Diretora do Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF), Márcia Gilda diz, em entrevista ao Brasília Capital, que a categoria começa o ano mobilizada em busca da recuperação do poder aquisitivo perdido desde 2019. “Temos conversado com o GDF e esperamos o devido respeito e acolhida à nossa pauta”, afirma.

Que número mágico é este 19,8% de reajuste salarial que o Sinpro cobra do GDF? De onde vem esse percentual? – A gente não tirou esse índice da cartola. Esse 19,8% foi calculado a partir da análise das perdas salariais desde 2019 até o início de 2024. Nós passamos um longo período com os salários congelados. Só começamos a retomar a valorização a partir da greve de 2023, com a incorporação da Gaped [Gratificação de Atividade Pedagógica] e dos 18% concedidos de forma geral para todos os servidores públicos do DF. Esse 19,8%, portanto, é do período em que nós não tivemos reajuste.
Outro número martelado pelo Sindicato é a chamada Meta 17. O que ela significa? – É a meta do Plano Distrital de Educação que trata da valorização da carreira do magistério. Ela traz a importância da equiparação do salário dos professores e professoras, orientadores e orientadoras educacionais com a média dos outros concursos em nível superior.
Então, para o Sinpro, 2025 começa como 2024 terminou: na luta por melhoria salarial para a categoria… – Não somente isso. A ideia é trazer, agregado à reformulação dos salários, a reestruturação da carreira.
Nesta reestruturação está incluída a redução da proporcionalidade do número de professores temporários em relação aos concursados? – Sem dúvida. A gente tem duas realidades hoje nas escolas. São dois tipos de profissionais extremamente qualificados – porque o professor temporário entra a partir de um processo seletivo, que é um concurso simplificado para contrato temporário. Só que ele não tem os mesmos direitos de um efetivo. A gente entende que foi uma opção, ao longo do tempo, dos diversos governos, em priorizar a contratação temporária, em detrimento do acesso pelo concurso público.
Qual a porcentagem de temporários hoje na rede pública do DF? – Quase 60% da rede é composta por professores e professoras em regime de contratação temporária. Isso cria um abismo com relação à questão dos direitos. É uma forma de precarizar o trabalho. No acordo de greve de 2023, conseguimos a nomeação de todas as vagas imediatas e do cadastro reserva. No ano passado, a gente teve mais de 4 mil nomeações. Mas temos ainda muitos concursados do certame de 2022 no banco de excedentes, que nós pactuamos de não chamar de excedente, porque excedente é o que está passando. E hoje faltam profissionais concursados.
Qual é a diferença dos direitos entre um professor concursado e um temporário? – O professor efetivo tem uma amplitude de direitos. Ele tem, dando um exemplo clássico, a licença de acompanhamento do filho. O temporário não tem. Se o seu filho estiver doente, internado, e você for a única pessoa que cuida dele, ele vai ficar sozinho ou você vai ter que conseguir alguém para acompanhá-lo no hospital, porque você não pode se ausentar do trabalho. Esse é justamente um dos pontos de 2023, que estamos acompanhando na mesa permanente de negociação para que se efetive.
Além da questão da aposentadoria… – Exato. Impacta diretamente na aposentadoria, porque são regimes de contribuição diferentes. O professor temporário contribui para o regime geral, o INSS. O efetivo é estatutário. Acaba que vai chegar o momento, se continuar essa escalada crescente de professores temporários, que vai impactar diretamente no direito à aposentadoria.
Outro tema que afeta os professores é a saúde mental. O que o Sinpro tem feito neste sentido? – A gente tem o acolhimento aos professores e professoras. Tem uma clínica do trabalho. E fazemos atividades nas escolas acerca do assédio moral e da saúde mental. O Sinpro também atua na frente negocial e cobra que a Secretaria de Educação dê melhores condições. De 2019 para cá, a estratégia de matrícula aumentou em torno de 60%. Tínhamos conseguido muitos avanços, como ter uma turma de anos iniciais, por exemplo, do BIA [Bloco Inicial de Alfabetização], com no máximo 22 alunos, e hoje está chegando a 30 alunos. O próprio acesso à educação tem sido negado, uma vez que a gente não consegue reduzir o número de estudantes para entregar melhor educação aos alunos PCDs.
Seis anos após a implementação das escolas cívico-militares no DF, qual a avaliação do Sinpro quanto a esse modelo? – A gente ainda avalia o projeto como retrocesso. Até porque a violência não é um produto construído na escola. A violência, às vezes, pode chegar à escola e ter essa visibilidade, mas ela acontece antes de chegar à escola. Mais importante do que militarizar uma escola, seria a presença do Batalhão Escolar, dentro e fora da escola. Há alguns anos, ficava uma dupla todos os dias. Só a presença do policial ali já intimida e cerceia qualquer má intenção. Tanto de quem está dentro da escola quanto de quem está fora. A quantidade, hoje, de policiais nessas escolas militarizadas daria para cobrir unidades que realmente estão em áreas de vulnerabilidade social.

Qual é a disposição do Sinpro para negociar com o governo e o limite para que não haja greve? – Costumamos dizer que, para o movimento paredista, a greve é o último instrumento. Eu posso dizer que a categoria está muito desencantada, desesperançada com o governo. Em 2023 foi que a gente conseguiu, finalmente, abrir uma mesa de negociação. Estava muito travado. E abrimos em um momento de negociação pré-assembleia, em março de 2023. Continuamos essa negociação com a mesa permanente para os pontos de suspensão de greve. Somente em setembro do ano passado que foi aberta uma mesa específica para discutir a reformulação do plano de carreira e esse índice linear de 19,8%. Foi criado um grupo de trabalho (GT), publicado em Diário Oficial. Estaremos em assembleias regionais e apresentaremos esse plano de carreira para a categoria. O que esperamos é o devido respeito e acolhida do governo a uma pauta que é nossa e que é importante.
E essa demanda da categoria, na sua opinião, tem recebido a acolhida do governo? – A mesa foi aberta. Agora, fazer uma avaliação sobre essa acolhida, basta dizer como se deu o processo da semana pedagógica, que na véspera, depois que o Sinpro chamou um ato, é que o governo se propõe a assinar a [participação de professores temporários na] semana pedagógica. Somente a luta é que garante essa disposição do governo em atender às nossas demandas. E se tem uma coisa que essa categoria sabe fazer, é lutar.
Portanto, só pra variar, 2025 será mais um ano de luta para os professores… – O Sindicato dos Professores marca a luta de todos os trabalhadores, sejam da carreira do magistério ou não. A diretoria do Sinpro é escolhida para apontar o caminho, para dialogar com a categoria. E é essa unidade que vai garantir cada passo nosso rumo às assembleias regionais e à nossa Assembleia Geral, marcada para 27 de março. A mensagem que quero deixar é essa: a unidade é primordial para que a gente alcance êxito na luta de 2025.
O ano letivo começou esta semana com a proibição do uso do celular nas escolas. Os professores estão preparados para cumprir essa nova regra? – A gente começa 2025 com esse grande desafio. No DF, já temos uma lei que restringe o uso de celulares em sala de aula desde 2008. No entanto, ela nunca foi implementada. Agora, temos o reforço de uma lei federal que impacta, inclusive, na saúde mental, por conta do uso excessivo de telas, que atrapalha a aprendizagem e o processo de socialização dos alunos e alunas. Eu acho que preparar a inteligência interpessoal nesse novo milênio é extremamente importante.
Como pedagoga, você considera que a educação é valorizada no Brasil e em Brasília, especificamente? – A educação é um dos principais pilares de uma sociedade mais participativa, mais crítica. E a gente transforma a sociedade com a criticidade. A educação deveria ser mais valorizada, mas infelizmente não é. Nós tivemos o Plano Nacional de Educação, depois o Plano Distrital de Educação, que trazia diversas metas voltadas para a formação profissional, para o investimento na educação e para a remuneração dos professores. Infelizmente, não tivemos, ao longo desse tempo, as metas do PDE implementadas, o que seria muito importante para a valorização do professor e dos nossos estudantes.
O Sinpro tem participado das discussões do novo Plano Nacional de Educação que está em debate no Congresso Nacional? – Nós estamos sempre em discussão com a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). A gente faz esse debate a partir do Fórum Nacional de Educação e do Fórum Distrital de Educação, presidido pelo professor Júlio Barros, que é diretor do Sinpro. Estão acontecendo as discussões das subcomissões e já estão sendo produzidos relatórios. Nós teremos uma série de reuniões regionalizadas para que haja participação de todos os professores e professoras. Vamos fazer essa interação com a CNTE, que é a nossa porta-voz junto ao Congresso Nacional.
O Sinpro vê com bons olhos o programa Mais Professores, do governo federal? – Sim. A gente recepciona de forma muito positiva. Hoje, existe uma pesquisa do apagão da educação com relação aos professores, à carreira do magistério. Essa política pública vem como importante incentivo para que mais jovens se interessem pela Pedagogia, História, Filosofia, Matemática. Então, é um incentivo importante, mas que não pode ficar apenas com isso para o ingresso na universidade. Precisa ter também o desenvolvimento de políticas públicas de valorização dos professores e professoras.