Antes de mais nada, preciso confessar que estou apavorado. Com o Coronavírus? Sim. Porém, me assusta muito mais a ignorância. Estamos, desafortunadamente, sujeitos a contrair uma doença evitável, mas que não depende apenas de nós construir as barreiras para conter o avanço do agente transmissor. E é aí que reside o perigo.
A Nação Brasileira está nas mãos de um sujeito que escapou de uma facada e crê, piamente, que não será “uma gripezinha” que o derrubará. O “Cavalão”, em conversa digna de uma fábula, declarou ao Ratinho que os governadores e prefeitos não poderiam proibir cultos e missas. Para ele, pastores e padres são capazes de evitar a transmissão do “bichinho invisível”.
A desinformação do comandante-em-chefe contamina seus liderados para além das redes sociais, onde impulsionam suas crendices com o auxílio de robôs. Na tarde deste sábado (21), precisei sair de casa para resolver um problema.
Fiquei deprimido com o pequeno movimento nas ruas. Curto o agito das metrópoles – bares, restaurantes, cinemas, teatro, bate-papo com os amigos. Ônibus e metrô circulavam quase sem passageiros.
Faço meu trajeto por avenidas quase desertas, dirigindo em baixa velocidade. Com os vidros abertos, observo que a monotonia que me incomoda não é unânime. Cruzo Ceilândia de Sul a Norte à média de 40 Km/h.
Ouço ruídos vindos de oficinas mecânicas. Em duas delas, com as portas baixas, homens trabalham consertando carros. Mais adiante, vozes de pessoas discutindo. Numa birosca, um punhado de gente curte o happy hour regado a cachaça e cerveja. O recinto está com as grades cerradas.
Sigo em frente. Uma família de dois adultos e duas crianças faz caminhada pela calçada. Atrás deles, “atletas” correm em sua malhação inadiável. Na porta de uma casa mais adiante, amigos confraternizam enquanto o rapaz “dá o trato” no carro com o qual, provavelmente, dará o rolê da noite com a gata. Padarias e supermercados lotados. Uma festa!
Volto pra casa abatido, desencantado da vida, como escreveu Paulo Vanzolini em sua “Ronda”. Não sinto a dor de corno do brilhante compositor. Doi-me profundamente a constatação de que os prognósticos pessimistas do ministro Mandetta, a quem o Presidente parece não dar ouvidos, possam estar subestimados.
Concluo que, se depender da consciência de boa parte de nossos irmãos brasileiros, o Coronavírus vai galopar solerte por todos os rincões deste “país tropical abençoado por Deus” cantado por Jorge Ben Jor. E o comandante-em-chefe, que deveria ter as rédeas nas mãos para conter o seu avanço, será a montaria.
E não haverá padre nem pastor que conseguirá convencer Deus a nos salvar. Seremos, inapelavelmente, vítimas da santa ignorância de nossos concidadãos e de seu líder desvairado.