Rita Andrade (*)
A Vila Planalto é lugar de resistência, de pioneirismo, de gastronomia e de agitação cultural em Brasília. Mas também é um espaço de muita especulação imobiliária. Um cinturão de grandes projetos imobiliários cada vez avança mais sobre a Vila e eleva a tabela do metro quadrado, expulsando, com isso, o morador nativo.
Lugar escolhido, em 1957, para abrigar os acampamentos de trabalhadores das construtoras que vieram transformar Brasília em realidade, além de acolher os engenheiros que encararam o desafio de tirar do papel o projeto do presidente Juscelino Kubitschek, do urbanista Lúcio Costa e do arquiteto Oscar Niemeyer, a Vila Planalto foi tombada pelo Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) em 1988.
Isto foi possível graças ao esforço da comunidade e a um gesto precursor simbólico, quando a menina Leiliane Rebouças conseguiu burlar a segurança do presidente e lhe entregar uma carta pedindo que a Vila não fosse derrubada e a população transferida para as cidades-satélites. Deu certo!
A Vila nasceu no centro da capital, mas com características de periferia, e revela hoje, através da sua diversidade social, um retrato de um DF desigual. A Vila guarda nas suas ruas a história viva da construção de Brasília. Nela ainda moram os últimos pioneiros e pioneiras. Nesse lugar guardamos histórias que se não preservarmos se perderão em breve.
O Conjunto Fazendinha é um exemplo vivo, ou morimbundo, disso. Um dos últimos remanescentes da construção da capital, é formado por cinco casas construídas em madeira com as linhas modernistas. Mas o abandono, a ocupação indevida e a falta de fiscalização tomam conta do Conjunto Fazendinha.
É lamentável ver o descaso do GDF com esse importantíssimo conjunto histórico. Estamos falando de um tombamento rigoroso e deixar este local à mercê do tempo caracteriza um dos grandes crimes contra o patrimônio no DF. Trata-se da nossa herança, do direito que temos de acessar nossa história e do compromisso que temos em deixar esse legado para as próximas gerações.
Tudo muda ao longo do tempo. Nada é estático. Sabemos disso. Aceitamos as alterações que tragam benefícios sociais para os moradores e frequentadores da região e não apenas para pessoas em trânsito ou para os magnatas da construção civil.
A Vila Planalto tem uma vocação para a economia criativa. Podemos ter ali um roteiro gastronômico e cultural que promova a geração de renda. Mas, também é preciso pensar e agir em prol dos moradores locais, dos candangos, dos nossos jovens, de como garantimos o bem-viver nesse território tão precioso.
É urgente que a Câmara Distrital se manifeste sobre isso, que crie leis que disciplinem o espaço para que ele não seja desfigurado arquitetonicamente e socialmente.
(*) Artista e presidente do Conselho de Curadores da Fundação Brasileira de Teatro