Jamal Bittar, 57 anos, assumiu a presidência da Federação das Indústrias do Distrito Federal em outubro do ano passado com a promessa de resgatar a confiança do investidor na capital do país. O segmento vem encolhendo a participação no Produto Interno Bruto (PIB) e está sofrendo um forte impacto da crise econômica local e nacional. Em entrevista ao Correio, Jamal afirma que o clima de pessimismo é pior do que o cenário em si.
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Presente no segmento industrial brasiliense desde 1983, como funcionário, e desde 1988, como proprietário de uma fábrica de produção de utensílios domésticos, Bittar defende uma mudança radical nas políticas voltadas para a indústria. Segundo ele, é preciso “destruir tudo o que está aí” e começar do zero, já que uma política industrial vai além de doação de terreno. Para Bittar, a função do Estado é garantir infraestrutura e segurança jurídica.
Na semana passada, a Fibra apresentou a agenda da indústria para a Câmara Legislativa. Qual é a prioridade máxima para a indústria local?
Precisamos de políticas consistentes e perenes. E nós só vamos conseguir com medidas legislativas e do Executivo. Precisamos de um elaborador de leis que nos ouça na criação das normas. O empresariado conhece as demandas, as necessidades. Ele é o mais competente para gerar opiniões, críticas, sugestões e incorporar ideias. Por isso, definitivamente, tem que ser ouvido.
Uma das queixas do empresariado local é a insegurança jurídica. Se a Câmara escutasse o setor produtivo, teríamos menos problemas?
Sim. Essa é a queixa do empresariado brasileiro de uma maneira geral. Agora, no DF, parece que tem um plus. O setor atacadista investiu em bases legais, foi penalizado e hoje acumula um passivo impagável, dizem que de R$ 800 milhões, junto do GDF. Você consegue explicar isso para um investidor sério? Nunca. Só afugenta o investidor. Como vamos fazer para que os investidores se interessem pelas particularidades do DF, como logística, mão de obra atraente, se temos, no histórico e nas pesquisas para investimento, essa insegurança jurídica? Qualquer investidor decidiria por não investir diante de um fato desse. E como você pode ter segurança jurídica? Com boas leis e um Executivo que execute essas leis da maneira que ela está determinada, que não seja viciada, que não tenha processo e leis elaboradas a partir de questões de inconstitucionalidade.
A indústria sofre a pressão da crise macroeconômica brasileira, mas no DF existe um ambiente ainda mais hostil?
Temos um traço cultural horrível: Brasília é dependente do Estado. Nós precisamos parar com essa história que o pilar da sustentação da economia é só a administração pública.
Os dados da Fibra mostram queda no índice de confiança, menos estoque, menos insumo. Como reverter essa situação a curto prazo?
Não tem mágica. Precisamos melhorar a circulação de riquezas, diminuir juros, reduzir o alto endividamento das empresas, principalmente as pequenas.
O principal perfil do DF…
Exatamente. É um perfil parecido com o nacional. O nosso é um tanto mais de pequenas, micro e até médias empresas. São os maiores pagadores de juros. Nisso, você cria um ciclo errado. O crédito está mais restrito, mais caro. Com juros altos, o pequeno fica menos competitivo, diminui margens de lucro. Isso, em um certo momento, vai gerar desemprego.
Em matéria recente, o Correio entrevistou empresários falando que iam crescer e, diante da crise, optaram por pisar no freio.
O momento cria esse clima pessimista. Aquela história: por que você está com medo? Não sei, mas o meu vizinho está. O clima está pior do que a situação real neste momento. No sentido real da coisa, nós temos medidas que indicam, de forma definitiva, que há desaquecimento. Medidas que indicam redução de emprego. E temos perspectivas e sondagens de que isso vai continuar.
O forte da indústria do DF é a de bens de consumo imediato, como alimentos. Mesmo tão essencial, esse setor já sente a crise?
Isso não é evento novo. Já estamos nessa curva decrescente desde o ano passado. E vem se agravando. As turbulências políticas, econômicas, orçamentárias… Tudo isso vai enchendo o bolo. Mas pior que o número negativo é a expectativa negativa. O pior fica um pouco pior. E já atinge um indicador da indústria, que é o índice de confiança. Em cima desse indicador é que pode fazer uma avaliação da capacidade e da vontade do investidor. O investidor vai contratar empregados novos? Vai criar produtos?
Muito da política industrial do DF está centrada na doação de lotes, o que, na opinião de especialistas, não é uma real política industrial. O que o senhor acha que precisa, de verdade, para desenvolver a indústria?
Temos que destruir tudo o que está aí. Quase nada dessas formulações de política industrial no DF se aproveita. Esses programas de desenvolvimento, com doação de lotes, foram todos errados, viraram meros instrumentos de especulação imobiliária e fonte de corrupção. Essa é a síntese dos grandes programas. O resultado final é próximo de zero.
E o Polo JK?
É a nossa esperança. E temos que explorar o que temos de melhor: a renda alta, mesmo que má distribuída; a questão logística; o movimento da indústria de ciência e tecnologia. O DF não tem que competir com Goiás, por exemplo. Temos que criar as nossas peculiaridades.
O crescimento da indústria ligada ao setor de serviços tem aumentado no mundo todo. É uma tendência que o DF pode seguir?
Essa é a cereja do bolo. Temos que aproveitar esta média alta de educação que existe no DF e trazer uma indústria moderna e de ponta.
A mão de obra especializada do DF já existe?
Tem que ser treinada. A mão de obra do DF já tem uma boa base. Temos uma juventude extremamente preparada, que tem mais tempo de escola.
E a questão da infraestrutura?
A gente tem um problema sério que é o de energia elétrica, com indústria movida a gerador e a diesel. As políticas de desenvolvimento têm que, obrigatoriamente, ser propiciadas pelo Estado, assim como a segurança jurídica. Mas eu vejo como momento de oportunidades, de buscar políticas diferenciadas, sérias e consistentes para inverter nesse quadro. Estamos falando em infraestrutura, o Estado tem que estar atuante, seja como aplicador direto, seja como parceiro. Não dá para imaginar situações como a de indústrias que inauguraram no Polo JK com gerador próprio e caminhão-pipa.
É possível falar de alguma integração com a região do Entorno ou é um terreno árido?
Vejo o Entorno como parte da solução. Já está incorporado. Não tem como fazer política sem o Entorno. São 2,5 milhões de pessoas, todas colaboradoras do processo econômico do DF. Trabalham aqui, gastam parte do que recebem aqui.
E a expectativa para o novo plano econômico que Rollemberg está falando em propor?
Espero que seja o nosso plano, literalmente. Porque plano de desenvolvimento que não passar pela indústria está fadado ao fracasso. Minha proposta é a seguinte: explode tudo o que está aí, começa tudo de novo. E isso nós temos conversado com o governo.
A Fibra está com um projeto de criar uma marca made in Brasília. Como vai funcionar?
92% do que o brasiliense produz vêm de fora do DF. Por isso, a Fibra e o Sebrae querem criar uma estrutura de estímulo para o produto local, com a divulgação dos produtos fabricados em Brasília. Não queremos ufanar a marca Brasília, queremos promover o produto local. A previsão é que a marca seja lançada no próximo dia 12.
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