Os humoristas Chico Anysio e Paulo Silvino imortalizaram dois personagens que tinham como mote principal a paixão por crachás. Bozó, interpretado por Chico, se orgulhava de exibir a credencial da TV Globo. Já o porteiro Severino, de Silvino, interceptava quem tentava entrar no espaço por ele controlado e, comparando a fotografia do documento com o rosto da pessoa, repetia o bordão “cara-crachá, cara-crachá”, baixando e levantando a cabeça.
Na Câmara Legislativa do DF, pelo menos 63 credenciados estão dispensados de aborrecimentos com identificação para ter acesso às dependências da Casa, inclusive à garagem privativa do prédio. Eles não precisam se submeter aos rigores dos “Severinos” da recepção da CLDF. Formam uma casta especial de assessores dos distritais. Entre esses credenciados, estão muitos parentes dos deputados, incluindo mães, cônjuges, filhos e irmãos.
Os nomes dos 63 assessores nomeados por 19 dos 24 deputados distritais foram encaminhados no dia 25 de julho aos Ministérios Públicos do Trabalho (MPT) e de Contas (MPC) pela presidência da Câmara Legislativa. A investigação foi iniciada após denúncia apresentada pelo Sindicato dos Servidores do Legislativo e do Tribunal de Contas do DF (Sindical).
Parentes
A campeã de crachás especiais para parentes e aliados é Celina Leão (PPS). São nove, ao todo. Juarezão (PSB), que, a exemplo de Celina, também já presidiu a CLDF, solicitou credenciais especiais para seis pessoas. Para Sandra Faraj (SD), foram cinco; Telma Rufino (Pros) pediu seis; o vice-presidente da Casa, Wellington Luiz (PMDB), autorizou a emissão de quatro documentos desse tipo; e Agaciel Maia (PR), outros três.
Os casos que mais chamam a atenção são os da mãe e irmãos de Celina Leão, Maria Célia Leão Neto, Bruno Leão Hizin e Antônio Abrão Hizin; da esposa e filhos de Juarezão, Rosângela Gomes de Araújo Oliveira, Julio Cesar de Araújo Oliveira e Juarez Carlos de Lima Oliveira Júnior; dos quatro irmãos de Sandra Faraj, Kaled, Samir, Youssef e Fadi Fayez Faraj (este, líder da igreja Ministério da Fé e investigado junto com a distrital pela Polícia Civil e pelo MPDFT por extorsão); da esposa de Rodrigo Delmasso (Podemos), Danielle Vidal Rola Delmasso; de Julio Cesar (PRB), Sônia Helena Duarte Ribeiro; de Wellington Luiz (PMDB), Kilze Beatriz Montes Silva; e de Agaciel Maia (PR), Sanzia Erinalva do Lago Cruz Maia.
Wellington Luiz explicou que a autorização a Kilze se deve ao fato de ela ser presidente do PMDB Mulher do Distrito Federal. “Ela participa ativamente das atividades partidárias e acompanha de perto o trabalho da bancada na Casa”, disse o vice-presidente da Câmara. O presidente Joe Valle (PDT) diz que não há irregularidades nos credenciamentos, mas que estuda ativar as catracas das entradas do prédio. Assim, tanto credenciados quanto servidores serão registrados ao entrar na Casa. Mas isto ainda não foi feito devido a uma ação judicial relacionada ao funcionamento dos equipamentos.
Dos 24 parlamentares, apenas cinco não solicitaram a benesse: o presidente da Câmara, Joe Valle (PDT), Robério Negreiros (PSDB), Rafael Prudente (PMDB), professor Israel Batista (PV), Raimundo Ribeiro (PPS) e Ricardo Vale (PT). Os deputados Chico Vigilante (PT), Wasny De Roure (PT), Reginaldo Veras (PDT), Lira (PHS), Liliane Roriz (PRTB), Bispo Renato Andrade (PR) e Luzia de Paula (PSB) pediram credenciais, mas nenhum desses assessores tem grau de parentesco com eles.
Amizade e denuncismo
Chama a atenção entre os credenciamentos especiais o caso de Pollyanna Costa, assessora do deputado Robério Negreiros (PSDB), que não tinha crachá funcional. Embora sem cargo efetivo no gabinete do deputado, ela atuava como uma espécie de apoio à secretária-executiva da 2ª Secretaria, Jane Mary Marrocos Malaquias – nomeada no dia 18 de janeiro deste ano – e circulava com desenvoltura no local e em outras dependências da Casa.
Porém, desde que o Ministério Público abriu investigação para apurar sua atuação, após a denúncia do Sindical, Pollyanna Costa não foi mais vista na Câmara. Mas o MP já apurou que ela é casada com um irmão de Jane Marrocos e é amiga de Jane Marrocos, com quem participa de eventos sociais na cidade, conforme mostra a foto nesta página.
Servidores da Câmara, pedindo anonimato, confirmam que, embora sem vínculo formal com a Casa, Pollyanna tinha acesso a documentos restritos da Segunda Secretaria e os despachava na Secretaria Geral. Robério Negreiros disse ao portal Metrópoles que não conhece Pollyanna e que jamais pediu o credenciamento de qualquer pessoa sem vínculo formal com o Legislativo. Para ele, o caso é de puro “denuncismo’.} else {