Letícia Sallorenzo
Após dois ataques a escolas brasileiras num intervalo de 16 dias, o País vive uma fase de disseminação de pânico nas comunidades escolares. Em vídeo, a diretora do Sinpro Luciana Custódio alerta que a ação para coibir esses ataques não é simples, mas requer vontade política, e deve ser coordenada e executada em parceria. Para ela, esses ataques são consequência de uma sociedade que teve legitimados o discurso de ódio, a violência e a discriminação.
Luciana Custódio explica que, para combater a violência nas escolas, é preciso que as elas tenham profissionais educadores suficientes e preparados para lidar com o assunto. “Não se combate violência nas escolas sem uma política forte voltada para a valorização da educação, estruturação das escolas com profissionais suficientes. Infelizmente, as escolas têm vivido entre colapsos, com turmas superlotadas, profissionais que não são do quadro efetivo, com alta rotatividade, que não interagem e conhecem a comunidade em que atuam”.
Pânico disseminado
No DF, ao menos cinco colégios sofreram com ameaças de ataques nas últimas duas semanas. Mas esse tipo de ataque contra escolas é bem específico, perpetrado por um grupo específico de adolescentes / jovens do sexo masculino, com perfil socioeconômico já delineado, que se reúnem em grupos em redes sociais que são monitorados por jornalistas especializados desde 2011, após o ataque contra a escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro.
Os jornalistas que monitoram esses grupos avisam que a subcomunidade de adolescentes monitorada recebeu uma leva de perfis novos que estão inflando supostas ameaças de ataques – e são supostas porque estão fora do padrão do que se observava na comunidade anteriormente.
Letícia Oliveira, editora do site El Coyote, conta que algumas imagens e áudios enviados a escolas e alunos não são de adolescentes. Essas mensagens emulam linguajar de facção criminosa – são fotos do tipo ostentação, com dois homens armados em poses ameaçadoras. Elas fogem do padrão da comunidade monitorada. Há também o registro de uma mesma imagem que está sendo enviada para diferentes escolas no Brasil todo.
Letícia conclui que, por perceberem as ameaças coordenadas (algo que também foge totalmente do padrão da comunidade monitorada), o que está acontecendo agora aparentemente é uma ação coordenada para criar pânico. É preciso, portanto, rastrear de onde vêm essas ameaças.
A jornalista alerta que os meses de março e abril são os mais propensos a ataques contra escolas. O massacre de Suzano ocorreu num 13 de março; em abril, além do Massacre de Realengo, houve também o massacre de Columbine, nos Estados Unidos, ocorrido num dia 20.
A professora da Universidade Federal do Ceará Lola Aronovich explica o porquê da predileção dos criminosos pelos meses de março e abril:
“Há grupos misóginos/neonazistas que comemoram esses ataques [de Realengo e Columbine] e tentam recrutar jovens para cometer novas chacinas”
conta. Lola observa a movimentação desses grupos há pelo menos 15 anos.
O Ministério da Justiça abriu um canal para receber denúncias de possíveis ataques contra escolas. O link é mj.gov.br/escolasegura.
Ação coordenada para desacreditar documento
Lola Aronovich e Letícia Oliveira são duas das coautoras do relatório “Ultraconservadorismo e Extremismo de Direita entre Adolescentes e Jovens no Brasil”, resultado de trabalho conjunto de 11 pesquisadoras, lançado em dezembro de 2022 e encaminhado ao grupo de transição da área de educação do governo federal.
Letícia alerta sobre a ocorrência de um ataque da extrema direita para desacreditar o conteúdo do relatório. Diversos perfis de direita “acusam” o relatório de Daniel Cara de não ser confiável por ter sido “elaborado por petistas”, sem avisar que o relatório foi elaborado a pedido da equipe de transição do governo Lula.
Esses mesmos perfis de direita alegam que o problema dos ataques às escolas é, “segundo pesquisadores renomados, um fenômeno multifatorial, que envolve doenças mentais, comportamentos psicopáticos e psicóticos, e traumas decorrentes de experiências familiares negativas e/ou violência psicológicas sofridas no próprio ambiente escolar”. Nem os pesquisadores nem os estudos são identificados.
Já o relatório de Daniel Cara, datado de dezembro de 2022, aponta que desde o início dos anos 2000 já ocorreram 16 ataques, dos quais 4 aconteceram somente no segundo semestre de 2022. Ao todo, 35 pessoas perderam suas vidas e 72 sofreram ferimentos.