O Walmart Brasil fez um acordo com organismos governamentais dos Estados Unidos pelo qual pagará US$ 282 milhões (cerca R$ 1,080 bilhão, pela cotação de 25 de junho) para trancar um processo que apura práticas de corrupção fora daquele país. As atividades investigadas focaram México, China e Índia. O acordo trata diretamente, dentre outras unidades, das instalações do supermercado em Brasília. Do total, caberá a WMT Brasília o pagamento de uma parcela de U$ 724.898 (R$ 2,776 milhões).
Em 2012, o Departamento de Justiça (equivalente ao Ministério da Justiça no Brasil), a receita federal estadunidense e o Federal Bureau of Investigation (FBI) abriram investigações contra as iniciativas do grupo varejista no exterior. A suspeita era de que, dentre outras irregularidades mundo a fora, o grupo teria pago 500 mil dólares em propinas para se instalar na Capital Federal.
O período foco da investigação, 2009 a 2012, corresponde ao final do governo de José Roberto Arruda ao governo de transição de Rogério Rosso e ao governo de Agnelo Queiroz. As informações tornadas públicas à época não detalharam se as irregularidades ocorreram apenas na gestão de Arruda ou se prolongaram nos demais governos.
O Walmart sempre negou, mas agora preferiu fazer um acordo, semelhante aos acordos de leniência firmados por empreiteiras no âmbito da Lava-Jato.
O Walmart cresceu rápido no Brasil. São 471 lojas físicas em 203 municípios, com nove bandeiras (denominações) diferentes, em quatro regiões do País. Em 2018, era considerado o terceiro maior grupo de varejo no Brasil, com 258 unidades e 70 mil empregados. A empresa não informou seu faturamento daquele ano, mas em 2016 foram R$ 29,4 bilhões.
Feiticeira fazia milagres no GDF
Apesar da sua importância econômica, a imprensa brasileira nunca deu muita evidência a esse caso, embora tenha sido noticiado pelo Wall Street Journal, o jornal dos homens de negócio dos Estados Unidos, e transmitido para o mundo inteiro pela agência francesa de notícias France Press.
À época, os dois noticiários informavam que investigadores federais concentravam suas investigações em um montante de US$ 500 mil (cerca de R$ 1,85 milhão), na cotação de então; pagos a uma mulher, supostamente contratada pelo Walmart, para servir de intermediária junto a autoridades do Governo do Distrito Federal.
Os americanos não informaram o nome, mas apontaram que o apelido dela dentro do Walmart Brasil era “sorceress” (feiticeira, em português). A denominação designava a forma milagrosa e ágil pela qual as permissões de construção eram concedidas.
]Também está envolvida na história uma empreiteira, cujo nome não foi revelado, responsável por construir no Brasil oito lojas da rede a um custo de US$ 52 milhões. A feiticeira teria sido contratada pela construtora por recomendação da Walmart Brasil.
Em 2009, no governo Arruda, por meio dela, “pagamentos impróprios” teriam sido feitos a “inspetores governamentais” e autoridades para acelerar a regularização das lojas. A mulher não foi identificada nas reportagens, mas já teria ocupado cargo no GDF e teria atuado de 2009 a 2012 para que o Walmart obtivesse licenças para construir e operar em dois pontos da Capital Federal.
As reportagens norte-americana não esclareceram se tais licenças eram alvarás de construção, alvarás de funcionamento, ou ambos.
Multa e confissão: ficou barato
No processo de investigação, segundo o New York Times, a subsidiária no Brasil se confessou culpada por ter burlado leis federais norte-americanas que regulam procedimentos anticorrupção. A WMT Brasília confessou também não ter mantido registros contábeis na forma exigida pela lei.
Assim, o grupo acordou pagar ao Departamento de Justiça, pelas implicações criminais, cerca de US$ 138 milhões, e à Securities and Exchange Comission (SEC), órgão regulador do mercado financeiro, outros US$ 144 milhões.
A multa negociada pela empresa é muito menor do que os valores que chegaram a ser debatidos para a formulação do acordo em 2016, no governo Barack Obama. Na época, segundo registros do The New York Times, os procuradores exigiam uma multa de US$ 600 milhões. Os valores também ficaram bem abaixo dos US$ 1,78 bilhão cobrados da Petrobrás em investigação de corrupção nos EUA.
GDF não fez acordo de leniência, diz Controladoria
Procurado pela coluna, o Controlador-Geral do DF, Aldemário Araújo, disse que no passado o órgão do GDF realizou várias ações de controle abrangendo o caso, e que seria necessário verificar a conclusão de cada relatório para poder avaliar desdobramentos do episódio. Informou, ainda, que por parte das autoridades locais não houve qualquer acordo de leniência com o grupo econômico.
Depois de passar por um processo de baixo desempenho, em 2018 a Walmart vendeu 80% do seu controle acionário ao Fundo Advent Global, que, segundo a agência de notícias Reuters, pretende transformar as lojas de baixo desempenho da rede em estabelecimentos de atacarejo. Não está claro qual será o destino das lojas de Brasília.