Ricardo Nogueira Viana (*)
E lá se foi setembro. O mês da seca, dos Ipês, das manifestações, das tensões institucionais, das mortes. A pandemia ainda vige. Entretanto, o mundo teve que aprender a engatinhar paralelamente ao vírus, o qual marcou as vidas dos que sobreviveram e levou milhares dos que adoeceram.
Ninguém se voluntariou e, de repente: idosos, jovens, adolescentes, ricos e pobres tiveram suas partidas antecipadas por conta do inesperado coronavírus. Além dos compulsórios óbitos, há pessoas que seguem o caminho da morte, em tese, espontaneamente. Ou seja, ceifam suas vidas por razões desconhecidas, até mesmo dos que os ladeiam.
Entoando este triste fato, o mundo celebrou o Setembro Amarelo, uma campanha educativa com vistas a chamar atenção para uma situação que pouco se fala, mas incomoda e entristece a todos: o suicídio.
Coincidentemente à data, a Polícia Civil do Distrito Federal deflagrou a operação Methylene Blue, com vistas a cessar as atividades de uma associação criminosa que fomentava esse tipo de conduta. Ou seja, concitava pessoas a se matarem.
Uma investigação policial com vistas a coibir o suicídio? Não, mas quem instigava e auxiliava esse resultado com morte. Quando se opera o direito, há crimes tipificados que não se sabe o porquê de estarem positivados. Ou seja, estão descritos na norma penal, mas raramente o Estado consegue enxergar e punir os seus autores.
Suicidar não é crime, mas aquele que participa e colabora para este resultado material incorre nas penas cominadas no Artigo 122 do Código Penal, punido com reclusão de 2 a 6 anos. Após sete meses de investigações, a Polícia Judiciária da capital conseguiu indigitar pessoas que se reuniram para praticar esse despautério.
Em tese, indivíduos encontravam-se no ambiente virtual e eram convidados a participar de um grupo fechado. Ali, trocavam informações, aconselhavam, encorajavam e receitavam produtos, inclusive com inibidores de dor, para minimizar o sofrimento na hora da morte.
Quem seguisse o caminho do desconhecido, era retirado do grupo. Pessoas iam falecendo, mas o mais surpreendente, o núcleo do grupo, inclusive o seu administrador, não saía e também não experimentava das suas próprias prescrições.
Em 2020, 800 mil pessoas suicidaram no mundo. O Brasil assimilou 12 mil óbitos, ocupando o 8º lugar neste triste ranking. A vida é um direito absoluto, irrenunciável e inalienável. Sob uma visão teológica, após Deus criar o mundo, fez o homem diante de sua imagem e semelhança.
Mas qual similitude teríamos com o onipotente que nos levaria a renunciar à própria vida ou corroborar para o término da vida alheia? Nenhuma!
De forma superficial, poderíamos caracterizar o suicida em três contrapostos adjetivos: corajoso, covarde ou enfermo. Em uma primeira análise, despojar-se do direito à luz pelos próprios meios, seria ou não uma atitude audaz.
Em oposição à ousadia, vislumbra-se a fraqueza humana a ponto de abrir mão do milagre da vida diante dos obstáculos do cotidiano. Em última razão, somente questões patológicas poderiam traduzir a ação de dar termo à própria existência.
Segundo a OMS, o suicídio virou uma epidemia com extensões globais. Portanto, é uma questão de saúde pública. Suicidar não é um ato de coragem, tampouco covardia, mas um estado de conflito ocasional em que a pessoa se encontra e, com vistas a romper pressões sociais, sentimento de culpa, remorso, depressão e ansiedade, sacrifica-se a si mesma.
Diante de uma visão espiritual-cristã, presume-se punições aos suicidas, pois a cada um foi dada uma missão e não teríamos nós o direito a interrompê-la antes do chamado Divino. Ao compulsar o decálogo, não encontramos o ato de se autoexterminar.
Ou seja, diante da porta estreita, quem seríamos nós para julgar esse tipo de ação. Do prisma criminal, nada ocorrerá a quem interrompe o fluxo da vida, nem mesmo em sua forma tentada. Entretanto, aqueles que se beneficiam de seus prazeres imorais incentivando a morte alheia, cabe ao Estado puni-los ou tratá-los, caso não tiverem discernimento do malefício de suas condutas.
A operação policial cumpriu mandados de prisão e de busca em diferentes unidades da Federação e os presos encontram-se à disposição da Justiça. O nome que intitula este artigo é justamente o antídoto que salvaria a vida dos que seguiram a recomendação dos falsos mentores.
O mês de setembro passou, mas o diálogo sobre este tema deve ser frequente e percorrer escolas, famílias, instituições, poder público e instituições privadas. A partir da educação, sem medo e pudor para falar sobre o suicídio, podemos chegar à prevenção. Iisto é, salvar vidas e mostrar àqueles que sofrem que viver vale a pena.
(*) Delegado-chefe 6ª DP e professor de Educação Física