Este é o título da campanha da Federação das Associações de Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) para combater a possível privatização daquele banco. Nesta entrevista exclusiva ao Brasília Capital, o presidente da entidade, Jair Pedro Ferreira, fala da mobilização de toda a sociedade em defesa das empresas públicas e faz críticas à Medida Provisória 905, do governo Bolsonaro, que subtrai direitos dos trabalhadores, especialmente dos bancários.
A Fenae está fazendo uma campanha de conscientização e de esclarecimento sobre a importância de manter os serviços da Caixa não privatizados. Como é esse trabalho? – A Caixa serve à população brasileira há 158 anos, seja pelos programas habitacionais, pela administração de fundos, no atendimento ao trabalhador, ou como banco. Então, quando a gente vê as ameaças que estão colocadas hoje para essa empresa, é preocupante. Desde 1964, a Caixa já financiou 17 milhões de casas; é gestora do FGTS, centralizado na Caixa desde 1991. Hoje ela administra os programas por meio do Bolsa Família. Ou seja, a Caixa tem um papel importante, independentemente de governo, porque os governos mudam. Ela é do Estado, do cidadão, e superavitária. A Caixa tem rentabilidade, atende milhões de pessoas. Cumpre um papel. Atacar essa instituição, como está se tentando fazer, é um tiro no pé que o governo está dando.
Quantos funcionários a Caixa tem hoje? – São 82 mil concursados. Já perdemos 20 mil vagas de trabalho nos últimos 4 anos. Desde 2014 e a Caixa não contrata. Ela tem um banco de concursados, que está no Ministério Público. Em janeiro de 2015, éramos 101.500. Hoje, devemos estar com 82 mil concursados. Ao longo desse tempo as pessoas foram se aposentando e a empresa não contrata. Isso aumenta a sobrecarga de trabalho sobre os bancários, e começa a ter um adoecimento, o que compromete o atendimento à população, a verdadeira dona da empresa.
E o governo mandou para o Congresso a MP 905, que é mais um ataque aos trabalhadores… – Exatamente. Quando a gente acha que não pode piorar, piora. Estão tentando mexer na jornada dos bancários, que há mais de 50 anos não trabalham aos sábados e domingos. No caso da Caixa, há mais de 30 anos a jornada é de 6 horas. De repente, você vê isso sob ataque. Não só os ataques à organização e ao trabalhador, mas ao próprio dia-a-dia dos bancários de um modo geral.
E a tramitação é curta. São 60 dias, com mais 60 de prorrogação… – Isso. Nós temos que juntar as pessoas para cancelar essa MP, porque é uma afronta do governo. No fundo, ele está fazendo uma mudança na legislação trabalhista. Teve a reforma trabalhista, em 2017, que já tirou vários benefícios e direitos, e agora de novo. Essa MP mexe em mais de 60 itens da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). É um ataque a todo o arcabouço de proteção ao trabalhador que foi construído ao longo dos anos.
Como tem sido desenvolvida a campanha da Fenae? – Estamos nos concentrando nela. Para nós, é muito importante que a Caixa Econômica, como empresa pública, seja cada vez maior dentro do Estado. Ela já provou que é possível. Temos juntado todas as entidades internas, de gestor, de avaliador, de auditor, e externas, que são as centrais sindicais. A gente tem parcerias com câmaras de vereadores, com prefeitura, com entidades patronais. Porque quem trabalha na área habitacional ou de urbanismo, ou de infraestrutura, sabe que a Caixa é um dos principais financiadores desse tipo de projeto. Então, a nossa campanha de defesa é: A Caixa é toda sua. Porque a sociedade vai perder se não for assim. Quem é a sociedade? É a pessoa que vai à lotérica, é a pessoa que precisa receber um benefício, que vai atrás de financiamento… A Caixa tem agências em mais de 800 municípios, e nos demais 4 mil e poucos, tem correspondentes. Ou seja, de alguma forma a Caixa está presente. Seja através da loteria ou do correspondente bancário. E isso tudo está ameaçado, um trabalho social que já é feito há quase dois séculos. Estamos fazendo audiências públicas nos Estados, nas prefeituras.
A ameaça de privatização atinge também outros bancos públicos? – Bancos como BRB, aqui em Brasília, e o Banco do Brasil também estão sob ameaça. Desde os anos 1990 o governo federal ataca os bancos estaduais. Hoje, só resta o BRB, o Banpará, o Banese (SE), o Banestes (ES) e o Banrisul (RS). Todos os outros foram extintos, vendidos ou incorporados.
Como é a integração do trabalho da Fenae com os sindicatos e as centrais sindicais? – A Federação das Associações de Pessoal da Caixa Econômica (são 27 APCEF’s) tem 48 anos e sempre tivemos uma parceria de atuação e defesa dos bancos públicos e da democracia com as outras entidades. Praticamente todos os sindicatos dos bancários têm alguma interação, embora sejamos entidades separadas, cada uma com sua natureza. Mas a atuação política com elas é grande. Com as centrais sindicais, o movimento de moradores, os movimentos habitacionais, todos têm uma atuação grande da nossa parte. Sozinho não se vai a canto nenhum. Todas as entidades que têm isso no seu escopo, são nossas parceiras.
Dos 82 mil funcionários da Caixa, quantos estão associados à Fenae? – Entre os 82 mil da ativa e mais 50 mil aposentados, de 55 mil a 60 mil são associados à Fenae e às APCEF’s.
Então é esse “exército” de 55 mil pessoas que pode entrar na luta em defesa da Caixa pública… – É. A gente trabalha olhando esses, mas também olha os demais que não são associados, porque a gente tem diversas pautas, como o Fundo de Pensão e plano de saúde da Caixa que extrapolam os associados. Se não tiver a Caixa, por exemplo, não adianta nada eu ter 82 mil, porque vai todo mundo embora. Eu trabalhei no Banco do Estado do Paraná antes de entrar na Caixa, em 1989, e o Banestado foi comprado pelo Itaú. Não tem mais nada do Banestado. Os 8 mil funcionários foram demitidos.
Isso pode se repetir na Caixa? – Tem gente que tem a ilusão de que vai privatizar e vai melhorar. Não vai. Vai fechar. Qual foi a empresa que foi privatizada e melhorou? Nenhuma. Porque o capital pega a parte que dá lucro. Mas essas empresas são públicas. O dono é a sociedade. O que tem dinheiro e o que não tem dinheiro. Para quem tem dinheiro sempre existe uma alternativa. Qualquer banco vai procurar, botar num ar-condicionado, dar um monte de benefício.
É a lei do mercado… – No Brasil, tem uma distorção tributária muito grande. Quanto menos você ganha, mais você paga de imposto proporcional à sua renda. Estudos mostram que quem ganha até dois salários mínimos paga 52% da renda de imposto, porque é tributado no consumo. Quem tem a renda baixa, sobrevive pra pagar comida e roupa. E é nesses itens que está a tributação. Já é uma distorção muito grande. A sociedade é dona dessas empresas, dona desses bancos, então se tirar essa empresa dessa tarefa, o setor privado não vai atender quem não tem dinheiro. Isso é da natureza do banco.
De que forma as pessoas podem apoiar a campanha? – A Fenae, juntamente com as entidades, tem um comitê em defesa da Caixa, formado pela Federação dos Gestores, pelas associações dos advogados, pela associação dos engenheiros e arquitetos, mais as centrais sindicais. Um embate bom é o Congresso. As pessoas votaram em alguém. Então, têm que procurar os parlamentares que as representam. Nós vamos colocar toda nossa estrutura, toda a nossa energia nessa missão. Temos um canal de comunicação, que é o site da Fenae, tem também A Caixa é Toda Sua, que tem um endereço próprio para as pessoas se inteirarem do assunto, tem as mídias sociais, que estão todas envolvidas. Temos que ir na articulação. Tem que haver conversa, envolvendo as pessoas, família, cliente. O chamamento é para que todos estejamos lá, juntos, para fazer esse enfrentamento e vencer. Quem sabe daqui alguns anos possamos ter novamente a tranquilidade de trabalhar em uma empresa que proporciona um futuro melhor. Hoje, esse futuro está sob ameaça.