Que uma coisa fique bem clara: nenhum governo de direita, de qualquer país e em qualquer época, teve ou tem qualquer estratégia para resolver os problemas da maioria de seu povo, especialmente da classe trabalhadora. Até porque, são governos da classe dominante, que tem como objetivo garantir, e quiçá aumentar, os interesses e privilégios da burguesia e de setores da classe média. Foi o caso de Bolsonaro no Brasil, é o de Milei na Argentina e, certamente, o de Trump nos EUA.
Não se viu da parte de Trump, na recente campanha eleitoral, qualquer referência a ações ou programas para, por exemplo, solucionar a escandalosa ausência de um plano de saúde universal e gratuito no país mais rico do mundo. Dezenas de milhões de trabalhadores norte-americanos comprometem uma enorme parcela de sua renda com gastos astronômicos em caríssimos hospitais privados. Do mesmo modo, milhões de famílias passam anos juntando um dinheirinho suado para poder bancar os estudos de seus filhos em universidades.
E o drama das moradias, com milhões de famílias que vivem o “terror” das hipotecas, permanentemente acossadas pelos bancos, ou – ainda pior –, o mais de meio milhão que estão morando nas ruas. Trump fala em trazer os empregos de volta para os EUA, mas o que vemos na América é o avanço sistemático do trabalho precário (são mais de 27 milhões trabalhando por aplicativos de toda sorte) e o rebaixamento do salário médio, sendo o salário-mínimo pífios US$ 7,25/hora, uma miséria ante o elevado custo de vida.
É fato que se Trump não apresentou qualquer proposta para solucionar os reais problemas da maioria do povo norte-americano, tampouco Kamala Harris ou Joe Biden o fizeram. Os programas de ambos são espantosamente semelhantes. Como nada tem a dizer em como solucionar os reais problemas do povo, Trump recorre a discursos que prometem ações estapafúrdias, como comprar ou invadir a Groenlândia; anexar o Canadá como o 51º estado norte-americano; reanexar a Zona do Canal do Panamá ou a cínica proposta de transformar a devastada Faixa de Gaza numa espécie de Riviera Francesa.
Recorre, ainda, a ações de deportação de milhares de imigrantes ilegais; a proibição de atletas trans de participarem de competições oficiais; a proibição de que filhos de imigrantes nascidos nos EUA obtenham a cidadania americana e a ameaça de tarifaços sobre produtos importados, sejam de países aliados ou do BRICS.
É fato que o imperialismo norte-americano, durante a Guerra Fria e, ainda mais, após o colapso da União Soviética, fez o que quis planeta afora. No período do pós-guerra até os dias atuais (1946/2023), só na estratégica região do Oriente Médio, os EUA investiram fortemente na sustentação de regimes aliados, que garantiram vasto fornecimento de petróleo e gás.
Em termos de venda de armas, nada menos que US$ 330 bilhões foram para 5 países da região, incluindo Israel com US$ 53 bilhões e quatro ditaduras locais (Arábia Saudita, EAU, Egito e Turquia). E outros US$ 300 bilhões foram para outra região estratégica – a região do Pacífico – em claro cerco à China (Japão, Coreia do Sul, Taiwan e Austrália).
Quanto à assistência militar, Israel liderou, tendo absorvido nada menos que US$ 230 bilhões desde 1946, seguido de países que contaram com intervenção militar dos EUA (Afeganistão, Iraque, Vietnam, Coreia e a mais recente Ucrânia), além de Egito e Turquia. Por fim, quanto à assistência econômica, liderança também para Israel (US$ 80 bilhões), ao lado de Egito e Índia, seguido dos países que receberam tropas norte-americanas.
Mas a chave está virando. As manifestações de poderio vão se transformando em sintomas de fraqueza e decadência, o que leva a ações extremas. Foi assim com a queda dos impérios Romano e Britânico. Arrogância, chantagens e ameaças não impediram o colapso de ambos.
Os EUA assistem, perplexos, a China – no velho estilo chinês – “comendo pelas beiradas”, ampliando e fortalecendo o bloco do BRICS. O ingresso da Indonésia e a prevista adesão plena da Nigéria agrupa no BRICS quase todas as potências regionais do chamado “Sul Global”, ficando por acontecer apenas os ingressos do México e do Paquistão. E a influência dos EUA vai ficando restrita ao bloco europeu, as ditaduras do Golfo Pérsico, Japão, Coreia do Sul e Austrália. A vazia retórica de extrema-direita de Trump encontra eco na alienação da maioria do povo norte-americano. Resta saber até quando!