O ano de 2020 ficará marcado como um período de dificuldades e de retrocessos. De um lado a pandemia do novo coronavírus, com mais de 200 mil mortos. Do outro, um governo com políticas antipovo, que aprofunda os efeitos da pandemia, ao mesmo tempo que se utiliza dela para implementar projetos ultraliberais que prejudicam justamente os que mais precisam.
Uma política que inacreditavelmente vem sendo seguida por governos estaduais e do Distrito Federal. A reforma da Previdência é um dos pontos centrais. Essa lei já causou uma série de estragos e ainda pode gerar outros graves danos para o funcionalismo público distrital.
Depois de ter tirado do bolso dos servidores públicos do DF valores vultuosos, com o reajuste da alíquota previdenciária, a reforma da Previdência deixou em aberto as mudanças nas regras de transição para aposentadoria.
Em dezembro, a Agência Brasília publicou que o presidente do Instituto de Previdência dos Servidores (Iprev-DF), Ney Ferraz Júnior, disse que “para os servidores públicos do DF, nada muda no que diz respeito aos critérios para aposentadoria”.
A fala é no mínimo maliciosa. De acordo com o advogado do Sinpro-DF, Lucas Mori, a qualquer momento o Executivo local pode enviar à Câmara Legislativa um novo projeto aumentando a idade e o tempo de contribuição para se aposentar. “Aqui, tudo pode piorar”, diz.
O alerta não é desprovido de razão. Na ideia original do governador Ibaneis Rocha, além do reajuste da alíquota previdenciária de 11% para 14% e a inclusão da maior parte dos aposentados no rol de contribuintes, também estava previsto a incorporação de todo regramento realizado em âmbito federal para aquisição do direito à aposentadoria, como ampliação da idade e do tempo de contribuição.
“Com uma série de mobilizações virtuais, material de rua e muita articulação com parlamentares, o Sinpro, junto com representações de outras categorias do funcionalismo e a CUT-DF, conseguiumudar esse cenário e convencer os parlamentares a não aceitarem essa mudança de regra. Não conseguimos número suficiente para barrar o aumento da alíquota, mas evitamos a alteração do tempo e da idade para aposentar”, afirma o diretor do Sinpro, Cléber Soares, membro do Conselho de Administração do Iprev.
Segundo ele, diante do risco iminente de o GDF retornar com a pauta da alteração da idade e do tempo de contribuição, “é fundamental manter a mobilização, a luta, com disposição de participar das atividades das entidades de classe, para evitar outro movimento que subtraia mais direitos trabalhistas e previdenciários”.
Revogação
A revogação da reforma da Previdência no DF é algo possível. Entretanto, o contexto político imposto torna essa via tortuosa. No campo da institucionalidade, há duas possibilidades de pôr abaixo as alterações impostas pela reforma da Previdência.
A primeira delas depende da iniciativa do próprio governador, que poderia apresentar à Câmara Legislativa novo projeto de lei superando a proposta. “Isso,por si só, já é um problema, pois foi o chefe do Executivo que defendeu e apresentou a reforma da Previdência no DF”, lembra o advogado do Sinpro, Lucas Mori.
Mais que simplesmente apresentar o projeto de reforma da Previdência à Câmara Legislativa, Ibaneis foi um dos principais articuladores do governo Bolsonaro para a aprovação da reforma. Ele liderou várias reuniões com governadores para emplacar o projeto nos estados brasileiros.
A segunda possibilidade de revogar a reforma da Previdência seria via Judiciário, com o Tribunal de Justiça do DF e Territórios se posicionado contra a lei. Oargumento seria de existência de vício (o que macula o negócio jurídico) na legislação. “Por mais que o TJDFT derrube a lei, isso vai para o STF. Reformas de outros estados já chegaram ao Supremo e a tendência tem sido de que elas sejam mantidas”, contextualiza Mori.
Para o diretor do Sinpro, Cléber Soares, a reforma da Previdência “é um dos pilares da política econômica devastadora do governo Bolsonaro”, sustentáculo,inclusive, da Emenda Constitucional 95, que implementa teto de gastos para setores estruturais, como a educação. Sua revogação, portanto, exige a atuação intransigente e unificada dos trabalhadoresno campo político.
“A revogação da reforma da Previdência é possível, mas depende da capacidade de mobilização e unidade da classe trabalhadora para produzir a luta permanente que se faz necessária”, avalia o dirigente sindical.
Luta ontem, hoje e sempre
Mesmo diante da complexidade da revogação da reforma da Previdência, o Sinpro-DF vem fazendo todos os esforços para pôr abaixo um dos projetos mais severos do governo federal replicado pelo GDF.
“Nós do Sinpro, da CUT e demais entidades da classe trabalhadora continuamos discutindo com os parlamentares da Câmara Legislativa a possibilidade de avançarmos na discussão da reforma da Previdência, evitando que os prejuízos sejam ampliados com o retorno do debate das regras de aposentadoria, e também para tentar reverter a alteração das alíquotas, principalmente a imposta aos aposentados”.
De qualquer forma, o debate no DF tem relação muito forte com o debate na esfera federal. “Por isso, se não alterarmos a reforma da previdência na esfera federal, fica muito mais difícil alterar no DF qualquer item dela”, reforça Cléber Soares.
Vitórias na Justiça
Além da luta no campo político, o Sinpro-DF e sindicatos que representam os servidores públicos do DF também vêm atuando no campo judicial, onde já obteve algumas vitórias. A primeira delas foi ainda no início da discussão da implementação da reforma da Previdência no DF.
Por meio de mandado de segurança distribuído ao Conselho Especial do TJDFT, foi garantida liminar que proibia o GDF de implementar o reajuste da alíquota previdenciária sem que o tema passasse pela Câmara Legislativa.
Isso não só garantiu que o desconto da alíquota previdenciária reajustado fosse feito precocemente, como, principalmente, garantiu que a idade para aposentar e o tempo de contribuição não fossem implementados no DF naquele momento.
Recentemente, uma ação direta de inconstitucionalidade, também distribuída ao Conselho Especial do TJDFT, questionando como um todo a reforma da Previdência no DF, impetrada pelo conjunto de entidades representativas do funcionalismo público local, expõe a ausência de respaldo técnico para a implementação da reforma no DF, além do confisco realizado contra servidores aposentados. A ação está em apreciação.