Quando soube da nova encíclica do Papa Francisco, lembrei-me de meu professor Ignacy Sachs, que era judeu. Há 45 anos, ele abriu meus olhos para o limite “ao” crescimento, devido às restrições físicas, e para o limite “do” crescimento, pela impossibilidade de o consumo supérfluo fazer uma humanidade mais feliz. Mas, por décadas, aqueles que indicavam os limites “ao” e “do” crescimento propondo um novo modelo de desenvolvimento para nações foram rejeitados pela “teologia do crescimento”.
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A ideia do progresso como sinônimo de produção e consumo crescentes domina o pensamento social como uma doutrina religiosa. A escassez de recursos e as mudanças climáticas passaram a mostrar os limites físicos da natureza; a desigualdade social crescendo ao ponto de quase romper o sentimento de semelhança entre os seres humanos, o vazio existencial e as crises econômicas mostraram os limites éticos do crescimento.
Quando a palavra “decrescimento” passou a ser utilizada como uma alternativa, escrevi nesta coluna sobre o assunto; um leitor publicou crônica em outro jornal dizendo que eu havia sido submetido a uma lobotomia. Na verdade, a insanidade na voracidade do processo da produção e consumo há quase 50 anos apresenta indicadores de esgotamento. Apesar da crise ecológica, a “teologia do crescimento” continuou dominando o pensamento social e a prática política; e as críticas ao crescimento como vetor do progresso humano continuam sendo denunciadas como gestos de insanos.
O mundo atual não tem estadistas porque os políticos estão divididos entre aqueles prisioneiros da lógica do impossível crescimento econômico ilimitado e para todos, e aqueles considerados “lobotomizados”, porque apresentam alternativas de outro futuro, negando as bases filosóficas e econômicas da civilização industrial.
A nova encíclica do Papa Francisco traz um raio de luz para o debate sobre o futuro desejado e possível para a humanidade. Sua fala vai provocar uma luz na escuridão do debate político no mundo de hoje. Ainda mais: ele oferece uma “teologia da harmonia” para substituir a “teologia do crescimento”.
Com sua encíclica, o Papa Francisco se sintoniza com a crise civilizatória e humanitária — desequilíbrio ecológico, divisão social, migração em massa, desemprego, violência, intolerância — e propõe a necessidade de construirmos uma nova civilização, na qual o crescimento seja um instrumento, mas não o propósito em si; e o decrescimento na produção em alguns lugares e para certas camadas da sociedade passe a fazer parte das estratégias de evolução humana.
Com sua autoridade moral, ele contribui para que o debate não mais seja entre o socialismo, que não deu respostas, e o capitalismo, que deu respostas erradas, mas entre a civilização regida pela “teologia do crescimento” e a civilização orientada pela “teologia da harmonia” entre os seres humanos e destes com a natureza que os sustém.
(*) Senador pelo PDT-DF