Rennê Fabian Ferreira de Sousa tem o mesmo sonho de milhares de jovens da periferia de um dia usar o próprio talento para dar conforto para a família. Muitos se dedicam a esportes, especialmente o futebol, e outros tentam se destacar nas artes. Renê enveredou pelo caminho da música.
Mas ele destoa da maioria dos talentos de lugares com o mesmo perfil do Sol Nascente, de Ceilândia, cuja população, somada à do Pôr-do-Sol, logo ali ao lado, forma a maior favela horizontal do Brasil.
Mesmo convivendo com esse cenário típico de outros lugares do País, como a Rocinha, no Rio de Janeiro, comandada por facções criminosas e assolada por altos índices de violência, Rennê não seguiu a linha de renomados músicos da cidade de retratar esse clima beligerante e, em certa medida, caótico de Ceilândia em letras empacotadas com o mesmo ritmo: o rap.
Este foi o caso de grupos e artistas como Câmbio Negro, Álibi & DJ Jamaika, Gog, que não esconderam o ódio e o desprezo ao “sistema”. Rennê, ao contrário, ignorou essa paisagem de guerra urbana.
Inspiração – Suas letras exalam apenas um sentimento: o amor. Num embalo que oscila entre o “Pop Rock” e o “Folk” – é como ele se define – o músico ceilandense se declara para uma inspiração que o ajuda a compor: a namorada Jéssica Tavares.
Ela é tão presente nas composições do aspirante a músico profissional que, até para homenagear os 60 anos de Brasília, completados no ano passado, ele conseguiu inserir a moça na letra:
“Brasília faz 60 anos/ Mas meu presente é você/ Agradeço JK (Juscelino Kubitschek) e Oscar/ Por fazer nossa história acontecer”. O trecho é da canção que ele ainda nem colocou o nome, embora já tenha divulgado nas redes sociais e tudo.
Fã ilustre – Aliás, naquele sítio eletrônico que a música ainda sem nome ganhou repercussão em todo o Distrito Federal e mundo afora. Principalmente após ser impulsionada pelo comentário de uma fã para lá de ilustre: a primeira-dama do Brasil, Michelle Bolsonaro.
A mulher do Presidente da República, Jair Bolsonaro (Sem Partido), escreveu: “Parabéns, primo. Dupla comemoração. Deus te abençoe”, escreveu ela, que se identifica no Instagram como “michellebolsonaro”.
A primeira-dama é sobrinha de Ângela Maria Firmo Ferreira, mãe de Rennê e de Kelvin Firmo Santana, que morreu recentemente. Ângela é irmã de Maria das Graças Firmo Ferreira, irmã da mãe de Michelle.
Segundo Rennê, a primeira-dama anda meio afastada da família depois que foi morar com o marido. Mas ele se lembra que os dois costumavam brincar horas a fio nas ruas de Ceilândia quando a prima ainda era solteira. “Quero que ela tenha orgulho de mim”, diz, se referindo a Michelle.
Sobrevivência – Por enquanto, Rennê ainda não vive da música e se sustenta trabalhando como vidraceiro, vendedor ou segurança, profissões que aprendeu na busca pela sobrevivência.
Ele não sabe quantas letras já escreveu. Acha que dezenas, mas não tem certeza. Por enquanto, gravou apenas duas músicas: Contanto Estrelas e Namora Comigo, ambas publicadas nas redes sociais.
Enquanto as canções não decolam nas paradas de sucesso, o morador do Sol Nascente vive do jeito que o sambista Zeca Pagodinho recomendou para seus fãs: deixando a vida o levar. “Dou uma palhinha num show de um amigo aqui, outra acolá. Uma hora a minha música explode”, acredita.
Noticiário policial
Esta, provavelmente, seja, até agora, a primeira reportagem envolvendo a parte da família materna de Michelle fora do noticiário policial. Em agosto de 2019, o Brasil ficou estarrecido com a revelação da reportagem do portal Metrópoles, de autoria dos jornalistas Ary Filgueira e Mirelle Pinheiro, acerca da família da primeira-dama.
Os dois repórteres descortinaram um lado do clã Firmo Ferreira que parecia constranger Michelle: o envolvimento de alguns entes com a Justiça. Um tio foi condenado em 2018, por estupro, a 14 anos de prisão. Outro encontrava-se preso preventivamente por suposto envolvimento com a milícia.
Maria das Graças foi indiciada por falsificação de documento. Segundo a reportagem do portal, ela está inscrita em programa habitacional do Governo do Distrito Federal com um RG emitido em Goiás que contém informações adulteradas, como o nome Mirele das Graças Firmo Ferreira. Pior: com esse documento falso, Mirele, ou Maria das Graças, registrou os três irmãos de Michelle.
A avó materna da mulher de Bolsonaro cumpriu pena por tráfico de drogas nos anos 1990. Em 12 de agosto do ano passado, ela morreu vítima de covid-19.
Quem sabe, a próxima matéria sobre a “família real” seja debaixo do guarda-chuva de Cultura, falando do músico brasiliense chamado Rennê Fabian, que saiu do Sol Nascente e passou por cima de todas as barreiras, inclusive a indiferença do lado rico do clã, para emocionar o Brasil falando de amor!
Saiba mais
De acordo com a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad), divulgada em 2013 pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), Sol Nasente e Pôr-do-Sol possuíam 78.912 moradores, contra 69.161 habitantes da internacionalmente famosa Rocinha (RJ). Além disso, a pesquisa também revelou que os piores indicadores estavam ali: apenas 6,1% das residências são ligadas à rede de esgoto. A cidade tem altos índices de violência, delinquência juvenil, tráfico de drogas.