez, viu uma entrevista da presidente Dilma em que ela relatava ter tido vontade de ser bailarina. “Eu falei: ‘É uma mulher firme, de alma sensível’. Eu criei uma expectativa enorme. [Mas] A bailarina se perdeu. A bailarina se perdeu e não me deixou alternativa”, disse.
Próximas falas na comissão:
2 de maio (segunda-feira):
Júlio Marcelo de Oliveira, procurador de Contas junto ao Tribunal de Contas da União (TCU)
Carlos Velloso, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF)
José Maurício Conti, professor da USP
3 de maio (terça-feira):
Professor Geraldo Luiz Mascarenhas prado, professor da UFRJ
Ricardo Lodi Ribeiro, professor da UERJ
Marcello Lavenère, ex-presidente da OAB