Podemos ser amigos simplesmente, amigos simplesmente e nada mais. A canção de Fernando Lobo – sim, Fernando Lobo, Caetano só emprestou voz e interpretação vinte anos depois, o que, aliás, está longe de ser “só”, sempre me tocou. Sempre achei linda e triste. E tem coisa mais triste do que a morte de um amor? Por certo que não. Mas os anos foram passando e discordo frontalmente da letra. Veja bem: da letra, apenas.
Amigos simplesmente! Eis o início, ou o reinício, de um amor. Não acredito em “amor fast food”. Antes que me chame de antiquada, por favor, não há postura mais vanguardista que acreditar em um amor que seja de verdade. Intenso. Tenso. Amor e seus inúmeros clichês. Afinal, amor sem clichês não é amor.
A vida sem esse “amigo” é um enorme vazio. Vazio profundo e cruel como só o silêncio da solidão de um amor pode ser. Lâmina afiada que encerra qualquer desejo. Desejo por outro, desejo por si. Desejo de postar-se de pé e ir ao trabalho, ao cinema ao supermercado, à academia, ao salão de beleza, ver amigos.
Amigo-amor
Tudo se torna terrivelmente difícil, chato e pouco convidativo quando falta “ele”, o amigo-amor. Podemos ser amigos simplesmente. Já começo a gostar novamente da letra. Ando um tanto bipolar ultimamente, mas isso fica pra outra hora.
Como ia dizendo, voltei a gostar da letra. Amigos simplesmente! Sem complicações, sem uma carta de recomendação, sem um chek-list do que se espera para que o candidato a “amor da sua vida” deva cumprir para que esteja apto a ingressar neste projeto chamado “para sempre”.
Uma dose de simplicidade, por favor! Lembra do Beto, do Joaquim, do Pedro? Então! Melhor jogar essa sua lista na gaveta e tratar de ser feliz. Ou melhor, de estar feliz. Estou especialmente cuidadosa com as palavras hoje. Mania essa nossa de “ser”.
Já sei: as aspas estão te entediando. Mas, ao menos por hora, não dá pra gesticular pra você (que no fundo é o que eu gostaria, com movimentos agudos como os de um italiano).
Nota promissória
Ser é uma espécie de nota promissória, de dívida para os mais novos, que assinamos e passamos a nos apegar de forma tão doentia que passamos a não nos permitir ter momentos em que, como diria uma psicóloga amiga minha, que a gente “está coisado”. Exijo meu direito de estar “coisada”! Antes coisada que presa à obrigatoriedade de ser feliz.
Quero momentos felizes. E, se possível, ter esse amigo-amor do lado. E quero o pacote completo, incluindo o futebol, os dias ruins, a cara feia, a falha, o erro. Acho que as pessoas de verdade são assim, um pacote completo. É preciso querer o príncipe e tolerar o sapo. Os dois são a mesma criatura.
Simplicidade
Amigos, simplesmente, nada mais. O resto, todo o resto, está embutido nessa amizade profunda e sincera chamada amor. Piegas? Pode ser. Mas se te faz feliz, é o que importa. Abaixo às convenções!
E, para encerrar esta nossa conversa, que está para lá de Marraquesh (estou com Caetano na cabeça hoje), eu te desejo olhos mansos e tolerantes com o seu amor. E te desejo mais: te desejo que seu amor seja simplesmente seu amor.
(*) Escritora