No fim da tarde da quarta-feira, 23 de julho de 2014, a seleção brasileira de brasileiros geniais perdeu um dos seus titulares. Ariano Suassuna, paraibano de Itaperuá e pernambucano pelo destino, estava debilitado por um AVC hemorrágico quando sofreu uma parada cardiorrespiratória e não resistiu. Aos 87 anos, o senhor de voz “feia e baixa e fraca e rouca”, que já foi tudo “até advogado” se despediu do palco, mas não do público. Pois deixa sua obra imortal.
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Durante 48 horas, segundo os jornais, Ariano morria e ressuscitava. Até grandes veículos e respeitados colunistas chegaram a cravar a morte do escritor paraibano antes que ela acontecesse. Mais ansiosos que o próprio Suassuna, que nunca teve problema com a morte. Chamava-a carinhosamente de Caetana. “No sertão do Nordeste a morte tem nome, chama-se Caetana. Se ela está pensando em me levar, não pense que vai ser fácil, não. Ela vai suar! Se vier com essas besteirinhas de infarto e aneurisma eu tiro de letra”, disse ele, em dezembro de 2013, durante a retomada de suas aulas-espetáculo.
Ficou entre os fãs apenas a vontade de saber como Suassuna relataria o episódio de sua morte. Super-anunciada, quase não concretizada e tão sentida. Ele mesmo dizia que “o povo brasileiro faz piada com tudo, até com a gente mesmo fazemos chacota”. O que será que ele falaria da sua própria morte (ou não morte)? A pergunta fica. Mas a certeza é que Ariano cumpriu seu papel. Ele mesmo dizia “minha missão é amar”. E quem dirá que ele não conseguiu?
Resta saber quem se habilitará a contar o causo sobre a última viagem do grande Suassuna. Não acredito em texto algum que surja neste momento de exposição do escritor. Ele exigia que não se tivesse pressa para escrever. O romance d’A Pedra do Reino, por exemplo, levou 12 anos para ser concluído. Redigir algo que deveria ter a assinatura de Suassuna e foi vivido pelo próprio não deve ser finalizado com tanta agilidade. Ainda que tenham até “matado-o” em busca de furos e picos de audiência.
Tediosa ou fatal
Em abril deste ano, Ariano esteve em Brasília para ser homenageado na Bienal do Livro e da Leitura da capital. No aeroporto JK, quando esperava o vôo de volta a Recife, ele foi vítima da tecnologia que tanto temia, ao ser fotografado deitado no chão do saguão de embarque. Nada de novo, se o fato não tivesse sido registrado. Segundo o próprio Suassuna, só existem dois tipos de viagem de avião “as tediosas e as fatais”, e o sofrimento começava ainda no aeroporto, onde sentar nas cadeiras é mais desconfortável do que sentar no chão.
Com suas aulas-espetáculos percorreu 100 municípios e, juntamente com o seu circo Onça Malhada, do qual também era o palhaço, se apresentou 170 vezes. E nunca escondeu sua contrariedade por viajar de avião. “Pra completar ainda tem que passar a viagem toda lendo na poltrona da frente que é pra usar o assento para flutuar”, disse. “Mas eu não estou aqui para voar?”, indagou.