Há uma forte controvérsia no PT e entre os economistas de esquerda sobre o desempenho da economia brasileira nesses dois primeiros anos do 3º mandato de Lula, embora seja consenso que obviamente melhorou em relação aos quatro anos de Bolsonaro/Guedes.
Apesar das dificuldades postas pela direção bolsonarista do Banco Central, pela ampla maioria do Congresso (desonerações fiscais, marco temporal) e da má vontade do mercado financeiro e da maior parte do empresariado agrário e industrial, a economia tem se recuperado. Para um setor da esquerda, muito bem, para outro, abaixo das expectativas ou das possibilidades.
O PIB em 2024 crescerá novamente em torno de 3%, e acumula em dois anos (6%) um crescimento maior do que nos 4 anos de Bolsonaro (5,8%), mas o crescimento médio está abaixo da média mundial. A inflação em 12 meses está em 4,34%, abaixo do teto da meta (4,75%) e bem abaixo do que foi no governo anterior.
A taxa de desemprego de 6,6% é a mais baixa desde 2012 e muito abaixo da média de 11,5% no governo Bolsonaro. Mas não há motivos para comemorar. Ainda são mais de 10 milhões de desempregados (incluindo desalentados) e a maioria do pessoal ocupado está na informalidade, em empregos precários.
A balança de transações correntes apresentou sensível melhora; as reservas internacionais cresceram de US$ 330 para US$ 350 bilhões e o controverso déficit fiscal tem sido reduzido à fórceps. Frente a isso o Ibovespa alcançou o maior patamar de sua história no Governo Lula e uma das agências de risco está perto de conceder ao país o grau de investimento. E houve a retomada de vários programas sociais (combate à fome, farmácia popular, MCMV).
Mas coisas muito ruins persistem: em 2024 o Estado vai transferir R$ 850 bilhões aos megainvestidores a título de pagamento de juros da dívida pública; outros R$ 500 bilhões de isenções tributárias, e concedemos “tributação zero” aos mais de R$ 650 bilhões de lucros distribuídos aos proprietários e acionistas de empresas. São R$ 2 trilhões para os capitalistas, base de uma indecente concentração da renda.
Se a economia, inequivocamente, vai melhor do que com Bolsonaro/Guedes, por que metade da população, segundo as pesquisas, acham que está pior ou igual? Sim, trata-se essencialmente dos eleitores de Bolsonaro, mas não se conseguiu avançar nada nesta parcela do povo, especialmente entre os milhões que estão na faixa de até 3 salários-mínimos.
O fato é que, apesar dos bons números na economia e no quadro social, o PT e seus aliados de esquerda pouco conseguiram capitalizar em termos de desempenho eleitoral nessas eleições, muito abaixo da aprovação ao governo Lula. Ah! São eleições locais, para “síndicos” das cidades. Sim, mas em 2004, 2008 e 2012 o PT conseguiu capitalizar os bons números (relativamente a FHC) dos governos Lula e Dilma.
Em 2004, após a primeira eleição de Lula, o PT elegeu 409 prefeitos, mais que o dobro em relação aos 187 de 2000. Em 2008 subiu para 558 e em 2008 para 635. E grande número deles nas capitais e em grandes cidades do interior. A marca PT era muito forte, eram os seus “anos dourados”.
Depois vieram os “anos de chumbo” (2016 e 2020), com o combo “Lava-Jato, impeachment de Dilma e prisão e inelegibilidade de Lula”. E o número de prefeitos eleitos caiu para 256 e 183. Mas era de se esperar que, com a eleição de Lula e a melhora no quadro econômico e social do país, o desempenho do PT melhorasse, o que não ocorreu.
Alguns dizem que o PT cresceu em relação 2020, de 183 prefeitos para 248 em 2024 (podendo chegar a 261). Isso é tapar o sol com a peneira: 248 prefeituras correspondem a pouco mais de 4% dos municípios brasileiros. Ademais, o PT não consegue disputar na maioria das cidades grandes e médias.
Em alguns estados, a situação ilustra tal quadro. Nos ‘anos dourados’, o PT elegeu em São Paulo, respectivamente, 57, 63 e 68 prefeitos. Já nos “anos de chumbo” despencou para 8 e 4 e agora caiu para 3. No Paraná, Santa Catarina e Pará, queda similar. No Mato Grosso do Sul, onde chegou a eleger 18 prefeitos em 2004, nos ‘anos de chumbo’ não elegeu um único prefeito, situação que se manteve agora.
Em relação à eleição de vereadores, o PT elegeu 3.118 (6%) num universo de 58.000. Cresceu, mas é pouco mais da metade do que foi eleito em 2012. Seus candidatos a vereador obtiveram 7,36 milhões de votos (6,5% do total), e os dos demais partidos de centro-esquerda,14,5%.
Já o “Centrão Raiz” (PP, UB e REP) e o “Centrão do B” (PSD e MDB) obtiveram 50,6 milhões de votos (45% do total), cinco vezes mais que os 10,3 milhões do PL (9%). Os partidos nanicos da direita amealharam 25%.
Triste ver o número de vereadores do PT no Paraná encolher de 348 em 2012 para 121; em Minas, de 814 para 362; e no Acre, onde já governou, diminuir de 50 para pífios 4 vereadores.
O quadro nas capitais foi terrível. Em Salvador, onde Lula obteve 71% dos votos há dois anos, o PT elegeu apenas 1 vereador em 43; em Manaus, 1 em 41; em São Luís, onde Lula teve 60% dos votos, 1 em 31; em Recife, onde Lula teve 56% dos votos, 2 em 37; em Cuiabá, nenhum em 27. São Paulo, Porto Alegre e Teresina escaparam da terra arrasada.
Parece óbvio que tais resultados guardam estreita relação com a distribuição dos cerca de R$ 50 bilhões em emendas parlamentares. Não por acaso, a taxa de reeleição de prefeitos foi a maior da história. Dos 3.004 que tentaram a reeleição, 2.444 (81,4%) se reelegeram.
Dos 112 prefeitos que, segundo o TCU, estão entre os que mais receberam verbas de emendas parlamentares, 110 se reelegeram (90%) e 6 estão no 2º turno. O Centrão, que já tem 47% dos deputados na Câmara, elegeu 3.500 prefeitos (61,4% do total de 5.569) e 31.600 vereadores (54,5% de 58.000).
Qual a razão desse desempenho se não a dinheirama oriunda das emendas parlamentares? Deputados e senadores com muito dinheiro para “apadrinhar” obras públicas elegem mais prefeitos e vereadores. E o mais tenebroso: partidos com muitos prefeitos e vereadores elegem mais deputados federais e estaduais, senadores e governadores.
É o que nos reserva 2026. Vem chumbo grosso por aí!