Maria Carla
Uma aula pública realizada pelo Sinpro, numa roda de conversa no Centro de Ensino Médio (CEM 09) de Ceilândia, sobre racismo estrutural e misoginia. A atividade de conscientização ocorreu após um estudante daquela escola “presentear” uma professora negra, no Dia Internacional da Mulher, com um pacote de palha de aço de lavar louça com o propósito de discriminar e humilhar, conforme revelaram os vídeos veiculados na Internet.
Promovida pelas Secretarias de Raça e Sexualidade e de Mulheres do Sinpro, em conjunto com a Frente de Mulheres Negras do DF, “a aula pública abordou o histórico do Brasil, construído em cima dos conceitos do patriarcado, do racismo e de como essa violência pode ser sutil a ponto de a pessoa, muitas vezes, nem perceber que está sendo vítima de uma atitude misógina e racista”, afirma Márcia Gilda, coordenadora da Secretaria de Raça e Sexualidade do Sinpro.
Para contrapor o presente ostensivo do estudante, o sindicato presentou todos os e as docentes da escola com o caderno “É preciso ser antirracista”, lançado em 2022 para ser material de apoio nas práticas pedagógicas de enfrentamento e combate ao racismo na rede pública de ensino do DF.
O caderno segue as diretrizes do Artigo 2ª da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e da Lei nº 10.639/2003, que, há 20 anos, incluiu o ensino de história e cultura afro-brasileiras nos currículos oficiais da educação do País. A publicação será usada no planejamento pedagógico.
Pôr a lei em prática
A direção da escola se colocou à disposição para receber o Sinpro e envolveu toda a comunidade escolar na atividade. Márcia Gilda conta que as estudantes se sentiram ofendidas e perceberam a atitude misógina e racista na ação do colega porque a palha de aço trouxe a dupla mensagem de que a professora negra não deveria estar ali exercendo sua profissão acadêmica, e sim em casa, lavando louças.
“Ele poderia ter usado qualquer outro objeto de uma casa, mas ele usou o Bombril, um objeto simbólico na perspectiva de que, durante muito tempo, o Bombril foi utilizado para ridicularizar as pessoas negras pela tentativa de associá-lo ao cabelo afro. Trata-se de crime de racismo, porque atingiu e ofendeu a toda uma coletividade”, explica a diretora do Sinpro.
Na avaliação dela, o que falta para o Brasil vencer o racismo estrutural e reestruturar esse tema de forma plena, que respeite a diversidade de gênero e de raça, é de fato, pôr a lei em prática. “É a nossa sugestão e é pelo o que lutamos. Infelizmente, a educação antirracista ainda está na perspectiva da pedagogia de projeto. A gente precisa fazer com que a lei seja cumprida em todos os espaços sociais e prevista no próprio projeto político-pedagógico da escola, porque a educação é a chave que muda essa consciência. É a porta de entrada de transformação da sociedade”.
Empoderamento – A diretora afirma, também, que quando a escola trabalha esse tema efetivamente, consegue mudar essas consciências. “Infelizmente, nos últimos seis anos, deu entrada no Brasil o empoderamento do racismo, da homofobia, da misoginia e da xenofobia. Assim, algumas atitudes que a gente tinha conseguido dar uma parada, fazer com que as pessoas começassem a pensar um pouco mais antes de cometer, voltaram a ocorrer. Essas pessoas passaram a se sentir empoderadas no sentido da discriminação”.
Evento agregador
Mônica Caldeira, coordenadora da Secretaria de Mulheres do Sinpro e representante do Movimento de Mulheres do DF, avalia que o evento foi muito agregador e envolveu o movimento negro, o Sindicato, os estudantes, os(as) professores(as), a direção da escola, e que todos(as) participaram do debate acerca da importância de uma educação de combate ao racismo.
Ela conta que fez um breve relato histórico até chegar ao movimento de mulheres. Houve também apresentações musicais do movimento negro e de mulheres. “Cantamos músicas sobre o empoderamento feminino e foi muito bom. Tivemos a participação dos(as) estudantes com uma ciranda. Os(as) professores(as) consideraram a realização do evento nessa temática, com a presença do Sinpro, muito importante, e que ajuda a escola na dinâmica do processo pedagógico, trazendo pessoas de fora para abordar as questões em foco.
Ela explicou que abordou o tema pelo viés do estereótipo da mulher e a sua condição de cuidadora e doméstica porque o gesto do estudante tem o viés de que o Bombril, no Dia Internacional da Mulher, passa a mensagem de que a professora só serve para lavar louça, além da discriminação do cabelo afro.
“Por isso, foquei minha fala na estereotipação da mulher e expliquei que um grupo é marginalizado pelos traços físicos e que é por isso que não podemos admitir bullying, zoação com características físicas, porque há nisso um contexto histórico”, finalizou.