Cid Gomes reafirma a existência de “300 a 400 achacadores” na Câmara dos Deputados, aponta para Eduardo Cunha e pede demissão do ministério de Dilma
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Durante uma palestra para estudantes da Universidade Federal do Pará (UFP), no dia 27 de março, como ministro da Educação, Cid Gomes disse que no Congresso Nacional existem “300 ou 400 achacadores”. Suas Excelências não gostaram. E o convocaram para que ele se retratasse. Mas a emenda saiu pior do que o soneto. Na quarta-feira (18), Cid Gomes compareceu ao plenário da Câmara dos Deputados, reafirmou tudo o que dissera para os alunos paraenses e foi adiante. Apontou o dedo para o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e disparou: “é melhor ser chamado de mal-educado do que de achacador, como o senhor”.
Burburinho formado. Vários parlamentares protestaram e Eduardo Cunha mandou cortar o som do microfone de Cid Gomes. Sem voz, ele se retirou. Assediado pela imprensa, deu algumas declarações rápidas, sentou-se ao volante do próprio carro e dirigiu-se ao Palácio do Planalto. Pediu demissão de forma irrevogável à presidente Dilma Rousseff, voltou a conversar com os jornalistas explicando que tal decisão servia para não causar constrangimentos ao governo e retornou à sua Fortaleza, capital do Ceará. Perdeu o cargo de ministro e ganhou o respeito da Nação. Falou exatamente o que o país pensa a respeito do Congresso e saiu da crise muito mais forte do que entrou.
Antes de atender à convocação da Câmara, Cid alegou estar doente. Foi internado no hospital Sírio Libanês e não compareceu ao Plenário na quinta-feira (12). Eduardo Cunha chegou a telefonar para o hospital querendo saber se realmente Cid estava lá. Mesmo tendo a informação confirmada, enviou uma comissão formada por três deputados médicos para verificar o estado de saúde do ministro. A missão foi cumprida por André Fufuca (PEN-MA), Manoel Júnior (PMDB-PB) e Juscelino Filho (PRP-MA).
Mesmo de licença médica, Cid resolveu ir à Câmara uma semana depois. A presidente Dilma Rousseff pedia que ele se retratasse com a Câmara. Mas seu irmão mais velho e mentor político, Ciro Gomes, o aconselhou a agir exatamente ao contrário. Cid chegou calmo. Pediu desculpas aos deputados, disse que sua fala não foi feita em local público e que, portanto, “não seria motivo de proselitismo”.
Continuou dizendo que, durante sua trajetória como prefeito e governador, sempre teve uma boa relação com o Parlamento, “respeitosa, construtiva, de quem compreende o papel do Legislativo” na gestão e no controle do Estado e do País. Justificou afirmando que o que havia dito era uma posição \”pessoal\” e que não a manifestou como ministro de Estado.
Já no fim do até então discurso de desculpas, Cid Gomes atacou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Apontando o presidente, falou: “prefiro ser acusado por ele de mal-educado do que ser acusado, como ele, de achaque, como diz a capa da Folha de S. Paulo”. A partir daí momento, Gomes esqueceu o conselho de Dilma Rousseff e passou a executar a tática do irmão. E continuou com um apelo aos deputados \”oportunistas\”, que detêm cargos na administração federal, mas não dão apoio ao governo no Congresso: \”larguem o osso, saiam do governo\”.
Questionou a comissão de deputados que foi, na semana anterior, verificar o seu estado de saúde. “Quem custeou o gasto desses deputados que foram lá? Ao que me consta, não houve aprovação regimental”, disse.
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O ex-ministro se retirou do Plenário da Câmara após ser chamado de “palhaço” pelo deputado Sergio Szveiter (PSD-RJ). No Planalto, disse que pediu demissão do cargo para não “constranger a base”. E voltou a defender a presidente. “O que a Dilma está fazendo é limpar o governo do que está acontecendo de corrupção. Essa crise de corrupção é uma crise anterior a ela. Ela está limpando e não esta permitindo isso. Ela está mudando isso. E isso, óbvio, cria desconforto”, afirmou.
“Vocês viram quantos deputados do PP recebiam mensalidade de um diretor da Petrobras? Isso é que era a base do poder e ela [Dilma] está mudando isso”, emendou Cid Gomes, ao citar a lista de políticos investigados pelo Supremo Tribunal Federal por suspeita de envolvido com o esquema de corrupção revelado pela Operação Lava-Jato.
Ciro e Cunha
Não é de hoje a rixa entre os irmãos Ferreira Gomes e o deputado Eduardo Cunha. Em dezembro de 2009, o então deputado federal Ciro Gomes disparou críticas bem semelhantes: “Eu não sei de onde este cara tirou tanto prestígio (…) ele é o relator dos trambiques que se fazem nas medidas provisórias, ele foi presidente da Comissão de Justiça. E o que se fala dele não é publicável”.
“Ou a gente muda isso ou o Brasil não aguenta. Tenho dito ao Lula: ‘Olha, com essa base aí, até com você está dando pra ir. Agora eu não aguento, a Dilma não aguenta’”, disse. Na época, o ataque motivou queixa crime do peemedebista contra Ciro no STF.
Em novembro de 2014, em entrevista a uma TV do Ceará, Ciro voltou a atacar Cunha. “Entre mil picaretas, Eduardo Cunha é o picareta-mor”, disse. Ciro, que era secretario de Saúde do estado do Ceará, continuou dizendo que Cunha esteve envolvido no escândalo de PC Farias no governo Collor, no fundo de pensão do governo de Garotinho no Rio de Janeiro, com Lula em Furnas e “agora enrolado até o gogó em tudo”.
Eduardo Cunha tratou de apelar para o corporativismo dos deputados. “Não vou admitir que alguém (…) não agrida só esta Casa, como venha aqui reafirmar agressão”. E prometeu processar o ex-ministro por via judicial. Ou seja, Cid Gomes terá oportunidade, em outras instâncias para provar o que diz e, claro, continuar sob os holofotes ainda por um bom tempo.
…Já ouvi esta música antes
Lula falou e Hebert Viana musicou: “Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou: são 300 picaretas com anel de doutor”. A frase sobre o Congresso foi dita em setembro de 1993 pelo então presidente do PT e pré-candidato às eleições presidenciais de 1994. Ao pé da letra, Lula disse que \”há uma maioria de 300 picaretas que defendem apenas seus próprios interesses\”. Depois, ao explicar a declaração, disse que defendia o Legislativo. \”O resto é gente boa (…), que vota por convicção ideológica e não por fisiologismo\”.
Obs.: Em junho de 1994, os Paralamas do Sucesso foram proibidos pelo Ministério Público Federal, a pedido da Câmara, de executar a música “300 picaretas” em um show em Brasília.