O ex-governador da Bahia e chefe da Casa Civil da Presidência da República, Rui Costa, perdeu uma ótima oportunidade para ficar calado. Ao disparar sua metralhadora giratória contra Brasília, de uma só tacada jogou no colo do presidente Lula o imbróglio do Fundo Constitucional do DF e deu uma tribuna para Ibaneis Rocha (MDB).
De quebra, o ministro empoderou a oposição na defesa de Brasília, e se equiparou a bolsonaristas como o ex-deputado (hoje presidiário) Daniel Silveira (PSL-RJ) – aquele que rasgou a placa da Rua Marielle Franco – e o ex-deputado Marcelo Calero (PSD-RJ), atual secretário de Cultura do Rio de Janeiro, que propugnam a devolução da condição de capital para o Rio de Janeiro, ou, no caso de Costa, para Salvador.
Até aqui, a conta das mudanças do FCDF estava sob responsabilidade do Parlamento, uma vez que o projeto enviado pelo governo Lula em nada alterava o Fundo. Essa foi uma iniciativa do relator Claudio Cajado (PP-BA), com respaldo de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, ambos do mesmo partido. Costa, contudo, vai permitir o surgimento de uma nova narrativa que já está sendo explorada pelas redes sociais. Vale lembrar que na política baiana Cajado e Costa saboreiam juntos um acarajé sem nenhum constrangimento.
“Ilha da fantasia”
Em Itaberaba (BA), Rui Costa chamou a Capital de “ilha da fantasia”. Um sentimento antiBrasília semelhante ao prolatado pelo ex-ministro da Educação de Jair Bolsonaro, Abraham Weintraub, para quem seria preciso “acabar com essa porcaria que é Brasília, um cancro de corrupção, de privilégio (…). Eu tinha uma visão negativa de Brasília e vi que é muito pior do que eu imaginava”.
Ao afirmar que a localização de Brasília “fez muito mal ao Brasil”, por afastar os congressistas da “vida das pessoas”, demonstra total falta de conhecimento da geopolítica brasileira e reafirma uma postura ultrapassada de um Brasil litorâneo. Esquece que o local foi estudado por séculos a fim de assegurar a integração nacional, a integridade territorial da Nação e impulsionar o desenvolvimento para outros rincões.
De Brasília para o Pantanal, para a Amazônia ou para os Pampas, é muito mais perto do que do Rio de Janeiro ou de Salvador. A própria Bahia, em especial a região Oeste, se beneficia de Brasília para crescer. Além de contar com as facilidades para os estudos e tratamentos de saúde dos moradores desse imenso sertão veredas, nem sempre disponíveis por lá.
Salva-vidas
As palavras do chefe da Casa Civil caíram como uma boia salva-vidas para os plantonistas do Buriti. Ibaneis Rocha ressurgiu com todo folego para taxar Rui de “idiota completo”. Sua vice, Celina Leão (PP), que na votação da proposta de arrocho no FCDF estava na Florida, circula agora com mais energia pelos gabinetes do Senado, onde a proposta ainda será votada.
O ministro conseguiu que distritais até do PT-DF se voltassem contra a postura dele. Para que os cristais não se quebrassem ainda mais, Chico Vigilante mediu os termos e chamou de “palavras infelizes” a verborragia de Rui Costa, e Ricardo Vale disse que o chefe da Casa Civil precisa sair da Esplanada, conhecer a cidade antes de tecer comentários desvalorizadores de Brasília.
Na Câmara Federal, no mesmo tom, Erika Kokay (PT-DF) afirmou que o ministro desconhece a capital brasileira. “Se existe uma ‘ilha da fantasia’, ela é habitada justamente por quem só consegue enxergar aqui tapetes e gabinetes. Já passou da hora de pararem de associar os erros da classe política à nossa cidade […]. Para o cidadão, não tem “ilha da fantasia”, mas sim problemas de Saúde, Educação e Segurança. É obrigação dos ministros conhecerem a importância da capital do Brasil para o desenvolvimento do Centro-Oeste e de todo o País”.
Gasolina na fogueira
No início do governo, Rui Costa era apontado por alguns colunistas de política como uma pessoa jeitosa, capaz de aparar arestas e construir consensos. Não é o que transparece agora. Jogou gasolina na fogueira. Mas ao trazer para a frente do palco o debate do FCDF, ele talvez tenha ajudado a cidade pois, de um lado, Lula se verá instado a entrar nesse tema e, de outro, fará com que a oposição, em especial o Centrão – que na Câmara votou contra o FCDF –, tome uma postura diferente e assuma a defesa da Capital Federal.