O senhor é autor da abertura da CPI de investigação do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Como o senhor avalia a condução da pasta? – É muito preocupante que o próprio ministro conduza uma política contra o meio ambiente. Acompanhamos, consternados, diariamente, ações voltadas para enfraquecer a legislação ambiental e favorecer grileiros e desmatadores, além de anistiar criminosos ambientais.
Tivemos, na última semana, a demissão da coordenadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Isto o preocupa? – Vemos servidores de carreira sendo afastados de suas atribuições quando questionam encaminhamentos absurdos do MMA. Lubia Vinhas foi afastada do cargo de coordenadora-geral de Observações da Terra após tornar públicos os dados sobre desmatamentos na Amazônia, da mesma forma que aconteceu no começo do governo Bolsonaro com a demissão do cientista premiado Ricardo Galvão. De fato, o ministro Ricardo Salles cumpre seu papel no governo, que é o de antítese à preservação e desenvolvimento sustentável.
Qual a sua avaliação da MP da Grilagem? – Em junho, foram registrados os dados mais altos de incêndios florestais e desmatamentos dos últimos 13 anos. Recentemente, o governo havia tentado passar a MP da Grilagem. Como não conseguiu, a transformou em um Projeto de Lei que beneficia aqueles que invadem terras públicas. Estamos acompanhando.
O senhor tem afirmado que o governo faz um desmonte da área ambiental… – Além das demissões e das nomeações de pessoas sem nenhum vínculo técnico com as áreas, vemos também o sufocamento orçamentário dos órgãos de fiscalização e controle ambientais, o que deixa clara esta política de desmonte. É extremamente necessário que tenhamos muita energia para combater, diariamente, essa pretensão do governo.
Quais as consequências dessa política para os acordos internacionais dos quais o Brasil faz parte? – Bolsonaro coloca em risco tratados internacionais que levaram anos para serem construídos. Podíamos imaginar, desde o começo, que essa receita de aumento de agrotóxicos, desmatamentos e flexibilizações ia comprometer nossa atuação em mercados estrangeiros, em especial os europeus, que são extremamente exigentes quando se trata de marcos sanitários e regulatórios ambientais.
Isto tem reflexos na economia? – Estamos falando aqui de uma ameaça grave, não só ao meio ambiente, mas ao futuro econômico do Brasil. Bolsonaro já sinalizou, em algumas ocasiões, que poderia, inclusive, abandonar o bloco do Mercosul. Esse tipo de postura compromete nossas relações comerciais, impactando diretamente nos investimentos no País e na taxação de nossos produtos para exportação.
Quais os efeitos práticos? – A manutenção de uma agenda contrária ao meio ambiente pode representar a perda de milhões de reais injetados na nossa economia. Em um cenário normal, isso já teria um impacto enorme. Em meio a uma crise econômica em decorrência da Covid- 19, é inconcebível.
O que o Congresso Nacional pode fazer para evitar esse desastre? – Nós, do PV, fazemos a avaliação das portarias e ações do Ministério e dos órgãos vinculados. Esse trabalho é realizado por meio da interação da bancada com o Observatório de Políticas ambientais do partido. Assim, otimizamos o controle e fortalecemos a construção de ações efetivas, seja no Legislativo ou via Judiciário.
E o senhor, como parlamentar, o que tem feito? –Recentemente, protocolei requerimentos de informação sobre a atuação no combate ao desmatamento na Amazônia, e Projetos de Lei de defesa da fauna exótica, sobre asfixia financeira dos órgãos ambientais, pedido de impeachment do ministro, CPIs, convocações, bem como manifestações às instâncias de Controle, como Ministério Público, dentre outros.
Na articulação interna na Câmara, o senhor tem obtido algum êxito nessas iniciativas? – Em uma manobra para imobilizar Salles, pedimos ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que se comprometesse, com especial atenção, às ameaças ao acordo Mercosul-EU. Que ele não pautasse no plenário projetos que possam prejudicar a pauta ambiental. Com isso, esperamos frear avanços sistêmicos, como o PL que vem da MP da Grilagem, dentre tantos outros que afetam comunidades tradicionais e suas terras, liberação de agrotóxicos, regularização fundiária etc.
Tem alguma esperança de que o atual governo sinalize alguma mudança? – É importante avaliar que as críticas agora estão vindo justamente do setor econômico. Se, até o momento, a gestão Salles representou uma agenda antiambientalista, agora ele começa a incomodar aqueles que detêm poder de investir, alterar balanças comerciais e provocar um verdadeiro efeito econômico catastrófico. No primeiro momento, nós, ambientalistas, fazemos frente nas trincheiras de defesa dos nossos patrimônios socioambientais.
Então o Brasil entrou no ambientalismo capitalista? – Chegamos agora na fase em que o capital internacional percebe que a defesa ambiental precisa ser encarada como uma necessidade. Em carta entregue a embaixadas brasileiras na Suécia, Estados Unidos, Japão, Dinamarca, Reino Unido, França e Holanda, um grupo formado por 29 fundos internacionais pediu que o governo brasileiro demonstre claro comprometimento em eliminar o desmatamento e proteja os direitos dos povos indígenas.
Isso é preocupante? – Salles parece estar desgastado. Sob forte ataque em frentes variadas, pode ser que sua permanência no Ministério do Meio Ambiente esteja chegando a um limite insustentável, até para um presidente que não parece muito afeito a opiniões públicas. Acredito, sim, que a pressão econômica é capaz de dar um outro tom à agenda ambiental bolsonarista.