Na discussão sobre a reforma da Previdência Social temos visto referências ao “problema” do envelhecimento da população. Vamos deixar claro que o aumento da longevidade no Brasil é, antes de tudo, sinal de que alguma coisa certa estamos fazendo: Morríamos aos 45 anos, em 1940, e agora passamos de 76. A longevidade está aumentando porque diminuíram os riscos de morte por doenças infectocontagiosas, como gripes e tuberculose. O que nos aflige atualmente são doenças crônicas, como como câncer, diabetes, hipertensão e doenças de fundo psicoafetivo.
Isso nos impõe novos desafios: a sustentabilidade do sistema previdenciário e o custo da assistência em saúde, que é maior para as doenças crônicas, cuja incidência tende a aumentar com a idade. É natural que as políticas para as duas áreas sejam revistas. E não se pode mudar a Previdência sem considerar a Saúde.
Em primeiro lugar, precisamos reconhecer que os governos têm errado ao deixar de educar a população para fazer reserva pessoal para o futuro – a discussão do déficit previdenciário não é nova. Fique claro que a previdência privada deve existir para complementar e não substituir a pública. Da mesma forma que a saúde suplementar existe para suprir aquilo que o SUS não pode prover e não para disputar público.
Os anos da velhice podem não chegar a ser os melhores da vida, mas certamente serão os mais caros. A perspectiva de diminuição do poder econômico pós-aposentadoria, como se desenha com o Projeto de Emenda à Constituição que está sob análise do Congresso Nacional tem o potencial de impacto de um tsunami se errarem a mão. O problema começa na falta de previsão de piso para aposentadorias e pensões. Ou seja, aposentados e pensionistas poderiam ficar com rendimento inferior a um salário mínimo.
Outro aspecto é o reflexo de um eventual empobrecimento na terceira idade. Pela letra da lei, a responsabilidade pela garantia de acesso à saúde dos nossos idosos, mais do que quaisquer outros, é do Estado. Temos 28 milhões de brasileiros acima de 60 anos e teremos mais de 40 milhões em dez anos. Entre os mais velhos de hoje, 24% (cerca de 6,8 milhões) têm plano de saúde e 76% (21 milhões) dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde.
O custo da saúde suplementar (os planos) é cada vez mais difícil de ser absorvido pelas famílias – a inflação específica do setor da saúde oscila anualmente na casa dos 20%. Mais grave que isso, dados do Sistema de Indicadores para Acompanhamento de Políticas de Saúde do Idoso da Fiocruz mostram que, dos 863 mil óbitos de idosos ocorridos em 2016, 211 mil eram evitáveis – ocorreram antes da hora – por falha na prestação de assistência. Desses, pasmem, 156 mil não tiveram acesso a atendimento médico. Resultado do desmonte que tem ocorrido no SUS.
Apesar de 56% dos idosos brasileiros terem renda nominal de até um salário mínimo, muitos têm voltado a ser o provedor principal da família, tanto pelo desemprego que é maior na juventude quanto pela dilação do tempo de formação acadêmica com a torrente de pós-graduações que o mercado cobra. Ao mesmo tempo, há estudos indicando que aposentados gastam metade de seus ganhos com medicamentos.
Esses e outros dados expostos por especialistas de diversas áreas deixam uma coisa clara: a reforma da Previdência é necessária, mas não se restringe a uma questão de equilíbrio orçamentário – pode ter reflexo até na própria expectativa de vida do cidadão.