Em 28 de julho ocorrerão eleições na Venezuela, e a grande mídia se apressa em dizer que não serão democráticas. Será? O que, de fato, se passa na Venezuela? No início do século XX, com a descoberta de grandes reservas de petróleo, a Venezuela tornou-se o paraíso das corporações petrolíferas dos EUA. Mesmo após a tardia criação da estatal PDV, em 1976, a enorme riqueza gerada pelo petróleo era carreada para fora do país, mas com sobras polpudas para a elite local e parte da classe média. Já a maioria do povo vivia na pobreza. Tal situação levou à frequentes revoltas populares e à eleição do coronel Hugo Chaves em 1998.
Direcionando os recursos gerados pelo petróleo para o atendimento das necessidades básicas da população mais pobre (alimentação, educação, saúde, habitação), Chaves logo sofreu a sabotagem da burguesia e sanções econômicas pelo imperialismo norte-americano. Uma guerra sem trégua, envolvendo boicote às exportações de petróleo; restrições à aquisição de equipamentos para a indústria petroleira, gerando brusca queda da produção; sequestro de ativos venezuelanos depositados em bancos no exterior e sequestro de suas reservas em ouro pela Grã-Bretanha. O custo social é enorme, com a emigração de milhões de venezuelanos.
A grande mídia fala que a Venezuela é uma ditadura. Mas desde 1998 foram realizadas mais de 30 eleições. Em julho, participarão 37 partidos políticos, com candidatos a presidente, e há total liberdade de imprensa. São diversas TVs e jornais fazendo oposição ao governo. E o que é a oposição “democrática” venezuelana? É a que deu um golpe de estado contra Chaves em 2002; que em 2020 tentou, com mercenários, uma invasão e que tentou impor, com apoio dos EUA e da União Europeia, um presidente fantoche, Juan Guaidó, que roubou US$ 50 milhões fornecidos pela CIA.
A grande mídia protesta contra a impugnação da candidatura de Maria Corina Machado, apoiada pelos EUA, que se acha duplamente impedida: pelo Judiciário, por corrupção, e por participar do golpe de 2002 e da invasão de 2020; e pelo Conselho Eleitoral, pois seu movimento, o “Vente Venezuela”, não está registrado como partido. Sabendo que estava inelegível, indicou Corina Yoris, também não filiada a nenhum partido político. No Brasil e em qualquer país democrático, ambas seriam inelegíveis. Mas não faltam candidatos de oposição (12).
O que está em curso, de fato, é uma campanha articulada pelos EUA, com respaldo da grande mídia, para deslegitimar o processo eleitoral venezuelano e não aceitar, desde logo, seus resultados. O imperialismo norte-americano chama de ditadura qualquer país que não se curve à sua vontade, mas faz vista grossa para os crimes cometidos por ditaduras sanguinárias, como as da Arábia Saudita e do Egito. A essas, nenhuma sanção, mas sim fornecimento de material bélico.
Um desses regimes é o de Nayib Bukele, em El Salvador. Nas eleições de fevereiro último, Bukele foi reeleito com 84% dos votos. E a grande mídia se limitou a destacar sua vitória esmagadora, “esquecendo” de mencionar que ele concorreu a reeleição (vetada pela Constituição) trocando os ministros da Suprema Corte; que a Comissão Eleitoral por ele nomeada impediu a propaganda da oposição, elegendo 54 dos 60 parlamentares; e que as atas eleitorais foram transportadas pelos membros do seu partido.
E mesmo assim, os 84% (2,7 milhões de votos) representaram apenas 43% dos 6,21 milhões de eleitores salvadorenhos registrados (incluindo os imigrantes nos EUA). Os que se abstiveram, votaram nulo, em branco ou em outros candidatos foram 3,51 milhões (57%). Bukele diz combater as facções criminosas, mas ao preço de manter encarcerados 100 mil salvadorenhos numa população de 7 milhões, sendo o país com mais presos por 100 mil habitantes no planeta (1.400). No Brasil, a taxa é de 380/100 mil e nos EUA de 590/100 mil. Mais de 400 foram executados nas prisões desde 2022.
Para ser preso em El Salvador basta ser delatado no Disque Denúncia; participar de grupos ou reuniões “ilícitas”; ter qualquer tatuagem, mesmo que não seja de gangues e “ficar nervoso” na hora da abordagem policial. Enquanto isso, crescem a carestia, o desemprego e a miséria. Cerca de ¼ dos salvadorenhos (2,3 milhões) vivem nos EUA e 50% dos jovens (18 a 29 anos) do sexo masculino estão desempregados, integram gangues, estão presos ou migraram para os EUA.
Mas o imperialismo norte-americano chama seu regime de “democracia” e a grande mídia diz que Bukele tem 90% de aprovação. Faz algum sentido alguém que recebe 43% dos votos ter a aprovação de 90% do povo?