Ricardo Viana (*)
A Polícia Civil do Distrito Federal, através da 6ª Delegacia, realizou, junto ao Instituto Aprender, o evento Natal na Sexta. O objetivo foi levar a instituição policial até o projeto, que abriga 320 alunos carentes do Paranoá, Itapoã e adjacências.
Cada servidor adotou uma das 180 cartinhas para o Papai Noel escritas pelas crianças e adolescentes atendidas pelo instituto no contraturno da escola regular. Ali eles participam de oficinas de natação, teatro, música, percussão e capoeira.
PCDF e o Instituto Aprender presenteiam crianças do Itapoã, Paranoá e adjacências com festa linda de Natal – Fotos: Divulgação
Em um país onde 33 milhões de pessoas passam fome e mais 9 milhões estão desempregadas, foi uma forma encontrada pelos policiais de trazer um Natal mais digno às famílias daquela comunidade. Além dos brinquedos, os policiais angariaram alimentos e levaram sorriso e afeto aos atendidos.
Baixar armas
Trata-se de uma população carente, a qual, por questões e ações histórico-sociais, rechaçam e estigmatizam o trabalho policial. Muitos dos alunos que ali estavam já presenciaram uma intervenção policial em sua casa, família ou vizinho.
Então, abaixamos as armas. Cabia-nos assimilar que as pessoas que nos receberiam, independentemente de tropeços de seus ascendentes ou conhecidos, eram nossos clientes para os quais prestamos serviços, função que deve se pautar dentre os princípios da eficiência, impessoalidade e moralidade.
A aproximação visava não só a solidariedade, mas dar transparência das nossas ações à sociedade que nos remunera. Foi previamente pactuado com a direção do estabelecimento que cada criança escreveria uma carta com os seus desejos.
Vieram solicitações de caixa de bater bafo, bolas, bonecas e bicicletas. Quase todos os objetos foram adquiridos, com poucas exceções. Mas uma coisa era certa: ninguém poderia sair sem ser agraciado. Com a ajuda dos policiais, da comunidade, dos amigos e dos comerciantes, foram angariadas mais de 200 cestas básicas e garantidos presentes a todos os participantes.
Cães e carcará
Papai Noel chegou no Carcará, o helicóptero da Polícia Civil do DF – Foto: Divulgação
Papai Noel chegou no Carcará, o helicóptero da Polícia Civil. A Divisão de Cães fez uma apresentação com o Jimmy, um Golden Retriver que além de farejar drogas é carismático e diverte a todos. A Escola Superior abriu as portas do Museu de Drogas, além disso, os alunos deram uma volta no interior das viaturas.
Em sua apresentação, antes de receberem as lembranças e as cestas básicas, os alunos dançaram rap, tocaram, recitaram e agradeceram a tarde de convivência. Gabriele, de 10 anos, disse: “Isso que eu quero, vou ser policial”.
Vinícius, também de 10 anos, era o mais risonho e simpático. Aproximou-se e eu perguntei se ele estava satisfeito. Ele disse que sim. Questionei se ele ganhou o que havia escrito na carta. De repente, o semblante do garoto esmoreceu.
Das mais de 180 cartas que recebemos, lembrei de uma que me emocionou. Era justamente a dele, pedindo um emprego para o pai. Fiquei sem palavras. O garoto se levantou, sorriu e continuou a brincar.
Sobrevivência e dignidade
O nome do instituto é aprender, um ato revolucionário que requer transformação. Sem dúvida, houve uma simbiose entre a Polícia Civil e os alunos que ali estavam. Crianças, famílias, colaboradores e policiais se sentiram humanos e importantes no sentido de que, unidos, podem fazer algo a mais para construir uma sociedade mais igualitária.
Mostramos que muitos dos policiais que ali estavam tiveram origem semelhante aos alunos do projeto, romperam barreiras e alçaram o cargo público. Testemunhamos crianças e adolescentes, como o Vinícius, que desde tenra idade vivenciam as agruras e as necessidades da vida. Pessoas que assimilam as mazelas de uma sociedade hierarquizada em que milhões se encontram desempregados e em insegurança alimentar.
Rogamos por um Natal em que não faltem alimentos àqueles alunos e demais pessoas em condições semelhantes. E também não seja subtraído dos menos abastados a esperança por dias melhores, e que muitos dos responsáveis, como o genitor de Vinícius, possam garantirá sua prole o mínimo para sua sobrevivência e dignidade.
(*) Delegado Chefe da 6ª DP e professor de Educação Física